Personalidade da Semana – Maria Julieta Drummond de Andrade

A escritora Maria Julieta Drummond de Andrade

Foto: Reprodução

Yvonne Jean

Maria Julieta Drummond de Andrade cursa a Faculdade de Línguas Neolatinas, traduz contos, escreve artigos de jornal e trabalhava, até há pouco, numa repartição. A escritora mais moça do Brasil não se valeu do êxito alcançado pela sua primeira novela para buscar a “literata” e reduzir suas atividades gerais e pensar exclusivamente em publicar novos romances.

Ao contrário, quer aprender mais, aprender muito e não tem a mínima pressa em lançar outro livro na circulação. Pensa principalmente em aperfeiçoar sua cultura. Os artistas já maduros geralmente dão-se conta do pouco que sabem. Raramente os adolescentes possuem este senso das proporções. Este fato bastaria quase para comprovar que a autora de A Busca não é nenhuma menina prodígio, mas uma verdadeira escritora.

Quem leu a novela, encontrou, ao lado de uma sensibilidade fora do comum, um senso de observação agudo aliado à procura constante da beleza. Nele, Maria Julieta não procurou explicar por miúdo os sentimentos confusos que a agitam, não menosprezou a inteligência do leitor, sugeriu em lugar de explicar.

Capas da primeira e segunda edição de A Busca

Apesar de algumas inabilidades naturais numa primeira tentativa, A Busca conseguiu criar uma atmosfera pela força dos sentimentos contraditórios exprimidos e permite afirmar que nasceu uma verdadeira romancista.

Naturalmente Maria Julieta encontrou um incentivo constante em casa. Não me refiro somente à convivência com Carlos Drummond de Andrade que lhe permite buscar conselhos e uma direção constantes.

Mas também do receio de ser criticada por alguém cujo valor literário conhece e que a obriga a cristalizar as ideias, em lugar de se contentar em atirá-las no papel, antes de pensar em mostrar uma página, de considerá-la como encerrada.

– Mostro meus artigos a papai antes de mandá-los para o jornal. Primeiro porque sei quanto posso aprender com ele. E também porque sei que ficaria triste se não lhe desse esta prova de confiança. Só uma ou duas vezes publiquei artigos sem falar com ele antes. Não disse nada, mas senti que ficou um pouco magoado.

– E quando você estava escrevendo A Busca?

– Mostrava trechos a mamãe, discutia a história com ela. Mas só mostrei o romance a papai quando estava terminado. Talvez tivesse um pouco de medo da sua critica, o que me obrigou a corrigir muito antes de falar com ele… Você sabe… sou muito preguiçosa…

– Não parece. Você faz muitas coisas.

– Exatamente porque sou preguiçosa. Muitas tarefas não passam de uma evasão. Tenho pouca vontade de mergulhar no trabalho de verdade. Então afasto o momento de começar… Você compreende?

– Se compreendo! Todos os escritores conhecem esta sensação e procuram enganar-se a si mesmos fazendo traduções ou outros trabalhos, como se quisessem se comprovar que não se trata de preguiça, que estão trabalhando…

– Exatamente. Agora devo dizer que gosto realmente de fazer traduções. Não o faço por obrigação.

– Dá uma excelente disciplina de trabalho.

– E também vou me tornando técnica em contos, já que estou lendo muito, escolhendo os contos que julgo mais interessantes, preparando a biografia dos autores estrangeiros antes de apresentar um conto ao púbico.

– Você nunca escreveu poemas?

– Deixo isso para papai!!! Não nos fazemos concorrência!

– Vi que, ultimamente você não assina seus artigos com seu nome todo.

– É muito comprido. “Maria Julieta” é mais simples.

Não é somente mais simples. Comprova a honestidade da escritora que quer se fazer por si mesma, não quer despertar interesse por ser a filha de Carlos Drummond de Andrade, e pretende criar lentamente a própria personalidade e o próprio nome.

É mais uma prova de que Maria Julieta não considera a arte como um passatempo, mas como uma vocação e uma tarefa real.

[Revista da Semana (RJ), 10/1/1948. Hemeroteca BN-Rio – Pesquisa: Cristina Silveira]

 

 

 

 

 

 

 

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