Itabira protesta contra Bolsonaro e Vale pela ameaça de remoção de moradores nos bairros Bela Vista e Nova Vista

Carlos Cruz

Enquanto o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) volta a insistir no discurso com ameaças golpistas contra o Supremo Tribunal Federal (STF), nesta terça-feira (7), em Brasília, o bispo de Itabira, dom Marco Aurélio Gubiotti, fala em união e na defesa da vida, na abertura do 27º Dia dos Excluídos, promovido anualmente pela Conferência Nacional dos Bispos Brasileiros (CNBB).

Dirigindo-se aos agentes pastorais, seminaristas e demais católicos, e também aos ativistas de movimentos populares e partidos de esquerda, dom Gubiotti salientou que o Grito dos Excluídos é, sobretudo, uma manifestação pela paz.

Mas, segundo ele, a paz só se realiza com justiça social, com o respeito às diferenças, aos povos originários e aos direitos humanos que não estão sendo respeitados no país, com tanta gente passando fome. “O nosso grito é de luta por justiça. Não é um grito de desespero e medo, mas de muita esperança”, ressaltou o bispo diocesano.

Enquanto isso, pela manhã, ainda em Brasília, em frente ao Congresso Nacional, Bolsonaro recorre novamente ao discurso do ódio, com bravatas contra o STF e ameaças à democracia.

“Ou o chefe desse poder (o STF) enquadra o seu ministro (Alexandre de Moraes) ou esse poder pode sofrer aquilo que nós não queremos”, discursou o presidente, referindo-se ao ministro que tem enquadrado bolsonaristas por repetidas postagens anti-democráticas, inclusive com ameaças de agressores físicas aos ministros do STF.

“Não podemos aceitar mais prisões políticas no nosso Brasil”, disse ele, insuflando seus apoiadores mais radicais, que pedem medidas duras, inclusive com o fechamento do Congresso Nacional.

Dom Gubiotti, bispo de Itabira, diz que a paz só se realiza com justiça social, com respeito às diferenças, aos povos originários e aos direitos humanos. “O nosso grito é de luta por justiça, não é um grito de desespero e medo, mas de muita esperança.” (Fotos: Carlos Cruz)
Desigualdade crescente

Quase no mesmo instante em Itabira, dom Gubiotti volta a insistir no discurso de paz e justiça social. “A crise acirra a desigualdade e a situação de injustiça no país. É por isso que a gente grita com as armas da fé pela paz e não pela guerra. Precisamos do evangelho da paz para assim construir uma sociedade melhor para todos”, pregou o bispo de Itabira.

Marco Aurélio Gubiotti clamou novamente pelo fim do discurso do ódio entre os seguidores do presidente e também entre os que estão contra a sua política considerada necrófila e negacionista. O bispo espera que assim fazendo o povo brasileiro não será inoculado por esse vírus tão perigoso como o novo coronavírus, esse que é desprezado pelo presidente que negligenciou a compra de vacinas e fez pouco caso das medidas preventivas que salvam vidas.

“Cuidado com as redes sociais. Não vamos cair na tentação desse discurso (do ódio). Vamos tomar a vacina da paz, do amor e da fraternidade nesse grito de esperança de quem luta por uma sociedade mais igualitária e fraterna”, conclamou o líder maior da igreja Católica em Itabira.

“Vamos nos preparar para luta com a armadura de Deus”, assim o bispo convocou os presentes na manifestação para persistirem unidos nessa empreitada pela democracia e por justiça social.

Após a abertura do ato público ecumênico, a manifestação seguiu em passeata pelas ruas dos bairros Campestres, Bela Vista, terminando no campo de futebol do bairro Nova Vista.

Passeata no bairro Bela Vista, um dos bairros afetado pela barragem Pontal e que pode ter moradores removidos

Ameaça das barragens

Em entrevista a este site, dom Marco Aurélio Gubiotti disse que os católicos lutam pela vida por causa da fé em Jesus e pela esperança da instalação do reino de Deus aqui e agora.

Segundo ele salientou, a vida tem sido ameaçada pela pandemia no país e pelo descaso do governo federal. Salientou ainda que em Itabira há ainda uma outra ameaça a esse direito primordial, que são as barragens da mineradora Vale.

“Temos um grupo significativo de famílias ameaçadas de perder as suas casas. É também por eles que estamos gritando. Não é um grito de desespero, mas de esperança, de luta e de fé”, voltou a repetir.

Sobre as manifestações bolsonaristas em Brasília, e em outras partes do país, assim o bispo comentou: “Devemos entender que todos têm direito de manifestar, inclusive aqueles que pensam diferente de nós. O que não podemos aceitar é que seja uma manifestação contrária a um valor cidadão mais importante que é o da democracia.”

A passeata segue pelo bairro Nova Vista, vendo-se ao fundo o cordão que está para ser descaracterizado
Esgoto a céu aberto

Ainda sobre as ameaças das barragens discursou o ativista Alan Piter, do Comitê Popular dos Atingidos pela Mineração em Itabira e na Região, já com a passeata no bairro Nova Vista:

“As pessoas que aqui vivem estão há décadas vendo os diques e os cordões de contenção (de rejeitos) se aproximarem cada vez mais de suas casas. A mineradora fez com que o esgoto fosse empurrado para debaixo das ruas, levando a população a conviver com o mau-cheiro e as pragas”, disse ele, relacionando algumas das muitas mazelas que há décadas são sofridas por moradores desses bairros.

Manifestantes passam ao lado de córrego com esgoto a céu aberto: mais de 30 anos de mau-cheiro e animais peçonhentos atormentando moradores

“Eles (os moradores) agora convivem com o terror das sirenes e com a ameaça de remoção.” O Comitê Popular tem cobrado insistentemente a imediata contratação da assessoria técnica independente, conforme está previsto na Lei Estadual nº 23.291/2019, conhecida como Mar de Lama Nunca Mais.

A assessoria independente é considerada imprescindível para prestar consultoria aos moradores ameaçados de remoção para construção de um grande muro em área ocupada por parte desses bairros e que a Vale diz ser preventivo e necessário para a descaracterização de estruturas alteadas a montante na barragem do Pontal.

Rota de fuga
No meio da passeata, manifestantes encontram a rota de fuga

Ainda no bairro Nova Vista, na fronteira com a barragem do Pontal e ao lado do córrego com esgoto escorrendo a céu aberto, um artista que, a seu pedido, não teve o seu nome e nem o seu rosto revelados, apresentou um rap com versos que sintetizaram o sentimento geral predominante na manifestação em relação a ameaça que paira sobre os moradores.

“A vida nada vale, o que vale é o cifrão. O rio que era doce ficou amargo, mudou a coloração… O marketing diz que preserva o futuro. Amadurecer é aprender, ficando atento na fatura.”

“Será que temos uma multinacional imatura? Não foi acidente, foi crime premeditado… Agem como irresponsáveis que nada assumem, todo mundo é ignorante quando o dinheiro fala mais. Para quê manutenção se um dia a obra acaba?”

“Os funcionários são substituíveis, os entes queridos, não. Mais de mil casas prometidas e nenhuma está completa, não… Fora, Bolsonaro”, repetiu o rapper anônimo a palavra de ordem que os manifestantes gritaram ao longo da passeata nesse Grito dos Excluídos, no dia 7 de setembro de 2021, no bairro Nova Vista, Itabira, Minas Gerais.

Enquanto isso, manifestantes bolsonaristas repetiam no ato público em Brasília: “Destituição já de todos os ministros do STF”. E mais: “Zé Trovão nos representa”, referindo-se ao caminhoneiro foragido da Justiça justamente por atacar as instituições democráticas.

“Os funcionários são substituíveis, os entes queridos, não… Fora, Bolsonaro”, repetiu o rapper anônimo o grito repetido em toda a passeata pelos bairros Campestre, Bela Vista e Nova Vista

 

 

 

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