Investigações sobre possível irregularidade na venda de terreno para a Avelândia são arquivadas, mas Câmara pode abrir CPI
Carlos Cruz
A suspeita transação imobiliária de um terreno de 12.375 metros quadrados, localizado na rua Columbita, no Distrito Industrial de Itabira, ocorrida em setembro de 2011, foi coincidentemente arquivada no início do segundo semestre deste ano nas três esferas em que estava sendo investigada.
O terreno oficialmente foi revendido por R$ 120 mil pela empresa Trend Locação e Serviços à granja Avelândia, mas na prática a transação imobiliária foi fechada por R$ 890 mil – um valor 788,95% acima do que foi declarado oficialmente à Companhia de Desenvolvimento de Minas Gerais (Codemig).
A Codemig é sucessora da antiga Companhia de Distritos Industriais de Minas Gerais (CDI-MG), que recebeu da Prefeitura, no fim da década de 1970, esses imóveis, doados pela Vale, para vendê-los a preços subsidiados. O objetivo foi facilitar a diversificação econômica do município.
O lote de nº 18-B, da quadra 08, foi vendido pela Codemig à Trend pela quantia subsidiada de R$ 99 mil, sob a condição previamente definida de implantar um plano de negócio, que não foi cumprido. Pouco meses depois foi revendido à Avelândia.
A denúncia de que teria ocorrido irregularidade na revenda desse terreno foi apresentada pelo então vice-prefeito Reginaldo Calixto, que ocupava também o cargo de ex-secretário municipal de Desenvolvimento Econômico, na reunião do Conselho Municipal de Desenvolvimento Econômico (Codecon), no dia 10 de junho de 2013.
Inquéritos
De posse dos documentos comprobatórios da suspeita transação imobiliária, a Procuradoria Jurídica da Prefeitura encaminhou a denúncia ao Ministério Público Estadual, à Codemig e também à Contadoria Geral do Estado (CGE).
Inquéritos foram abertos na ocasião – e até a Câmara Municipal prometeu apuração acurada, para que “fatos como esse não venham a se repetir.” Mas nada fez. E tão pouco acompanhou as investigações subsequentes.
E o que parecia ser uma “bomba”, um grande escândalo de corrupção, acabou não passando de um pó de traque. Por coincidência, no início do segundo semestre deste ano, os inquéritos abertos pelo promotor da 17ª Promotoria de Justiça de Defesa do Patrimônio Público de Minas Gerais, pela CGE, e também pela Codemig, concluíram que não houve irregularidade na transação. E todos os inquéritos foram devidamente arquivados.
Fora de foco
Ressalte-se que as investigações não trataram de saber se houve ou não enriquecimento ilícito com a venda de um terreno público subsidiado, transferido pela Prefeitura à Codemig para promover a diversificação econômica de Itabira.
O que se investigou foi se houve improbidade administrativa de funcionários da Codemig, por terem cobrado uma comissão de R$ 9,9 mil devida à estatal sobre a transação imobiliária, bem abaixo do real valor final da transação. As investigações concluíram pela “pela inexistência de prejuízo ao erário estadual ou prática de ato imoral.”
O promotor Leonardo Duque Barbabela, da 17ª Promotoria da Comarca de Belo Horizonte, ao concluir pelo arquivamento de inquérito, em 6 de agosto deste ano, afirmou não ter sido comprovada “a ocorrência de irregularidades no negócio de transferência da Trend para a Avelândia.”
Enriquecimento
Entretanto, pouco antes de o Ministério Público promover o arquivamento da investigação, o corregedor Judismar Walliton Figueiredo Andrade, da CGE, em despacho datado de 11 de julho deste ano, deixa em aberto uma possível linha de investigação:
“O mencionado trabalho concluiu que a Trend Locações e Serviços enriqueceu ilicitamente, no montante de R$ 1.154.069,00, decorrente do lucro na venda à empresa Avelândia do lote 18B, Distrito Industrial de Itabira, considerando omissão do real valor da transação e descumprimento das condições previstas na cláusula V do contrato. Ademais, não se identificou que a Codemig, após ciência, tenha tomado as providências cabíveis contra a empresa.”
É por essa linha de investigação que devem seguir os vereadores que pretendem instalar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI). A CPI, se instalada, irá apurar “as negociatas ocorridas com terrenos no distrito industrial ao longo dos anos”, conforme anunciou o vereador André Viana Madeira (Podemos), na sessão de terça-feira (11).
Também pode ser por essa a linha de investigação que o promotor Renato Ângelo Salvador Ferreira, curador do Patrimônio Público da Comarca de Itabira, deve seguir. Em 23 de outubro ele abriu um procedimento preparatório para averiguar se houve ato doloso de improbidade administrativa, danos ao erário e enriquecimento ilícito com a venda de um imóvel subsidiado.
O lucro aferido com essa venda, pouco tempo depois de sua compra, foi com certeza maior do que seria obtido por uma indústria, até mesmo de grande porte, que se instalasse no local. Mas nada disso até então foi investigado.
“Boa-fé”
A transação de revenda do imóvel ocorreu 39 dias antes da assinatura do documento em que consta a interveniência da Codemig, pela qual recebeu um percentual incidente sobre o valor oficial – e não sobre o preço final de R$ 890 mil pelo qual a negociação ocorreu.
“Esse terreno foi disponibilizado de forma subsidiada porque existia um plano de negócios. Uma empresa seria montada gerando empregos e impostos”, contou Reginaldo Calixto, ao apresentar a “grave denúncia” aos conselheiros do Codecon.
“Ao invés de implementar o plano de negócios, ficaram ‘cozinhando’ e divulgando que tinham o terreno para venda. Foi quando apareceu o interessado (a Avelândia) e eles venderam por um preço muito acima do que compraram”, afirmou o então secretário de Desenvolvimento Econômico.
De acordo com o ex-secretário, os proprietários da Avelândia disseram ter procurado a Prefeitura e a Codemig para tentar obter um terreno, mas nada conseguiram, só restando essa alternativa de compra. ““Eu acredito que quem comprou agiu de boa-fé”, disse Reginaldo Calixto, em entrevista ao jornal Folha Popular, de junho de 2013.
Na mesma edição, o jornal publicou cópias dos contratos, assim como as respectivas notas promissórias pelo valor efetivo da venda superfaturada, assinadas pelos representantes das duas empresas.
Empresários asseguram que diferença de preços foi declarada ao Imposto de Renda
Para o empresário Geraldo Lúcio de Oliveira, um dos proprietários da empresa Trend, não houve irregularidade na transação, conforme atestam os inquéritos e auditorias já arquivadas.
Sobre o contrato particular em que aparece um valor bem acima do que foi oficialmente declarado, ele também se esquiva – e assegura que é um procedimento regular.
“Está tudo explicado. Foram custos inerentes ao projeto, ao serviço de terraplenagem que fizemos e o valor venal do imóvel no Distrito Industrial. A Dular (empresa varejista de venda de eletrodomésticos) comprou em leilão um imóvel semelhante no distrito por esse mesmo valor”, afirmou.
O empresário disse ter declarado ao Imposto de Renda a diferença de preço que recebeu pelo terreno. Segundo ele explicou, o plano de negócios que tinha para o imóvel não se efetivou por haver impedimento ambiental.
“Boa parte do terreno é área de preservação ambiental, o que impediu a sua ocupação total”, disse Geraldo Lúcio, que admite ter outros dois imóveis no Distrito Industrial. Um desses terrenos está ocupado por um pequeno galpão da empresa Trend.
Para o outro, também adquirido da Codemig, ele também ainda não implantou o plano de negócio apresentado à estatal mineira de fomento à indústria. “Como não existem lotes maiores disponíveis no distrito, adquirimos fracionados.”
O empresário disse que está gerando atualmente em “torno de 50 empregos diretos” na empresa Trend, que ocupa imóvel na mesma rua Columbita. “Essa ‘lebre’ já foi levantada e nada de irregular foi constatado”, disse ele à reportagem deste site.
“Tanto que não tenho nenhum impedimento”, prosseguiu. “Estamos trabalhando muito, com possibilidade de abrir mais 100 postos de trabalho. É muito ruim ficar levantando dúvidas a nosso respeito”, lamentou.
Abatedouro
Já o empresário Walter Fonseca, da Avelândia, se defende dizendo que ao comprar o imóvel seguiu o que é de costume na cidade. “Até a polícia (civil) já investigou e concluiu que nada há de errado na transação. O rapaz (o empresário Geraldo Lúcio) adquiriu o terreno e nos vendeu. Disseram que isso é prática no mercado, é como um pagamento de luvas.”
Fonseca contou que a necessidade de transferir o abate de frangos para o Distrito Industrial foi em decorrência de um termo de ajustamento de conduta assinado com o Ministério Público.
“Não podemos continuar na avenida João Pinheiro. Até julho devemos transferir todo o abate para as novas instalações”, é o que ele promete, na expectativa de que a Superintendência de Meio Ambiente (Supram-Leste), até essa data, libere a necessária licença de operação.
Segundo ele, a empresa atualmente gera 50 empregos diretos – e abate 3 mil aves diariamente. Assim que for transferida para o Distrito Industrial, a capacidade instalada prevê até 10 mil abates diários, podendo gerar 100 empregos diretos.
“A exigência do Ministério Público foi a melhor coisa que ocorreu. Foi o que nos obrigou a buscar uma nova localização para o nosso abate, o que irá possibilitar a ampliação de nossas vendas para além do mercado de Itabira.”
O empresário confirmou que antes de realizar a compra teria ido à Prefeitura em busca de algum imóvel no Distrito Industrial. Como nada encontrou, poucos dias depois foi procurado pelo empresário da Trend oferecendo o terreno.
“Ele (Geraldo Lúcio) pediu quase R$ 1 milhão. E nos disse: ‘só vendo por isso. Se não comprar, tem outro (empresário) que compra. Acabamos fechando negócio por não ter outra alternativa”, disse Walter Fonseca à reportagem deste site.
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