Resposta ao conselheiro Glaucius Bragança, relator da Comissão Diretiva dos Trabalhos Eletivos do Codema

Foto: Carlos Cruz

Por Maria Inês de Alvarenga Duarte*

Quero deixar aqui o meu protesto e repúdio ao parecer técnico do conselheiro Glaucius Detofoll Bragança, relator da Comissão Diretiva dos Trabalhos Eletivos do Conselho Municipal de Defesa do Meio Ambiente (Codema), que, ao negar o recurso impetrado pela Cáritas Diocesana, à qual represento no órgão ambiental municipal, o tratou como sendo “mero inconformismo da entidade com o resultado da votação, e não se sustenta diante das normas que regulam o processo eleitoral do Codema”.

Ora, senhor conselheiro, o que reclamamos foi a forma como ocorreu a eleição para escolha dos novos conselheiros da sociedade civil, que deveria ser por segmento – o que não ocorreu. O que se viu foi um segmento votando em outro. Exemplo: conselheiros da mineração votando no segmento do meio ambiente etc., quando sabemos muito bem o que eles querem e representam.

Não foi por inconformismo, mas por ter havido um claro descumprimento das normas do próprio órgão ambiental, que deveria adotar procedimento semelhante ao do órgão estadual para garantir que a escolha de conselheiros por segmento seja democrática e representativa – e não definida pelo voto de outros segmentos antagônicos.

Se interpelamos o resultado, isso é democracia, é participação popular. Não fizemos isso “por mero inconformismo”. Temos direitos, e as leis existem para serem interpretadas e obedecidas. Discordamos, sim, de todo o conteúdo do parecer que negou provimento ao nosso recurso.

Mas quero te responder como cidadã, e não pela organização que represento, a Cáritas Diocesana – uma entidade que luta não só pelo meio ambiente, mas também por mais dignidade, igualdade e fraternidade neste mundo perverso do capitalismo e do consumismo.

Eu, Maria Inês de Alvarenga Duarte, represento muito mais do que uma cadeira no Codema. Faço parte de um dos poucos grupos de ativistas sociais que se preocupam com o que vamos deixar para as gerações futuras – o ar menos poluído, a água em abundância para todos que aqui vivemos, para assegurar qualidade à vida dos futuros itabiranos.

Somos os responsáveis pelo presente. E no Codema, infelizmente, vimos acontecer – não com o meu voto, mas com o da maioria avassaladora empresarial, decisões favoráveis a projetos de destruição do meio ambiente em nome da geração de empregos e arrecadação de impostos para a cidade.

Mas também vi sendo aprovado projetos positivos, reparadores do que pode ser corrigido, e compensatórios para aquilo que não tem retorno, por se tratar de perda irreversível.

Estou do lado dos que lutam pela vida, pela saúde e pela dignidade de todos. Sou ativista do Comitê Popular dos Atingidos pela Mineração em Itabira e Região, que tanto tem incomodado o segmento que mais impacta a natureza em nosso território: a mineração, ainda predatória, mesmo com toda a propaganda em contrário.

Predatória, sim, como se constata pela degradação paisagística, pelo monopólio da água, pela devastação de extensas áreas florestais. Uma atividade que aterroriza a população com os riscos das barragens, com a violação de direitos.

É o que estamos vendo acontecer com os moradores dos bairros Bela Vista, Nova Vista, Jardim das Oliveiras – assim como já ocorreu em outras comunidades que sofreram assédios e tiveram seus moradores expulsos de seus territórios, como vimos no Rio de Peixe, Conceição de Cima, Explosivo, Camarinha, Vila Paciência.

Atualmente, os moradores vizinhos da barragem Pontal estão sofrendo há anos com essas violações de direitos. E não vejo o Codema sequer emitir uma nota de repúdio a essa situação ou, ao menos, se solidarizar e apoiar esses nossos munícipes que sofrem impactos nefastos, que poderiam ser perfeitamente evitados se houvesse, de fato, respeito com essas pessoas.

Além da poeira, dos barulhos, das vibrações, do mau cheiro insuportável de um esgoto que há mais de três décadas os incomoda, esses moradores vivem também com o medo do rompimento de uma barragem que contém milhões de metros cúbicos de rejeito.

E a obra de descomissionamento em curso tem causado ainda mais problemas, entre os quais se somam à proliferação de animais peçonhentos, trazidos pelo esgoto a céu aberto, e às trincas enormes nos muros e nas casas, o que tem colocado em risco as vidas desses moradores.

Na nossa luta – digo “nossa”, porque não estou sozinha – somos algumas dezenas de moradores desses bairros, que estamos incomodando. Talvez por isso tantos segmentos empresariais tenham optado por não dar a titularidade à Cáritas Diocesana, que desde o biênio passado tem levantado todas essas bandeiras em defesa da dignidade humana, do respeito às pessoas e contra as violações de direitos.

Com essa atuação, reforçada também pela assessoria técnica independente e pelo apoio do Comitê Popular dos Atingidos pela Mineração, estamos conseguindo mobilizar os atingidos para que passem a ser ouvidos, reivindicando o que é de direito.

Tanto é assim que já se uniram e formaram a Comissão dos Atingidos do Sistema Pontal, da qual faço parte, para dar encaminhamento às suas demandas e justas cobranças diante das violações que têm sofrido.

A partir dessa mobilização, já ocorreram Audiências Públicas na Assembleia Legislativa de Minas Gerais e, aqui em Itabira, realizamos uma consulta pública, que só aconteceu graças à cobrança do então conselheiro da Cáritas Diocesana, o professor e ativista Leonardo Reis.

Fazemos frente a essa mineradora não por sermos contra a mineração, mas contra o desrespeito e as violações de direitos que sistematicamente atingem pessoas, removem famílias, poluem o ar da cidade sem tomar as medidas necessárias e eficazes, diferentemente do que ocorre em Vitória, no Espírito Santo, onde a população parece cobrar mais e a justiça age com maior rigor.

E isso incomoda muito não só quem polui, mas também todos que, de alguma forma, têm vínculo com a atividade minerária predatória de uma empresa que historicamente se acha dona da cidade.

Essa mineradora, que nasceu aqui, mas que, como uma filha ingrata, “cospe no prato que comeu”. Tirou tudo da cidade, levou a nossa hematita sem sequer pagar impostos. Ficou rica, virou multinacional.

E vai deixar a cidade com barragens, buracos, poeira – e ainda sem água, prometendo trazê-la do rio Tanque. Uma dívida que se arrasta há décadas e que agora só está sendo resgatada por força de um TAC assinado com o Ministério Público de Minas Gerais.

Portanto, caro conselheiro Glaucius Detofoll Bragança, não foi por “inconformismo” que apresentamos recurso contestando o modo como foi feita a escolha dos representantes da sociedade civil, com mineradoras e outros interesses inconfessáveis votando em um segmento ao qual não pertencem – um segmento que defende os interesses da população em relação ao meio ambiente.

Recorremos por responsabilidade social, por entender que perdemos a titularidade pelo voto dos que, por razões até compreensivas, não comungam de nossas ideias em defesa da vida, do meio ambiente, das pessoas que vivem nesta cidade exaurida pela mineração, cujo futuro incerto já bate às nossas portas.

Nada do que se passa em nossa cidade nos é alheio. Somos parte de um todo, mas representamos um segmento específico. E se havia disputa, repetimos, ela deveria se dar com votos de quem representa esse mesmo segmento, diferentemente do que ocorreu na eleição do Codema.

Esse, se quiser, é o motivo do nosso justo “inconformismo”. Mas não é só por isso, e sim por todas as razões já elencadas. “Está tudo interligado nesta Casa Comum” (Laudato Si’, Papa Francisco). A Terra “é um empréstimo que cada geração recebe e deve transmitir à geração seguinte”.

Itabira é a cidade que adotei para viver e onde formei minha família. Como disse um outro conselheiro ao professor Leonardo Reis, também sou “estrangeira” nesta terra, mas amo esta cidade.

Tenho orgulho de dizer que sou santamariense de nascimento, mas itabirana de coração. E aqui vivo, luto e resisto – e assim o farei, mesmo que na condição de suplente no Codema.

*Maria Inês de Alvarenga Duarte é coordenadora de catequese, representa a Cáritas Diocesana como suplente no Codema, ativista do Comitê Popular dos Atingidos pela Mineração em Itabira e Região e participa da Comissão dos Atingidos do Sistema Pontal.

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