Há 90 anos, Itabira e a região do Matto-Dentro reivindicam os seus direitos
No Portal do Nordeste Mineiro
No Primeiro Congresso das Municipalidades do Nordeste de Minas, realizado em 23 de setembro de 1927, há 90 anos completados hoje, pela primeira vez as lideranças políticas de Itabira e região se reuniram para tratar dos temas em comum. Eles pretendiam organizar a região e buscar mudanças econômicas e sociais. E reivindicavam a diversificação da economia local e a participação do governo mineiro neste processo.
O Congresso de Itabira
As bandas Euterpe Itabirana e a Santa Cecília abriram o Primeiro Congresso das Municipalidades do Nordeste de Minas. Mais de três mil pessoas, segundo os Anais, entre autoridades, comunidades, clero, “prefeitos” da região e Gudesteu Pires, secretário das Finanças do Estado, estavam reunidas no largo do início da rua Água Santa. Era 23 de setembro de 1927.
É (uma) história itabirana.
O Brasil, como sempre, vivia mais uma crise econômica e política. O Nordeste abandonado também era praxe. E em Minas, Nordeste era tudo que estivesse acima de Belo Horizonte, privilégios só para as regiões Sul e Zona da Mata.
Itabira pelo menos tinha a perspectiva da mineração em larga escala, mantinha todas as crianças em boas escolas públicas e privadas, alguma indústria em início de carreira e uma decantada civilidade, como afirmam os anais do Congresso das Municipalidades.
Os vereadores de então decidiram realizar um encontro intermunicipal da região do Matto-Dentro, geograficamente chamado de Nordeste, na época. Não havia prefeito, o chefe do executivo era o presidente da Câmara.
O objetivo do Congresso – o primeiro entre os municípios de uma mesma região era reivindicar do governo estadual o desenvolvimento em educação, saúde, industrialização, agricultura, comunicação, estradas, e claro, o trem de ferro. E era preciso se organizar para tal, defenderam, até aqui sem sucesso.
Na Itabira de hoje, os anseios ainda são bem similares. Busca-se alternativa econômica, as novas vocações da cidade para depois da mineração, mais ainda falta muito nas outras áreas para se desenvolver. Inclusive as tais indústrias, que nada têm a ver com as empresas prestadoras de serviços à mineração, e até de transportes, instaladas no distrito industrial e que geram os mesmos pouco mais de 2 mil empregos desde a década de 1980, quando o distrito foi inaugurado.
Em 1927, os congressistas vislumbraram que a exploração da já conhecida como a maior reserva de minério de ferro do mundo teria um significado decisivo para o país, mas mesmo assim já sabiam que apenas a mineração não traria desenvolvimento sócio-econômico e autonomia nem para Itabira quanto mais para o restante da região do Matto-Dentro. E já buscavam discutir e estudar alternativas que revelassem essas outras vocações.
No papel, o repórter CDA
No Museu de Itabira há uma razoável (significativa) documentação sobre o Congresso das municipalidades. Mas carece de material fotográfico e outros documentos, inclusive os da imprensa, já que estiveram cobrindo o encontro na cidade não apenas O Jornal, do Rio, e o Minas Gerais, órgão oficial do governo de Minas Gerais, dos quais o museu tem material.
Mas outros jornais que também cobriram o congresso, como o Jornal do Brasil, A Crítica, O País, todos do Rio, e mais os mineiros como Correio Mineiro e Folha de Minas, não estão no arquivo municipal. O congresso contou com as presenças de repórteres como Rubem Braga, trabalhando em BH e Newton Paiva. E de Carlos Drummond de Andrade, no início de sua carreira jornalística.
Por que parou
O Congresso merece mais estudos. Por exemplo, seus reflexos na realidade itabirana e porquê não teve continuidade como fora previsto.
A ideia era torná-lo bienal e trabalhar juntos, para reivindicar de forma organizada. Mas ao aproximar a data do segundo congresso, o responsável por sua organização pede adiamento e o encontro nunca mais aconteceu.
Confira a seguir trechos de uma matéria publicada no jornal O Cometa de outubro de 1998, reproduzindo trechos da cobertura jornalística de Antonio Campos para O Jornal, do Rio, que veio especialmente a Itabira para cobrir o Congresso. Drummond também esteve presente, como repórter.
O Cometa publica, em outubro de 1988, trechos das reportagens publicadas em O Jornal
O Congresso de Itabira
“O poder da imprensa só é desconhecido pelos analfabetos”
A reportagem abaixo foi publicada em O jornal, do Rio de Janeiro, em 27 de setembro de 1927, assinada por José Jacques de Moraes, que o Cometa publica alguns trechos. A matéria antecipa o Congresso
Enfim a rica zona do Nordeste mineiro vai despertar do sono intenso que dormia.
Está reunido um Congresso de Municipalidades, em Itabira. Eis aí o grande ato, bastante para sagrar “benemérito da pátria” o seu realizador. Sente-se que o professor Trajano Procopio possui enormes reservas de espírito público e compreensão da realidade brasileira.
Nada como uma frente única de municípios, quando a região apresenta os mesmos problemas a resolver, as mesmas necessidades, os mesmos anseios. Isto é, exibe a mesma ‘facie’ homogênea sob o ponto de vista político-administrativo. Da discussão das teses resultará mais atenção com os fatos muitas vezes despercebidos pelos administradores míopes, ainda que do mais alto interesse nacional.
A questão do ensino, por exemplo, alguns chefes do interior não a encaram como o eixo do problema brasileiro. Acredita-se que este – a educação – seja o móvel mais poderoso da marcha do congresso, dado o entusiasmo do sr. Trajano Procopio pela difusão do ensino.
Lá vem o trem
O prolongamento da ferrovia Central do Brasil, através do ramal de Santa Bárbara, passando por Itabira, Ferros e Peçanha, ocupará a atenção do congresso, sabe-se. Aí mais uma afirmação potente do alcance da atual assembléia itabirana. Uma reivindicação de 60 anos, que poderá trazer desenvolvimento da agricultura e atrair indústrias.
Água Santa engarrafada
O aproveitamento das águas minerais radioativas de Itabira nas fontes de Água Santa constitui uma das questões mais novas. O ótimo clima de Itabira, a salubridade da região, a proximidade de Belo Horizonte, o grau de civilidade da comunidade local, estão a indicar a utilização industrial larga e inteligente.
A mídia é a mensagem
A tese que mais interessa de perto aos jornalistas é a relativa ao impulso da imprensa no Nordeste.
Apenas sua inclusão no programa do Congresso revela a alta mentalidade privilegiada do sr. Trajano Procopio. O poder da imprensa só é desconhecido pelos analfabetos. O professor Trajano deu tanta importância a essa tese que será ele próprio o seu relator.
Chamadas de reportagens do enviado especial de O Jornal/Rio, A. Campos, na edição do dia 28/10/1927
“O grande banquete oferecido ao dr. Gudesteu Pires, secretário das Finanças, aos membros do Congresso e aos representantes da imprensa”
“Uma excursão à maior jazida de minério de ferro do mundo e várias visitas a estabelecimentos, entre os quais o célebre Collegio Caraça”
Congresso das Municipalidades do Nordeste Mineiro
Tenho absoluta confiança no grandioso futuro de Itabira. A época é do ferro e o mundo voltava suas vistas para o município onde estão as maiores e mais ricas reservas de ferro. Itabira está fadada a desempenhar empolgante papel nos destinos grandiosos da pátria, pois iria dar em futuro próximo o mágico contingente de suas fabulosas reservas de minério para a solução dos problemas da siderurgia, dos transportes e da lavoura, assegurando bases estáveis para a solução dos problemas financeiro e monetário.
Mulheres se manifestam
Dr. Gudesteu foi alvo de carinhosa manifestação por parte das senhoras e senhoritas itabiranas, que lhe entregaram uma mensagem pleiteando a ligação ferroviária do Nordeste de Minas com Belo Horizonte, para ser transmitida ao presidente Antônio Carlos, tendo a senhorita Ribeiro Costa proferido eloquente discurso.
Depois aconteceu o grande baile no Grupo Escolar, prolongando as danças até alta madrugada.
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