Feriado do Carnaval na Serra dos Alves teve bons atrativos, mas problemas estruturais ficaram evidentes

Desfile com garbo e esplendor do bloco carnavalesco Filhos de Nandy, em Serra dos Alves (Foto: Saulo Guerra)

“Descrever os piores cenários ajuda educar as pessoas, reduzindo as probabilidades de alguns desses cenários se tornarem realidade”, recomenda José Eustáquio Diniz Alves, doutor em Demografia

Texto e fotos: Eduardo Cruz*

Durante a minha estadia no povoado da Serra dos Alves, no feriado de Carnaval, vários aspectos foram observados e que têm gerado muitas apreensões, principalmente entre os moradores originários e turistas.

São assuntos que foram pautados aqui na Vila de Utopia, como a crônica falta de água, energia elétrica, ETA, ETE, e construções irregulares que por lá proliferam.

A Prefeitura de Itabira, por meio das secretarias de Meio Ambiente e Desenvolvimento Urbano, tem notificado os proprietários que se encontram irregulares com suas fossas sépticas, incluindo os moradores mais antigos, que muitas vezes utilizam fossas antigas, chamadas de fossas negras ou fossas cegas, infiltrando o esgoto no solo e com risco de contaminar o lençol freático.

Muitos estão perplexos, não sabem o que fazer, visto que a maioria não conhece o sistema de fossas mais modernas. De acordo com as exigências da Prefeitura, vejo como inviável que cada morador originário construa a sua fossa séptica, por falta de recursos financeiros e mesmo de espaço em seus terrenos, principalmente nas construções mais antigas.

Existem alguns tipos de fossas utilizadas atualmente que têm satisfatório desempenho, proporcionando um descarte correto dos resíduos no meio ambiente. Elas podem ser pré-moldadas, construídas, e quanto ao modelo, podem ser com biodigestores, Ecológica (tevalp), ou sustentável.

A fossa biodigestor, como o próprio nome diz, utiliza adição de esterco fresco a cada 30 dias e o resultado final é um bio-fertilizante que pode ser aplicado no pomar, no jardim. E, de tempo em tempo, retira-se o lodo acumulado. Nas fossas biodigestores deve ser observado o seguinte parâmetro: 500L/pessoa.

A fossa Ecológica Tevap é um tanque de evatranspiração. Utiliza pneus, pedra, brita, areia e por fim terra, onde se planta vegetais para que façam a evaporação. O equipamento possui um extravasor com o esgoto tratado escoando por um sumidouro. Mas possui custo mais elevado que as demais

Formas de instalar

A sua construção começa pela escavação no local do terreno onde a fossa deve ser instalada. O fundo do buraco precisa ser compactado, nivelado e coberto com uma camada de cinco centímetros de concreto magro.

Em seguida, uma laje de concreto armado de 7cm. É importante ressaltar que esse tipo de fossa tem o dimensionamento calculado em dois metros cúbicos por pessoa e é utilizado para tratamento dos resíduos provenientes dos vasos sanitários (resíduos cinzas).

Existe ainda a fossa sustentável e econômica que usa bombonas de 200 litros. Essa fossa pode ser utilizada para o esgotamento de resíduos provenientes do chuveiro e da cozinha, separando dos resíduos cinzas (esgoto sanitário).

Para isso, utiliza-se quatro bombonas de 200 litros, sendo que a última deve ser transformada em filtro com brita e areia, e é descartada em sumidouro. Talvez a melhor maneira de conseguir esses sistemas seria uma parceria público/privado para execução de um tratamento de esgoto no povoado.

Outra questão que o povoado precisa discutir e resolver é a questão da água. A Estação de Tratamento de Água (ETA) construída pela administração passada não funciona e só terá como funcionar se mudar a rede de energia elétrica, trocando o sistema para uma rede trifásica.

Nos dias de carnaval houve picos de energia, chuveiros que não funcionavam corretamente devido ao número de pessoas que os utilizavam no mesmo instante, geladeiras que não funcionaram adequadamente. A água fornecida através do reservatório teve também queda no suprimento.

Mas com os moradores advertidos ao chegar no povoado, e consciente dessa escassez nas torneiras, não chegou a faltar como se previa. Mas ficou evidente que o sistema de fornecimento precisa ser melhorado.

Segurança alimentar

Outra situação que chamou atenção: no pico de turistas acessando o povoado, dezenas de pessoas procuravam o que comer e não encontravam. Não há no povoado restaurantes suficientes para atender à demanda em dias em que há um número maior de turistas.

No aspecto gastronômico, existe no povoado bons lugares onde é possível degustar uma boa refeição, tira-gosto, mas são poucos diante de tamanha procura em feriados prolongados.

Destaque para Casa de Cultura, onde o visitante pode bebericar um bom chopp artesanal e deliciar-se com uma saborosa pizza, além de boa hospedagem.

Tem também a Vila dos Rosas, uma aconchegante pousada que oferece também refeições. Outro local que também serve uma boa refeição é o restaurante San José Chiquitos, localizado na pousada Portal da Serra.

Não posso deixar de mencionar a mercearia do Fumaça onde é servido aquele prato feito, além do Boteco da Vila onde se serve carnes nobres. Uma outra opção, mas já para a noite, é o bar Pedras e Raízes, onde além de bons tira-gostos, geralmente tem música ao vivo.

No local o turista também pode se hospedar na pousada do sempre receptivo Geraldo, que é também guia para as travessias tão procuradas pelos turistas e por onde não se deve aventurar sozinho, sem alguém que conheça as trilhas e os encantos dessa natureza exuberante.

Abandono de animais

Uma outra nota triste, mas que não pode faltar nesse breve relato. Existe um outro problema relatado por um morador (ele pede para não revelar o seu nome) de que turistas vêm a passeio na Serra dos Alves, trazendo consigo o seu animal de estimação.

E, não raro, deixa o seu pet para trás, abandonando-o no povoado. Isso tem acarretado transtorno aos moradores. Esses animais são recolhidos e levados a uma ONG encarregada de procurar tutores para adoção.

Mas nem sempre isso é possível, o que tem levado à proliferação de cães de ruas no povoado, além dos semi-domiciliados. A campanha de castração desenvolvida pela Prefeitura em Itabira precisa também chegar a Serra dos Alves.

Belos atrativos

Mas não é só notícia ruim que trago do povoado. Esse lugar é sacro, paradisíaco e até mesmo afrodisíaco com as suas águas cristalinas, um convite irrecusável ao mergulho.

Além disso, os moradores são respeitosos e alegres, tem um receptivo enorme. Os turistas, de um modo geral, respeitam os costumes e tradições locais, poucos são os que exacerbam com os seus barulhentos sons automotivos, mesmo com os pedidos para que isso não aconteça.

Ainda no lado positivo, entre tantos outros, destaque para o Instituto Bromélia que faz um trabalho sensacional no Parque Municipal do Alto do Rio Tanque, com suas trilhas bem demarcadas e sinalizadas.

Além, é claro, do trabalho junto à comunidade e turistas, melhorando a coleta e gestão de resíduos, a jardinagem e o zelo que todos devem ter com o povoado.

Mosaico

“Esta imensidão que é Minas Gerais me perverte, me deixa louco e insano. Mas, se achegue, se aquiete, aqui o paraíso se espelhou”, contou-me uma turista, encantada com Serra dos Alves, tanto que promete voltar muitas vezes.

Têm as cachoeiras e os cursos d’água com suas águas límpidas, convidativas ao banho. Vindo a Serra dos Alves, fotografe à vontade. Lave a sua alma, ensaboe, passe alvejante natural. E deixe a natureza fazer o resto, que o seu corpo e espírito agradecem.

Quando voltar, leve somente fotos, boas lembranças e o seu lixo consigo. O povoado conta com coleta-seletiva de resíduos, mas a logística reversa é sempre recomendável.

E nada de levar mudas de orquídeas, bromélias para casa. Deixe-as onde estão para ser contempladas por todos, mantendo-as intactas na paisagem deslumbrante.

Além disso, coletar espécies nativas é crime ambiental e não condiz com a postura de um turista consciente, que Serra dos Alves recebe de braços abertos.

*Eduardo de Alvarenga Martins Cruz é fotógrafo e técnico em Edificações, com especialização em instalação de fossas sépticas/biodigestores e recuperação de nascentes pelo Senar/MG