Itabirano fica rico com venda de diamante encontrado no papo de uma galinha comprada em Itambé do Mato Dentro
Por Tita Lage, da Glória
A Serra Verde, “fermosa e resprandescente”
O caso da galinha encontrada com diamante no papo, em Itambé do Mato Dentro, aqui narrado através de uma notícia e um poema, publicados em 1944 nos jornais carioca Dom Casmurro e A Notícia é uma história extraordinária em que se fica rico por conta do acaso, sem ser aquela figura predadora, que é o exemplo dos mineradores nas fraldas da Serra do Caraça. Garimpo Cangaço Esquadrão da Morte Milícia são ideologias de Domingos Velho.
Encontrou uma fortuna dentro da galinha
A Notícia, 22/1/1944
A ave andara ciscando num terreno diamantífero. Divulgada a notícia, houve verdadeira corrida para comprar os galináceos da zona…
BELO HORIZONTE, 22 (Da sucursal de A NOITE) – O sr. Adolfo Martins da Costa, residente na Estação Presidente Vargas, outrora Itabira, o maior empório de ferro do mundo, adquiriu meia galinha, com a qual pretendia fazer suculenta canja. E, qual não foi sua surpresa e emoção ao encontrar-lhe no papo que, na transação, lhe coubera como contrapeso, uma belíssima pedra que foi avaliada em CR$ 30.000,00. Correndo a notícia do achado maravilhoso, apurou-se que a ave procedia de Itambé, onde costumava ciscar um terreno diamantífero ali existente a qual, não querendo imitar o galo da fabula, que repetira a perola, desejando antes, um grão de milho, engolira o carbonato, na falta de coisa melhor e mais substancial (para ela naturalmente…).
À Vista disso, inúmeras pessoas acorreram a Itambé e compraram todos os galináceos existentes na zona na esperança de que lhes suceda o que aconteceu ao sr. Adolfo Martins da Costa.
(BN-Rio/pesq.mcs1375]
Viagem a Itambé com Saint-Hilaire e Mario de Andrade
É interessante conectar “o caso” a um trecho de Caboclo de Taubaté, ensaio do Mario de Andrade publicado em 1930, em que disserta sobre o adágio português, “Cabra que faz mé” para Caboclo de Taubaté, adágio paulista. O ensaio reproduz trecho do livro do viajante Saint-Hilaire que menciona Itabira e Itambé.
.. há mais dum século, por 1817, Saint-Hilaire já colhia o adágio com o respectivo latinório, em Minas Gerais. Quando foi de Itabira a Vila do Príncipe, o naturalista passou por Itambé, vilarejo mesquinho, cuja a existência já não tinha mais razão viva de ser, com o desaparecimento do ouro que lhe vinha na água do rio do mesmo nome. É então que conta (Voyage dans les provinces do Rio de Janeiro e Minas Gerais, Cap. XIII) que o lugar “estava numa decadência tal que não se poderia comparar com nenhuma outra, tudo caindo em ruina”. “Não é sem razão, comenta, que se repete por aqui, este proverbio já citado por outro viajante, A Miseriis Itambé, libera nos, do Mine”. Latinagem da gema, bem própria dum Estado em que, me contaram, até hoje tem gente que fala latim, na isolada Paracatu. Mas Saint-Hilaire aproveita ainda o momento pra dar uma variante do latim, colhida por ele nas cercanias de Caeté, diz:
Itabira, Itambé,
Samambaia e sapé,
Meirinhos de Caeté,
Libera nos Dominé!
Cartas de Molho
Dom Casmurro 5/2/1944
Por Sebastião Fonseca
Um cidadão residente em Itabira encontrou no papo de uma galinha um belíssimo diamante que foi mais tarde avaliado em CR$ 30.000,00. O que resultou veremos a seguir:
Quando o Adolfo Martins da Costa
(esse o nome do sujeito)
Meteu a faca com jeito
No papo da galinácea,
Foi tal o abalo que teve
Vendo o bruto do brilhante
Que logo no mesmo instante
Foi parar numa farmácia.
Vinagre sal amoníaco,
E o Adolfo “ressuscitado”,
Contou ao povo assombrado
Como e porque desmaiara.
Foi um sucesso, um espanto
Pro poviléu de Itabira:
Jamais alguém por lá vira
Pedra tão linda, tão rara.
Com explicar que a “penosa”
Tivesse engolido a gema?
E a solução do problema
Empolgou a tanta gente
Que o pobre do Adolfo Costa
Percebendo a coisa feia
Foi se esconder na cadeia
Com tremedeira evidente.
Fez-se, afinal, luz no caso:
A galinha milagrosa
Comera a pedra preciosa,
Num lugarejo: Itambé.
Zona que foi diamantífera.
Mas hoje, pobre coitada,
Já não presta mais pra nada
Tão rambles que agora é.
O efeito foi fulminante:
No mesmo dia, à tardinha,
Não havia uma galinha
Naquela zona esquecida;
Galinhas só, não senhores:
Patos, perus, tudo em suma,
Que pudesse ter alguma
Pedra no papo escondida.
O importante era que o bicho,
Fosse taludo ou nanico,
Tivesse andado com o bico,
Ciscando aqui e acolá,
Nos terrenos diamantíferos
Onde a galinha encontrara
A pedra custosa e rara
Que foi pro Adolfo um chuá.
Ora, entre as aves compradas
No afã de achar um brilhante,
De Itabira um habitante
Chamado Zeca Sampaio
Ficou tão alucinado
Que comprou, e bem baratos,
Quatro galinhas, dois patos,
Três perus e… um papagaio.
– Dez papos! Um, pelo menos,
Tem um brilhante colosso!
E, zás, faca no pescoço
Dos patos e dos perus…
O papagaio, encolhido,
Olhava pra quilo tudo
Dizendo as vezes trombudo:
– Barbaridade!… Jesus!
É em vão, no entanto, que o Zeca
Liquida com o galinheiro.
Nem um brilhante… Nem cheiro
Do ambicionado tesouro…
Até que Zeca, “por conta”,
Morta a última galinha,
Pega o facão da cozinha
E avança firme pro “louro”.
– Seu Zeca, não faça isso!
Berra logo o papagaio,
Prestes a ter um desmaio,
– Comigo, não! Alto lá!
E com lágrimas nos olhos:
– Comer brilhante? Uma ova!
Porque não tira uma prova
Com um copo de Rubinat?