Nova composição do Codema de Itabira está agora sob total domínio empresarial

Foto: Carlos Cruz

Quando o conselheiro Sydney Almeida Lage, representante reeleito pelo Rotary, declarou em alto e bom som que o Conselho Municipal de Meio Ambiente (Codema) existe para “defender e agilizar os interesses dos empresários”, poderia até soar como uma figura de retórica. Mas não foi.

Sua afirmação foi direta, sem rodeios, e reflete exatamente a realidade do órgão, embora ele ocupe uma cadeira destinada às entidades civis de defesa dos interesses dos moradores.

Como já era esperado, a nova composição do Codema, aprovada nesta terça-feira (10) durante reunião no Parque Natural Municipal do Intelecto, consolida o domínio do setor empresarial sobre o conselho ambiental.

E as vozes que poderiam destoar do coro dominante (tem conselheiro que entra mudo e sai boquifechado das reuniões) foram reduzidas a quase um sussurro.

A Cáritas Diocesana, representada no conselho anterior pelo professor Leonardo Reis, da Unifei, que a pedido não seria reconduzido ao conselho, perdeu sua vaga para a Sociedade Ambiente Vivo, entidade formada por empregados da Vale e estudantes de curso técnico em Meio Ambiente.

Com isso, a cadeira que antes representava uma visão crítica em defesa dos interesses coletivos e difusos da coletividade, sem “perfumarias”, deixa de existir para se ter um maior controle social sobre os impactos globais da mineração.

É assim que a eleição para o próximo mandato, válido para o período 2025–2027, reforça a predominância empresarial sobre o órgão ambiental municipal.

Consulta pública

Foi Leonardo Reis quem, com firmeza nas questões ambientais levantadas, provocou a necessária discussão sobre os impactos socioambientais da mineração, antes de o Codema aprovar anuência para a Vale prosseguir com o pedido de licenciamento ambiental de ampliacao das cavas das minas do Meio e Conceição.

A consulta pública foi realizada em 12 de maio, no auditório do Paço Municipal Juscelino Kubitschek. Sem a intervenção incisiva do conselheiro da Cáritas, essa consulta pública, com os questionamentos legítimos da sociedade, simplesmente não teria ocorrido.

E a anuência teria sido reduzida a um mero protocolo burocrático de consentimento, sem compensações ambientais e sociais.

Isso enquanto a empresa seguiria se vangloriando do número de empregos e receitas que a mineração continuará gerando para o município, afinal “é a economia, estúpido”.

Com a disputa colocada em votação pelos conselheiros indicados para o próximo mandato, mesmo antes da posse, a Sociedade Ambiente Vivo obteve nove votos, contra apenas três da Cáritas.

Disputa entre as instituições acadêmicas

Outro embate que evidenciou a hegemonia empresarial no Codema ocorreu entre as instituições de ensino superior Funcesi (particular) e Unifei (pública).

A Funcesi, que ocupa a vaga no conselho desde que o órgão ambiental municipal deixou de ser meramente consultivo para se tornar deliberativo, reafirmou sua posição como titular sem abertura para uma alternância de titularidade e suplência.

A professora Ana Carolina Vasques Freitas, pós-doutora em Ciência da Atmosfera pela Unesp e candidata à suplência pela Unifei, tentou convencer a conselheira da Funcesi, Flávia Pantuza, a abrir mão da titularidade para promover um rodízio democrático.

A resposta foi peremptória. “Planejamos permanecer na titularidade do Codema”, afirmou Pantuza.

O resultado da votação entre as instituições de ensino superior foi previsível: Funcesi, 12 votos; Unifei, três.

Cadeiras cativas das mineradoras

Além dessas movimentações estratégicas, o domínio empresarial sobre o Codema se mantém também pelas vagas destinadas às mineradoras. A Vale continua com sua cadeira cativa, e a Belmont Mineração mantém sua presença quase também cativa.

Neste ano, houve uma disputa inédita pela vaga do setor mineral, com três empresas pleiteando o posto: Bemisa, que ficou com a suplência, e Mineração Canaã, que poderá participar das reuniões caso se inscreva previamente.

Essa movimentação reforça a importância da pauta ambiental para o setor empresarial, pelo controle social necessário para manter sua influência sobre as decisões do conselho.

Enquanto isso, entidades da sociedade civil, como a Interassociação, que historicamente ocupava vaga no Codema representando as associações de moradores de Itabira, sequer indicaram representantes dessa vez, deixando ainda mais evidente o desequilíbrio na composição do órgão ambiental.

Saiba mais

Criado em 1986, o Codema tem como finalidade avaliar os impactos ambientais no município, com ênfase na atividade mineradora, mas também com responsabilidade sobre a defesa dos interesses coletivos da sociedade – muitas vezes em confronto direto com o poder econômico.

A nova composição do conselho revela a perda de representantes com posições críticas e a redução da diversidade de vozes na tomada de decisões. Com isso, consolida-se um viés institucional claramente favorável ao setor produtivo.

Isso, ainda que, ironicamente, a única entidade patronal de Itabira, o Sindicato Rural, tenha ficado de fora do conselho por não ter observado a exigência do edital e enviado sua documentação por e-mail, ao invés de entregar presencialmente na Secretaria, no Parque do Intelecto.

Veja como ficou a composição do Codema 2025-2027

Associações de classes de atividade profissionais

Titular: José Silvério de Souza – Associação dos Engenheiros, Arquitetos, Agronômos  de Itabira (Asseag).

Suplente: Josiano Josiel Rodrigues Rodrigues Silva (Asseag)

Associações de classes de atividades econômicas

Titular: Olavo de Souza Oliveira (Acita)

Suplente: Sirlane Pereira de Souza (Acita)

Entidades mantenedoras de ensino superior

Titular: Flávia Martins Guerra Pantuza (Funcesi)

Suplente: Gustavo Alves Puiatti (Unifei)

Atividades minerárias

Titular: Herlaine Silva (Belmont Mineração)

Suplente: Breno Fonseca Starling (Bemisa)

Vale S.A

Titular: Breno Sales Caldeira Brant

Suplente: Luiz Augusto Moysés de Magalhães

Entidades civis de defesa dos interesses dos moradores

Titular: Patrícia de Freitas Vieira (OAB-Itabira)

Suplente: Kelly Magalhães Silva das Chagas (OAB-Itabira)

Titular: Sydney Almeida Lage (Rotary Club)

Suplente: Ricardo Gonçalves (Rotary Club)

Clubes de Serviço

Titular: Glaucius Detoffol Bragança (Loja Maçônica União e Paz)

Suplente: Heraldo Marçal Santos (Loja Maçônica União e Paz)

Sindicato dos Trabalhadores

Titular: André Viana Madeira (Metabase)

Suplente: Adriano Rodrigues Silva do Carmo (Metabase)

Empresas loteadoras ou incorporadoras

Titular: Leonardo Ferreira Reis (Construtora HR Domínio)

Suplente: Lucas Grisolia Barbosa (Construtora HR Domínio)

Entidades Civis de defesa da qualidade do meio ambiente

Titular: Amarildo da Conceição Milânio (Savi)

Suplente: Maria Inês de Alvarenga Duarte (Cáritas Diocesana)

 

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2 Comentários

  1. Fiquei muito abalada com o resultado: O Codema de Itabira é empresarial. Não tem representante da comunidade. Ressalto que o Codema nasceu para ser um conselho em defesa da sociedade, portanto deve ter os vários segmentos da comunidade. A Unifei tem de participar, assim como a Cáritas e representantes das Barragens. Registro aqui o meu protesto

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