Laços de sangue e de crime em Itabira do Matto Dentro – Asas de Corvos
Arte de Gustavo e Otávio Pandolfo. Exposição Os Gêmeos, no CCBB, Rio. MCS, outubro de 2022
Pesquisa e fotos: Cristina Silveira
1869 Drummond derruba negócio de Penido
Demanda. O sr. dr. Penido Júnior, por parte do sr. Emílio Santa Barbara, veio propor-nos uma demanda para levantar do nosso cofre as quantias, que para ele entraram pela doação que a senhora d. Anna Barbara de Noronha Lage, fez ao hospital [Nossa Senhora das Dores], de duas escrituras de hipoteca no valor de 14:500$ que a senhora d. Maria Jesuína d’Oliveira Horta, mãe tutora do sr. Santa Barbara, devia à mesma senhora e que o hospital cobrou, asseverando-nos que pelos exames que fez conhecer que a sra. d. Maria Jesuína ficou alcançada para com seu filho em mais de 20:000$, e que tendo os menores hipoteca tácita geral e privilegiada nos bens dos seus tutores, o hospital devia repor toda a quantia recebida.
Como era natural a mesa administrativa do hospital sofreu um terrível choque com este anúncio, e pode-se dizer que toda a Itabira mostrou-se sentida, e fazia votos para que o mal não se realizasse. Logo que este negócio se fez público, o sr. dr. João Baptista Carvalho Drummond ofereceu-se para defender o hospital sem o menor estipendio pelo seu trabalho, e no intuito de colher os precisos dados para a defesa, passou com o procurador do hospital, o sr. capitão Lúcio José da Circuncisão Ottoni, a examinar os livros, donde o sr. dr. Penido tinha tirado os dados para propor a demanda e chegou a este feliz resultado: o sr. Santa Barbara só tem que haver 800$, e como das ditas hipotecas há sobras, porque os bens hipotecados excedem à dívida, pode o sr. Santa Barbara receber a quantia em que sua mãe e tutora ficou alcançada sem incomodar o hospital.
O nosso espírito ainda vacilava perante tão grata notícia, por que os bons desejos do desinteressado advogado e do zeloso procurador, o afã, e rapidez com que analisaram as contas, facilitar-lhes-iam talvez erros ou enganos; porém em breve o próprio braço, que nos ameaçava do golpe fatal, ministrou-nos meios para não mais duvidar do resultado colhido. Refiro-me à proposta, que à mesa administrativa dirigiu o advogado adverso.
Afiançou-nos ele que o hospital tinha, devia, e havia de restituir uma quantia superior à de 17:000$ e que isto contestar era negar a luz quando o sol estivesse em pino! Citou disposições de direito, e diversas opiniões de jurisconsultos que protegiam sua causa, mostrando-se tão firme que ordenara e queria ser obedecido.
Entretanto, jactando-se de uma generosidade desconhecida, e afetando desejos de proteger ao hospital, convidou a mesa a uma combinação amigável afim de evitar-se alguns mil réis de custas! Podia a mesa aceitar tal convite? Não: dizem nossas leis. Procuradores públicos nem perante o juiz podem transigir, artigo 6⁰ das disposições provisórias. Tal proposta portanto só serviu para mostrar-nos que o advogado adverso não tinha confiança em seu direito e queria evitar a discussão no foro competente. O remédio neste caso era abandonar a causa, e foi o que ele fez.
Espalhando-se pela cidade tão grata notícia, lia-se no semblante de todos a satisfação que lhes transbordava na alma, por verem o hospital livre de um prejuízo, que o obrigaria a diminuir consideravelmente o número de seus beneficiados. Fatos desta ordem revelam que esta instituição goza de sabido crédito, e merece proteção e simpatia de todos os verdadeiros amigos da humanidade.
[Diário do Rio de Janeiro, 10/4/1869. BN-Rio]
1870 A bandeira tricolor em Itabira
Esqueci-me de tudo, até de mandar a V. notícias desta importantíssima província. Também muito pouco tinha a dizer porque Minas infelizmente não tem progredido nestes últimos tempos. Suas estradas estão no mais miserável estado. Em matéria de instrução pública o regresso é espantoso. Ainda há poucos dias o ex-presidente da província em peça oficial fez a respeito uma confissão desanimadora.
O seu estado de finanças que era lisonjeiro está ameaçado de uma crise com a supressão da taxa interina cobrada na ponte do Paraibuna, onde só a companhia União e Indústria pagava mensalmente à província a quantia de 6:000$.
Por outro lado, o espirito público está abatido, desanimado. Aquela fé viva nas instituições que é o principal nervo da iniciativa individual vai desaparecendo de um modo assustador.
Na Diamantina e na Itabira a bandeira tricolor é desenrolada aos olhos da autoridade que sente se fraca para conter os desordeiros. Na Itabira um rancho de povo arrebenta as portas, entra na sala, nos quartos e quebra a mobília de uma das principais autoridades.
Minas oferece campo vasto a uma capacidade ativa. Tudo está por fazer. Seus terrenos ubérrimos, suas ricas minas de metais e de diamantes, sua população inculta pede estradas, indústria e instrução. Uma serie de regulamentos complicados como as molas do grande relógio da torre de Strasbourg põe obstáculos continuados ao seu progresso.
[José Maria Correia de Sá e Benevides, governador da província de Minas Gerais entre 1869 e 1870]
[Jornal de Recife (PE), 16/6/1870. BN-Rio]
1871 O súdito francês
Minas Gerais. No dia 28 do mês próximo passado (maio) às 9 horas da noite, na cidade de Itabira, o delegado de polícia tenente Carlos Augusto Ribeiro Campos, indo pessoalmente ao lugar onde constava haver apeado o súdito francês Simão Gain, aí o prendeu, visto estar pronunciado pelo juízo de Barbacena como incurso no art. 264 do código criminal por ter vendido por prata, uma imagem do Crucificado, que era de metal diverso. Ao mesmo tempo, o tenente Campos desarmou o réu que estava munido de um bom revólver de seis tiros.
[Jornal de Recife (PE), 25/7/1871. BN-Rio]
1871 O interprete dos indígenas
No dia 4 do corrente chegou a esta capital, tendo sido remetido pelo delegado de polícia da Itabira, o preso Antônio Pinto da Costa, afim de ser aqui processado pelos crimes de falsidade e estelionato, que cometeu, afim de obter do governo 50$, como interprete dos índios do norte do Rio Doce.
[Jornal de Recife (PE) 20/9/1871. BN-Rio]
1872 Nos Monjolos, caiu Manoel Em Pé
Refere o Noticiador – Floriano Alves Pereira, oficial de Justiça da Itabira, indo no dia 10 de maio, aos Monjolos (subúrbio da cidade), à casa de Manoel Thomaz, conhecido por Manoel Em Pé, citá-lo para uma conciliação, este, ao ouvir e ler a petição, enfureceu-se, e, lançando mão de um machado, deu tão tremendo golpe na cabeça de Floriano, que o prostrou, repetiu o segundo, e julgando-o morto, tirou-lhe a roupa, e arrastando-o por uma ribanceira, tratava de enterra-lo em um brejo.
Chegando algumas pessoas ao terreiro e vendo as filhas de Manoel Em Pé muito perturbadas, varrendo e cobrindo com terra porções de sangue, desconfiaram da existência de algum crime e, seguindo o rastro do mesmo sangue, chegaram ao alto de uma ribanceira, e viram em baixo o desgraçado oficial de justiça, tendo junto de si a enxada com que o assassino pretendia abrir-lhe a sepultura; desceram; e como ainda respirasse, conduziram-no para casa.
Compareceu logo o delegado de polícia, que procedeu ao auto de corpo de delito e expediu as ordens para a prisão do assassino, que conseguiu evadir-se. Floriano faleceu 36 horas depois. A mulher e filhos de Manoel foram recolhidos à cadeia, e interrogados, referiram o fato com todas as circunstâncias.
[Diário de Pernambuco, 9/7/1872. BN-Rio]
1874 Em Senhora do Carmo: 4 contra 1
Ferimento grave. No dia 1º de janeiro deste ano, no distrito do Carmo, termo da Itabira, foi gravemente ferido Joaquim Lelis, por Felício Francisco, sua mulher e duas filhas, que foram presas em flagrante e estão sendo processadas.
[Diário de Minas, 13/2/1874. BN-Rio]
1874 Mãe aflita
Suplica. D. Maria Joaquina de Abreu Drummond, residente em Itabira de Matto Dentro, província de Minas, na completa ignorância do destino que tomou seu filho Joaquim Pedro de Magalhães Drummond roga ao mesmo ou a quem dele souber qualquer notícia sua, com que se fará caridoso favor a uma mãe aflita.
[Jornal do Comercio (RJ),17/8/1874. BN-Rio]
1874 Provocação
Itabira. José Isidoro de Magalhães Drummond ao professor João Baptista de Souza Telles, residente no arraial da Prata, município de Santa Barbara. Assoalha o sr. João Baptista de Souza Telles que eu, a requerimento do vigário de sua freguesia, assinei termo de bem viver. Provoco o sr. Telles a fazer publicar a sentença, que a semelhante humilhação me condenou, sob pena de ser havido por mentiroso-confesso. Itabira, 10 de agosto de 1874. José Isidoro de M. Drummond.
[Diário de Minas, 21/8/1874. BN-Rio]
1874 O Leão de Ferros
Ferimento. No dia 14 do corrente, Francisco Teixeira Leão feriu gravemente a José Delfino de Souza Junior no distrito de Sant’Anna dos Ferros, termo de Itabira. O delegado de polícia, apenas soube do fato, dirigiu-se ao lugar do crime e aí procedeu a auto do corpo de delito e inquérito policial.
[Diário de Minas, 17/11/1874. BN-Rio]
Dª Anna Barbara de Noronha Lage era viúva do Barão do Alfié, Joaquim Carlos da Cunha Andrade, o qual deixou em testamento o terreno onde hoje encontra-se instalado o Hospital Nossa Senhora das Dores no bairro Penha.
Também deixou um valor de boa monta em favor da Irmandade Nª Sª das Dores, o qual deve ter sido arrolado esse título de dívida do Sr. Emílio Santa Bárbara era devedor.
Da Bandeira Municipal não sei ao certo a data que foi oficializada a atual.
Monjolo era o local onde se quebrava pedras de minério de canga em monjolos para triturá-lo e daí retirar ouro. Esse local sita na entrada do bairro Praia e hoje é representado pelo edifício de mesmo nome.
E acho que o menino fujão Joaquim Pedro retornou à sua casa para alegria da desesperada mãe.
Mauroquerido, você é espetacular, muito obrigada por completar as crônicas colhidas na grande Casa dos Livros do Brasil.