O que aconteceu com personagens marcantes do bolsonarismo desde o último 7 de setembro
Foto: João Canizares/ Agência Pública
Alguns estão presos, outros foram eleitos, muitos são investigados e parte abandonou o barco; entenda quem é quem
Por Alice Maciel, Laura Scofield
| Edição: Thiago Domenici
Agência Pública – Vestido com seu tradicional terno verde e gravata amarela, o empresário Luciano Hang chamou atenção durante o desfile de 7 de setembro de 2022, ao se posicionar do lado esquerdo de Jair Bolsonaro (PL), no centro da primeira fila da tribuna de honra, na área reservada aos chefes de estado. Logo no início do desfile, ele assumiu o lugar do presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, que demonstrou incômodo com a situação.
A fileira atrás de Bolsonaro foi reservada aos três comandantes das Forças Armadas à época: general Marco Antônio Freire Gomes, do Exército; Almir Garnier, comandante da Marinha, e o tenente-brigadeiro do ar Carlos de Almeida Baptista Júnior, comandante da Aeronáutica. Já do lado direito do então presidente, estava a primeira-dama, Michelle Bolsonaro.
Também foi rodeado pela esposa, pelo empresário Luciano Hang e ainda pelo líder da Assembleia de Deus, pastor Silas Malafaia, que Bolsonaro discursou para os milhares de apoiadores naquele dia, em uma espécie de evento paralelo montado na Esplanada após o desfile do Bicentenário da Independência. A data contou dias antes com a chegada extravagante do coração de Dom Pedro I — recebido por Bolsonaro com honras de estado — e que veio embalsamado de Portugal para as comemorações.
Antes do então presidente, Michelle, o dono das lojas Havan e Malafaia usaram o microfone em tom de campanha eleitoral. “Essas eleições são as eleições mais importantes da nossa história”, disse Hang. “Nós somos a maioria, nós temos fé, nós cremos em Deus e a maioria vai derrotar essa cambada que quer voltar a cena do crime”,destacou Malafaia.
Eles falaram de cima do trio elétrico financiado pelo Movimento Brasil Verde Amarelo, que reúne entidades do agronegócio, e que também foi responsável pela inclusão inédita de tratores no desfile oficial do 7 de setembro.
Recentemente, o movimento foi apontado em relatório da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) enviado à CPMI do 8 de janeiro, como um dos principais articuladores dos atos golpistas em apoio a Jair Bolsonaro nos últimos anos.
O evento cívico-militar, que se transformou em ato de campanha no ano passado, reuniu, seja na tribuna de honra ou no palanque, os fieis escudeiros do ex-presidente, na tentativa de demonstrar a força do então candidato à reeleição. Empresários, pastores, produtores rurais, além dos políticos e ex-ministros que foram centrais para a manutenção do bolsonarismo estavam entre os convidados de honra.
Um ano depois, alguns estão presos, outros foram eleitos, muitos estão sendo investigados e parte desse grupo pulou do barco, ou, pelo menos, parou de defender Bolsonaro publicamente com a ênfase de antes – atualmente Bolsonaro está inelegível e é alvo de vários inquéritos.
Alguns personagens que marcaram o fatídico 7 de setembro de 2022 disseminaram, ao longo dos quatro anos de mandato do ex-presidente, mentiras sobre a vacinação da covid-19, desmatamento e aquecimento climático, além de ataques às instituições democráticas. Tais defesas são opostas ao que foi definido pelo atual governo como eixos temáticos da comemoração da Independência deste ano: paz e soberania, ciência e tecnologia, saúde e vacinação e defesa da Amazônia.
Veja quem são e o que aconteceu com eles:
Luciano Hang
Foi um dos principais aliados de Jair Bolsonaro durante os quatro anos de mandato, mas, 11 dias após a posse de Lula, gravou um vídeo, publicado nas redes sociais, dizendo que está torcendo pelo atual governo.
Em maio deste ano, o empresário foi declarado inelegível pelo Tribunal Superior Eleitoral por ter utilizado a estrutura das Lojas Havan na campanha para prefeitura de Busque (SC), o que teria desequilibrado o pleito.
O prefeito e vice-prefeito eleitos tiveram seus mandatos cassados. Hang também é investigado no STF por suposto apoio a atos antidemocráticos.
Silas Malafaia
Mesmo após a derrota de Jair Bolsonaro, o líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, Silas Malafaia permanece sendo um defensor fiel do ex-presidente.
Em um vídeo publicado em 18 de agosto nas redes sociais, Malafaia saiu em defesa de Bolsonaro no caso das Joias e do cartão de vacina e atacou o ministro do STF, Alexandre de Moraes. “Ditador Alexandre de Moraes, a sua casa vai cair”, afirmou.
Em outro vídeo, que tem sido utilizado por bolsonaristas para convocação de atos antidemocráticos no 7 de setembro, ele chama os generais do Exército de “frouxos” e diz que “poderiam botar o pé na porta”.
Michelle Bolsonaro
Ex-primeira dama, Michelle Bolsonaro assumiu um lugar de protagonismo no Partido Liberal após a derrota do marido. Ela é pivô no escândalo das joias milionárias.
Atualmente, o ex-presidente e aliados estão sendo investigados pela Polícia Federal (PF) em razão de um suposto esquema de negociação ilegal de joias presentadas por delegações estrangeiras à Presidência da República.
Antonio Galvan
Presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja (Aprosoja), Antonio Galvan concorreu no ano passado a uma vaga para o Senado Federal pelo Mato Grosso pelo PTB, mas ficou em segundo lugar.
Principal liderança do Movimento Verde e Amarelo, foi apontado em relatório da Abin – enviado à CPMI de 8 de janeiro — como um dos que atuou “diretamente nos bloqueios e nas manifestações após o segundo turno das eleições”. Ele também é alvo de inquérito do STF sobre os atos antidemocráticos.
Anderson Torres
Ex-ministro da Justiça do governo de Jair Bolsonaro, Anderson Torres estava à frente da Secretaria de Segurança Pública do Distrito Federal (SSP-DF) quando ocorreram os ataques de 8 de janeiro. Torres ficou preso quatro meses por suposta omissão nos atos golpistas e é investigado em inquéritos que apuram as invasões.
A Polícia Federal (PF) encontrou em sua casa um documento que ficou conhecido como “minuta do golpe” por propor a intervenção do governo federal no TSE — em sua defesa, Torres disse que a minuta iria para o “descarte”, e que não sabia sobre sua autoria.
Em fevereiro de 2022, o ex-ministro de Bolsonaro também foi alvo de Operação do Ibama por suspeita de comércio ilegal de animais silvestres.
Paulo Generoso
Um dos fundadores do Movimento República de Curitiba, o empresário Paulo Generoso postou mensagens nas redes sociais em apoio aos atos golpistas de 8 de janeiro.
Desde março deste ano, ele é sócio do filho 03 de Jair Bolsonaro, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), em uma empresa nos Estados Unidos, a Braz Global Holding LLC, conforme revelou uma investigação feita em uma aliança entre a Agência Pública, o UOL, liderada pelo CLIP (Centro Latinoamericano de Investigação Jornalística).
Um dos primeiros negócios da empresa de Generoso e Eduardo Bolsonaro foi se tornar administradora de outra companhia, em um negócio que, de acordo com especialistas ouvidos pela Pública, tem “indícios clássicos de lavagem de dinheiro”.
Bia Kicis
Integrante da “tropa de choque” de Jair Bolsonaro no Congresso Nacional, Bia Kicis (PL-DF) foi reeleita deputada federal para o segundo mandato em outubro de 2022 e continua defendendo o ex-presidente.
A deputada é uma das defensoras do movimento “fique em casa”, que pede que os bolsonaristas não saiam às ruas no 7 de setembro. “Politicamente nós não temos nada a comemorar, essa que é a verdade”, defendeu ela no Plenário da Câmara no dia 4.
Julia Zanatta
Amiga pessoal da família Bolsonaro, Julia Zanatta (PL-SC) se elegeu no último pleito para seu primeiro mandato como deputada federal de Santa Catarina. Ela ganhou visibilidade defendendo a pauta armamentista e por sua proximidade com o deputado Eduardo Bolsonaro.
General Braga Netto
Candidato a vice-presidente na chapa com Jair Bolsonaro, o ex-ministro da Casa Civil e da Defesa, General Braga Netto, após a derrota nas urnas, ganhou uma vaga no Partido Liberal como coordenador da área de inteligência da legenda.
Ao contrário de Jair Bolsonaro, ele foi absolvido pelo TSE das acusações de abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação, que motivaram a decisão da Corte pela inelegibilidade do ex-presidente.
General Hamilton Mourão
Ex-vice-presidente, o General da reserva Hamilton Mourão se distanciou de Bolsonaro ainda durante o mandato. No ano passado, ele se elegeu ao Senado pelo Republicanos do Rio Grande do Sul, com 2.593.229 votos.
General Augusto Heleno
Ex-ministro do GSI, o general Augusto Heleno prestou depoimento à CPI dos atos antidemocráticos do Distrito Federal no dia primeiro de junho e saiu em defesa dos acampamentos golpistas em frente ao Quartel-General do Exército em Brasília.
“Não estive nenhuma vez no acampamento, eu conhecia de fotografia. Acredito que era um local sadio, com muitas orações, onde as pessoas se reuniam para conversar de assuntos políticos. Mas não sei como era a organização deles, como se resolviam com comida, assistência. Tinha muitas crianças, mulheres”, disse na ocasião.
Damares Alves
Damares Alves (Republicanos-DF) foi eleita senadora pelo Distrito Federal nas últimas eleições e continua parte da base de apoio ao ex-presidente.
Neste ano, a Pública revelou que a Controladoria Geral da União encontrou irregularidades e prejuízos aos cofres públicos no programa Abrace o Marajó, criado durante sua gestão como ministra do Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos. O programa foi revogado pelo atual governo.
Jair Renan
Filho 04 de Bolsonaro, Jair Renan foi alvo em agosto deste ano de uma operação de busca e apreensão da Polícia Civil do Distrito Federal (PCDF) que apura um esquema de lavagem de dinheiro.
Atualmente ele está lotado como auxiliar no gabinete do senador bolsonarista Jorge Seif (PL-SC), que foi Secretário Nacional de Pesca e Aquicultura entre 2019 e 2022 no governo passado.
Flávio Bolsonaro
O filho 01 de Bolsonaro continua como senador pelo PL no Rio de Janeiro. Assim como o irmão, Flávio também é membro suplente da CPMI dos Atos Golpistas de 8 de Janeiro, onde tem defendido as teses bolsonaristas, algumas delas desinformativas.
Eduardo Bolsonaro
Filho 03 de Bolsonaro, Eduardo (PL-SP) foi reeleito deputado federal por São Paulo nas últimas eleições. Em março deste ano, ele abriu uma empresa nos Estados Unidos, a Braz Global Holding LLC, conforme revelou uma investigação feita em uma aliança entre a Agência Pública e o UOL, liderada pelo CLIP (Centro Latinoamericano de Investigação Jornalística).
Um dos primeiros negócios da empresa de Eduardo foi se tornar administradora de outra companhia, em um negócio que, de acordo com especialistas ouvidos pela Pública, tem “indícios clássicos de lavagem de dinheiro”.
Outra reportagem feita pela aliança mostrou que a empresa de cursos do deputado está sediada no mesmo local que outra empresa que fabrica produtos com frases falsas e golpistas. A revelação fez com que deputados apresentassem um pedido de investigação da Eduardo Bolsonaro Cursos, que não foi declarada ao TSE.
Eduardo Bolsonaro também é membro suplente da CPMI dos Atos Golpistas de 8 de Janeiro, onde tem defendido a tese bolsonarista de que o governo petista, vítima da tentativa de golpe dos extremistas, tinha interesse na invasão dos prédios públicos.
Silvinei Vasques
O ex-diretor geral da Polícia Rodoviária Federal (PRF) foi preso dia 8 de agosto pela Polícia Federal, por suposta interferência no segundo turno das eleições presidenciais de 2022. A PRF realizou durante o segundo turno do pleito mais de 500 operações em diversas estradas do país.
Na véspera das eleições, Silvinei ainda pediu votos para Bolsonaro nas redes sociais. Ele publicou uma imagem da bandeira do Brasil com as frases “Vote 22. Bolsonaro presidente”, mas depois apagou a postagem.
Paulo Sérgio Nogueira
Ex-ministro da Defesa de Jair Bolsonaro, o general do Exército Paulo Sérgio Nogueira foi citado no depoimento do hacker Walter Delgatti à CPMI do 8 de Janeiro como um suposto facilitador do acesso do hacker ao ministério.
Delgatti disse que havia sido contratado por Bolsonaro e pela deputada federal Carla Zambelli (PL-SP) para criar um código fonte falso e buscar vulnerabilidades nas urnas eletrônicas.
Para tal, precisaria acessar o Ministério da Defesa, e teria supostamente sido conectado à Nogueira pelo ex-presidente.
No total, o hacker afirmou que foi ao Ministério da Defesa cinco vezes em encontros com o ex-ministro e com o pessoal de tecnologia de informação. A veracidade das denúncias está sendo apurada pela Polícia Federal.
Boas informações.