Itabira, uma cidade entristecida

Mauro Andrade Moura

Itabira já foi cidade educativa, cidade do bem viver e agora segue entristecida em si mesma.

Desde 1970, com a implantação do Movimento Brasileiro pela Alfabetização (Mobral), que para muitos foi um enorme fiasco, mas para o professor Darcy Ribeiro foi um sucesso para o fim que foi criado, que teria sido o de manter o povo analfabeto sabendo apenas desenhar o nome, depois com os Supletivos e por último com o EJA, o Brasil até que se esforçou para erradicar o analfabetismo.

Também com o plano nacional de educação, lançado em meados dos anos 60, já na ditadura militar, o ensino básico passou a ser obrigatório para todos os menores de quatorze anos, o que em 1988 foi inserido em nossa Constituição Federal.

Colchão e resíduos nos passeios, junto com mato: insalubridade total (Fotos: Mauro Moura}

Passados esses 50 anos, podemos afirmar que caiu consideravelmente o número de analfabetos no Brasil, com exceção dos mais idosos e das crianças. Graças a esses programas de enfrentamento ao analfabetismo, o número de analfabetos no país caiu de 11,5%, em 2004, para 8,7% em 2012, na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad).

Há de se considerar, e lastimar, ainda que muitos alfabetizados, como no tempo do Mobral, aprenderam a ler e distinguir números, mas são incapazes de interpretar um texto – são os analfabetos funcionais.

Entulhos de construção ocupam os passeios, obstruindo o caminho de pedestres

Ainda para garantir a educação, existem normas organizacionais dos municípios com as leis orgânicas, código das cidades e de posturas, planos diretores. E o cidadão não pode simplesmente negar o conhecimento dessas normas, sine qua non as leis e normas são para todos.

Todo esse “nariz de cera” é para dizer que, mesmo com educação formal, o itabirano de um modo geral é muito mal-educado.

Nada entende de civilidade, cuida patavina alguma do espaço público – aliás, nem sabe que o espaço público, como o seu próprio nome diz, é de todos e deve servir ao bem-comum. Não deveria nunca ser confundido como sendo espaço privativo seja de quem for.

Flanerando por aí

Aproveitando as ruas vazias desse de isolamento social, e deixando momentaneamente de lado a “prisão domiciliar” voluntária, por enquanto, e necessária, fiz algumas caminhadas para aproveitar algum facho de luz do sol.

Mato em lotes vagos é “mato” por toda cidade

Aliás, a falta de vitamina D, com todo mundo em casa, pode ser uma das consequências graves à saúde em tempo de pandemia de coronavírus.

Mas, enfim, nessas caminhadas pude observar – e fotografar – como a cidade anda entristecida em si mesma. Senão, vejamos.

A nossa Itaurb (digo nossa pensando naquela empresa premiada, que implantou a coleta seletiva em Itabira pioneiramente no país, juntamente com Curitiba), mesmo com toda dificuldade financeira e problemas administrativos que perduram, e ainda em tempo de Covid-19, vem recolhendo os resíduos na cidade e fazendo a varrição necessária. Como ficou sem a função, terceirizada, de fazer também a capina em áreas públicas, a prova de que não foi uma boa medida é a quantidade de matagal em áreas verdes, que deveriam ser cuidadas pela administração publica, até para servir de exemplo e pela profilaxia necessária.

Inclusive em área pública o matagal impera, já que a Itaurb não faz mais capina

Como a Itaurb não cuida mais dessa parte, as áreas verdes viraram um enorme matagal – e só servem aos olhos da administração municipal para vender e aumentar o “caixa” para o erário fazer obras, sabe-se lá com que grau de prioridade, nenhuma, se me permitem dizer.

Pois, bem, voltemos a pauta principal. Agora que a coleta de resíduo não está mais distinguindo resíduos secos (recicláveis) dos molhados (orgânicos), isso não pode servir de desculpa para separar nossos resíduos em casa.

Não podemos perder, digamos, essa “cultura”. Devemos continuar separando, mesmo que o centro de triagem existente no bairro Nova Vista tenha deixado de funcionar, que é para não contaminar os separadores. Infelizmente, seguem agora juntos e misturados para o aterro ainda sanitário.

Mas com a Itaurb fazendo a varrição, e ainda recolhendo os resíduos com um trabalho inseguro e insalubre dos coletores, era para a cidade figurar entre as mais limpas do país, não obstante a poeira da Vale que sufoca e suja Itabira mesmo no período chuvoso, sem que a empresa sequer peça desculpas por tamanha falta de educação.

Uma cidade inteira de resíduos

Mas é essa falta de educação do itabirano que se observa flanerando pelas ruas da cidade. Não se sabe se é por falta de novas campanhas educativas, mas o certo que falta consciência de muitos dos que aqui vivem de como se deve cuidar bem da cidade.

Se não mais serve em casa, jogue na rua. A sobra de construção também

É em consequência desse pouco cuidar, que vemos resíduos diversos sendo lançados em logradouros públicos e mesmo deixados na porta das casas, muito antes da data de recolhimento pela Itaurb.

Como já escrevi acima, Itabira foi a primeira cidade de Minas Gerais e uma das primeiras do país a implantar a coleta seletiva de resíduos, separando o orgânico do reciclável. Porém, o que vemos atualmente é toda sorte de lixo espalhado e misturado, derramado pelas vias públicas.         

Em alguns condomínios residenciais, mesmo antes da suspensão temporária da reciclagem, os moradores misturam todo tipo de lixo. Desconsideram assim o esforço que até então existe – e que se espera volte a ocorrer após a pandemia, mantendo-se o serviço de reciclagem. Isso sem contar o desperdício do descarte de material reciclável juntamente com o lixo orgânico.

Outro passeio entulhado de material de construção: sem fiscalização

Como se observa, não é por falta de educação formal, não obstante os analfabetos funcionais serem tantos, inclusive nas classes tidas como mais “cultas”.

Outra tremenda falta de educação e civilidade é lançar lixo em terrenos baldios, muitos abandonados, sem que se façam a necessária capina, atraindo vetores e animais peçonhentos, além do mosquito da dengue.

Na outra esquina, deparo-me com uma calçada entulhada de material de construção ou sobras sabe-se lá de quê. É a “cultura” de se limpar a casa jogando a sujeira para a rua, como se a pessoa não fizesse parte e devesse zelar pelo espaço público, que teoricamente é de todos.

Fraldas jogadas em área verde: sujeira para todo lado

Vemos também móveis velhos descartados a esmo por toda cidade. Na rua seguinte, fraldas descartáveis com toda sujeira jogada em uma praça, próxima da ponte do Aprígio. Esse mesmo tipo de resíduo é comum ser deixado em uma praça no bairro Pará, em frente ao PSF, bairro esse tido como de gente elegante, sincera e educada.

Uma mãe que não sabe dar destinação adequada aos resíduos que gera em casa, não dá conta do bem educar o seu filho, que cresce vendo esse péssimo exemplo materno, ou paterno. São tantas fraldas recheadas, rompidas e espalhadas pelos passeios espalhados pela cidade que até perdi a conta. Ocupam fetidamente os caminhos de gente, que são os passeios, e ameçam a a saúde, além da nojeira.

Ameaças

Caixas d’água destampada e vasilhame com água: residência farta para o Aedes aegypti

Caixas d´água destampadas acumulando água de chuva em tempos de procriação do mosquito Aedes aegypti e as suas incontroláveis dengue, chikungunya e a temível zika, são outros objetos descartados em vias públicas, em vários pontos.

Também vi copos e sacos de plástico lançados nos espaços públicos, poluindo visualmente e ameaçando a saúde de todos. Se educado fosse, após a utilização desses materiais, as pessoas deveriam dispor nas lixeiras, embora esse aparelhamento público ande escasso na cidade. Mas que a procure fazer o descarte correto, é o que manda a boa educação

Há ainda as latas-velhas abandonadas nas ruas. A Prefeitura chegou a tomar providências a respeito, recolheu alguns poucos veículos abandonados sobre as calçadas ou ocupando espaços nas rus.

Mas em pouco tempo arrefeceu a vigilância, por certo encontrou gente amiga fazendo isso – e assim o melhor, para os interesses políticos e eleitoreiros, foi deixar de lado a fiscalização com os recolhimentos necessários.

Oficinas mecânica e lanternagem fazem do espaço público uma extensão de seus negócios

Bem próximo da Prefeitura, na avenida Cristina Gazire, bem perto do Departamento de Posturas, uma oficina de lanternagem e funilaria ocupa a avenida, como se fosse extensão de seu negócio privado. O que andam fazendo os fiscais de posturas, não se sabe, tantas são as imposturas sociais e urbanas existentes por toda a cidade.

Fiscais são para fiscalizar. Deveriam estar imbuídos da obrigação de notificar quem comete as imposturas – e multar. E no caso de reincidência, cassar o alvará de localização, lacrando o estabelecimento que não age de acordo com as leis municipais e do país.

Mas nada disso se observa na cidade e a omissão dos agentes da Prefeitura favorece os maus cidadãos que não cuidam e não têm apreço pela cidade onde vivem.

E não é por falta de legislação. O primeiro Código de Postura Municipal de Itabira data de 1831. Ou seja, praticamente temos essas normas há duzentos anos. Já a educação, mesmo tendo o país reduzido o número de analfabetos, é como se não existisse para grande parte da população desta Cidadezinha Qualquer.

 

 

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4 Comentários

  1. Parabéns amigo Mauro.
    O título da matéria é do mundo real.
    A ITAURB poderia investir numa campanha massiva para reeducar este cidadãos que acham que colocar o lixo de fora ta tudo certo, é depois implantar uma fiscalização para criar uma multa para quem desobedecer.

    1. Olá, nha amiga Aguilay.

      A legislação está aí para todos, embora a maioria finge em não conhecê-la.
      Também acho que essa campanha de mais cuidados com o lixo deve ser constante, ao invés da nossa Prefeitura ficar gastando dinheiro com coisas menores e menos impactantes ao dia a dia dos citadinos.

      Grato pela leitura,
      Mauro

  2. Está bem claro em nosso Código de Postura Municipal que se somos donos de lotes baldios, então que temos a obrigação de mantê-los limpos.
    Não estando limpos, então é obrigação do Departamento de Posturas Municipal multar o proprietário.
    Agora, deveria ser inserido no Código de Postura se acontecer a reincidência da não limpeza dos lotes baldios que os mesmo vão à leilão.

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