Haddad defende marco da mineração em 2025 e alerta: “país não pode repetir erro do minério de ferro com minerais críticos”
Foto: Reprodução/ Ministério da Fazenda
Ministro alerta para risco de repetir modelo de exportação sem valor agregado; caso de Itabira ilustra prejuízos históricos da mineração sem agregar valor e contrapartida local
Carlos Cruz
O ministro da Fazenda, Fernando Haddad, afirmou em entrevista ao UOL, nesta quarta-feira (27), que o Brasil precisa aprovar ainda este ano um novo marco regulatório para a mineração. Segundo ele, o país está atrasado na definição de regras para a exploração de minerais estratégicos, como terras raras e lítio.
“Nós estamos com o marco regulatório da mineração muito atrasado. Tem que ser [este ano]. A água subiu num nível que a gente tem que dizer o que a gente quer com as nossas riquezas”, declarou.
Haddad também alertou para o risco de repetir com os minerais críticos o modelo adotado com o minério de ferro, exportado em larga escala sem agregação de valor. “Não podemos fazer com as terras raras o que fizemos com o minério de ferro. Você vende tudo praticamente sem agregar valor”, afirmou.
A entrevista do ministro reacende o debate sobre os impactos do modelo mineral vigente nos municípios minerados, que há décadas convivem com a exploração intensiva de seus recursos naturais sem retorno proporcional em desenvolvimento local.
Modelo colonial de exploração mineral
É o caso de Itabira, um exemplo histórico contundente dessa realidade: sede das operações iniciais da Vale desde 1942, o município viu sua riqueza mineral ser extraída e exportada ao longo de mais de oito décadas, sem que isso se traduzisse em infraestrutura duradoura, diversificação econômica ou segurança fiscal.
Atualmente, o minério de ferro extraído localmente é, em maior volume, apenas concentrado na forma de pellet-feed, um produto intermediário que serve de matéria-prima para usinas de pelotização da própria Vale, localizadas fora do município, em Tubarão (ES). De lá, pellet-feed também é exportado diretamente, sem passar por processos industriais que poderiam gerar empregos e maior arrecadação tributária.
Essa lógica de exportação de matéria-prima bruta, ou com baixo grau de beneficiamento, compromete a arrecadação da Compensação Financeira pela Exploração Mineral (Cfem), calculada sobre o faturamento líquido da comercialização.
Sonegação bilionária e falhas na fiscalização
Segundo dados da Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais e do Brasil (Amig Brasil), entre 1996 e 2005, a Vale teria deixado de recolher cerca de R$ 40 milhões em Cfem sobre o pellet-feed produzido em Itabira.
O problema não é exclusivo de Itabira. Segundo relatório do Tribunal de Contas da União (TCU), cerca de 70% dos títulos minerários ativos no país não recolhem Cfem regularmente. Mesmo entre os que pagam, há subnotificações que chegam a 40,2% de diferença entre o valor declarado e o efetivamente devido.
A Amig Brasil estima que, entre 2014 e 2021, R$ 12,4 bilhões deixaram de ser arrecadados por União, estados e municípios mineradores. Pelo menos R$ 4 bilhões foram perdidos de forma definitiva por prescrição ou decadência.
A Agência Nacional de Mineração (ANM), responsável pela fiscalização do setor, enfrenta um colapso operacional. Dos 1.728 cargos previstos, 1.078 estão vagos, e a agência conta com menos de 700 servidores para fiscalizar quase 40 mil processos minerários. A defasagem salarial em relação a outras agências reguladoras chega a 46%, o que compromete a retenção de profissionais qualificados.
Crepúsculo da mineração em Itabira e a urgência de alternativas
O prefeito de Itabira, Marco Antônio Lage (PSB), que também preside a Amig Brasil, tem sido uma das vozes críticas ao modelo mineral vigente.
Segundo ele, as minas da cidade têm apenas 16 anos de vida útil restante, e cerca de 80% da economia local depende direta ou indiretamente da atividade mineral. “A mineração é finita, não permite uma segunda safra. E a experiência mostra que, após o esgotamento mineral, muitos territórios minerados ficam incompletos e esvaziados”, afirma.
Lage defende uma revisão profunda no modelo de arrecadação da Cfem, com maior transparência na cadeia produtiva e valorização dos territórios minerados. Ele propõe e espera que o novo marco regulatório da mineração incorpore mecanismos de compensação ambiental, justiça fiscal e estímulo à diversificação econômica, para que cidades como Itabira possam construir alternativas sustentáveis antes do fim da atividade mineral.
Portanto, a urgência de um novo marco regulatório da mineração não se restringe à gestão dos minerais críticos. Ela envolve, sobretudo, a correção de distorções históricas que penalizam os municípios minerados e perpetuam uma lógica extrativista colonial, marcada pela extração intensiva de recursos sem contrapartida proporcional em desenvolvimento local.
Como tem alertado o prefeito de Itabira, é imprescindível que a exploração mineral deixe um legado positivo para as futuras gerações – e que seja desde já, com projetos estruturantes e não apenas com migalhas.
Se essa realidade não for revertida desde já, Itabira corre o risco de se tornar um exemplo histórico do fracasso de um modelo que se apresenta como sustentável, mas que, na prática, não garante sequer as condições mínimas de sustentabilidade econômica, social e ambiental para as gerações futuras.
A população de Itabira é subserviente.
A mineradora Vale comete crimes terríveis e ri da cidade. Fora Vale