No Flitabira, autoras refletem sobre o tempo presente e a força da palavra

Em destaque, Isabela Noronha, Silvana Tavano, Teresa Cárdenas e Ricardo Ramos Filho

Foto: Carlos Cruz

Escritoras emocionam o público com histórias de amor, dor e esperança

Nessa quinta-feira (30), a segunda mesa do dia no 5.º Festival Literário Internacional de Itabira (Flitabira) levou ao palco do teatro da Fundação Cultural Carlos Drummond de Andrade (FCCDA) uma conversa intensa e sensível entre as escritoras Silvana Tavano, Teresa Cárdenas e Isabela Noronha, com mediação de Ricardo Ramos Filho.

O título da mesa, O Sentimento do Mundo, evoca o livro de Carlos Drummond de Andrade publicado em 1940 – e serviu como ponto de partida para uma reflexão profunda sobre o tempo presente, marcado por perplexidade, medo e resistência.

Raiva, perplexidade e a escrita como resposta

Logo no início, Silvana Tavano leu trechos do poema que dá nome à mesa e comentou como a raiva e a perplexidade diante do mundo atual são motores da sua escrita. “A arte é a expressão da subjetividade. Quando se mata em massa, mata-se também a possibilidade de cada um existir como é”, disse, referindo-se aos recentes episódios de violência no Rio, no Brasil e no mundo.

Teresa Cárdenas, escritora cubana, compartilhou sua indignação com a banalização da crueldade e a naturalização da barbárie. “O que me chocou mais não foram só as imagens, mas os comentários. Há quem ache tudo isso legítimo. Isso me desilude profundamente.”

A poesia como elo de amor e memória

Em um dos momentos mais tocantes da noite, Teresa contou uma história de amor real entre uma amiga cubana e um diplomata apaixonado por poesia brasileira. Mesmo separados por décadas, eles mantiveram viva a conexão trocando poemas de Drummond por carta.

O filho dela recebeu o nome de Drummond, “um cupido literário”, como definiu a escritora. “A poesia foi o abraço que os manteve unidos no tempo e na distância.”

Ela também leu o poema Ausência, de Drummond. E desejou que os que perderam entes queridos possam, um dia, assimilar a ausência como presença. “Essa ausência está em mim”, repetiu, comovida.

A cidade, o tempo e a mãe como matéria literária

Isabela Noronha falou sobre seu romance Carlabê, ambientado na região central de São Paulo. A protagonista, uma mineira deslocada, conversa com um interlocutor invisível enquanto caminha pela cidade. “A cidade participa da conversa. Ela trata os corpos, os diversos corpos. E eu quis trazer essa sensação de pertencimento e deslocamento para o texto.”

Silvana Tavano, por sua vez, falou sobre o seu livro Ressuscitar Mamutes, escrito durante a pandemia. “O tempo sempre foi um tema central para mim. E naquele tempo suspenso, em que os dias não tinham nome, comecei a escrever fragmentos.”

Esses fragmentos, aos poucos, se conectaram em uma narrativa híbrida, onde a figura da mãe, como “uma eternidade em nós”, tornou-se o eixo da simultaneidade entre passado, presente e futuro.

O Mulo e a escuta como gesto político

Teresa também falou sobre O Mulo, seu livro mais recente “não o último”, como fez questão de frisar, publicado no Brasil. Inspirado nas histórias contadas para fazer seu filho dormir, o livro homenageia a tradição oral africana e traz um protagonista que sonha em ser famoso e bilionário — sem perceber que a felicidade talvez esteja muito mais próxima do que imagina.

“É uma história divertida, mas também uma crítica à busca desenfreada por identidade e sucesso. O Mulo quer se parecer com os poderosos, mas não sabe quem é.”

O mediador Ricardo Ramos Filho, escritor e presidente da União Brasileira de Escritores, destacou em sua fala a importância da escuta como gesto político e literário. “A escuta é uma forma de resistência. Quando ouvimos o outro com atenção, abrimos espaço para que a subjetividade sobreviva. E isso é o que a literatura faz: ela escuta e dá voz.”

Teresa fez a leitura do poema Quiero, em espanhol, exaltando o amor como presença constante e verbal. “Quero ser amada por e em tua palavra. Amor, salgamento da língua nacional.”

Em sua fala, a esperança se vestia de verde, literalmente, assim como estava vestida, como um gesto de fé e esperança na literatura e na vida.

Serviço

5.º Festival Literário Internacional de Itabira – Flitabira

Data: De 29 de outubro a 2 de novembro, quarta-feira a domingo

Local: Fundação Cultural Carlos Drummond de Andrade e avenida lateral.

Entrada gratuita

Toda a programação é transmitida online pelo Youtube @flitabira

Acesse a programação completa em www.flitabira.com.br

 

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