Família Bolsonaro pode morrer pela boca após revelações sobre a articulação internacional para livrar ex-presidente da cadeia
Mensagens reveladas pela PF mostram articulação com Trump, chantagem contra o STF, desdém aos EUA e prejuízos bilionários para Brasil e aliados
Foto: Fernando Frazão/ Agência Brasil
Conspiração digital e diplomática: o pastor mentor intelectual, o filho falastrão e o ex-presidente aloprado
Valdecir Diniz Oliveira*
A cada nova revelação da Polícia Federal, o ditado popular “o peixe morre pela boca” parece ter sido escrito sob medida para a família Bolsonaro. O que começou como uma tentativa de livrar Jair Bolsonaro da cadeia se transformou numa trama internacional desastrosa, com mentiras, chantagens e prejuízos que respingam até na Casa Branca.
Jair Bolsonaro e seu filho Eduardo foram indiciados pela PF por coação no curso do processo e tentativa de abolição do Estado Democrático de Direito. A investigação revela que, com apoio direto do pastor Silas Lima Malafaia, líder da Assembleia de Deus Vitória em Cristo (ADVEC), os dois tramaram uma ofensiva contra o Supremo Tribunal Federal (STF).
Articularam sanções internacionais e pressionaram por uma anistia ampla e irrestrita de fachada para os envolvidos na tentativa de golpe de 8 de janeiro de 2023, mas que, na prática, visava exclusivamente livrar o ex-presidente da prisão.
Malafaia orientava Bolsonaro sobre os melhores horários para publicar ataques ao STF nas redes sociais e cobrava vídeos em inglês para serem entregues diretamente a Donald Trump.
Em áudios recuperados pela PF, o pastor chama Eduardo de “babaca” e “arrombado”, acusando-o de atrapalhar a estratégia com “vaidade nacionalista” e discursos que “parecem contra o próprio pai”.
A PF também investiga se Malafaia usou recursos da igreja ou de terceiros para financiar ações de desinformação e pressão institucional. A quebra de sigilo bancário do pastor é considerada uma medida iminente, caso se confirmem indícios de movimentações financeiras suspeitas ligadas à trama golpista.
Desdém aos EUA e mentiras para Trump
Eduardo Bolsonaro permanece nos Estados Unidos, mesmo após o fim de sua licença parlamentar, sem apresentar justificativa plausível para evitar a cassação do mandato.
Entretanto, a possibilidade de perda do cargo ganhou força após o hesitante presidente da Câmara, Hugo Motta (Republicanos-PB), finalmente ter encaminhado ao Conselho de Ética, na sexta-feira (15), 20 pedidos de abertura de processos por quebra de decoro contra 11 deputados , incluindo quatro representações que pedem a cassação do parlamentar foragido nos Estados Unidos.
O já quase ex-deputado falso patriota não apenas articulou sanções contra o Brasil, como o tarifaço de 50% sobre produtos brasileiros e a aplicação da Lei Magnitsky contra Alexandre de Moraes. Ele também desdenhou do país que o abriga. Em mensagens recuperadas pela PF, Eduardo afirma: “Aqui é tudo muito melindroso, qualquer coisinha afeta. Torce para a inteligência americana não levar isso aqui ao conhecimento do Trump”.
Segundo o relatório, ele tentou ludibriar o governo Trump com narrativas falsas sobre o Brasil, apresentando o país como uma “ditadura” e Moraes como um “censor de empresas americanas”.
O New York Times e o Washington Post repercutiram o caso, destacando que Eduardo visitou a Casa Branca diversas vezes para buscar apoio político e que Trump chegou a anunciar o tarifaço como forma de pressionar o Brasil a abandonar o processo contra seu aliado.
O ministro Alexandre de Moraes, em entrevista ao Washington Post, rebateu as acusações e classificou as narrativas de Eduardo como “mentiras que envenenaram a relação diplomática”. Moraes afirmou que o Brasil está esclarecendo os fatos e que “não existe a menor possibilidade de recuar nem um milímetro” no julgamento da tentativa de golpe.
Efeito bumerangue
O tarifaço já provocou perdas bilionárias ao agronegócio brasileiro, segmento econômico tradicional apoiador da família Bolsonaro, além de quedas na bolsa e retração do PIB.
Empresários brasileiros e norte-americanos pressionam por reversão das medidas. Isso enquanto a diplomacia brasileira tenta conter os danos. Mas o estrago está feito: o Brasil virou moeda de troca numa guerra ideológica que serve apenas aos interesses pessoais de Jair Bolsonaro e de sua família.
No STF, cresce a possibilidade de revogação da prisão domiciliar do ex-presidente. Moraes avalia que há risco de fuga de Bolsonaro, que chegou a elaborar um rascunho de pedido de asilo político à Argentina, encontrado em seu celular.
A PF considera esse documento como evidência de “continuidade delitiva”, termo jurídico que indica a repetição de condutas criminosas com o mesmo objetivo, no caso, obstruir a Justiça e evitar a responsabilização penal.
Além disso, Bolsonaro teria tentado envolver militares em sua estratégia golpista, mas só obteve apoio parcial da Marinha, o que contribuiu para o fracasso da empreitada. A prisão preventiva pode ser decretada antes mesmo do julgamento marcado para iniciar em 2 de setembro.
Como se sabe, o golpe tramado por Bolsonaro ainda na presidência tentou envolver militares em sua estratégia golpista, mas não obteve o apoio necessário. A Marinha, embora tenha sinalizado disposição por meio do almirante Garnier, condicionou qualquer ação à adesão do Exército, que junto à Aeronáutica se manteve firme na defesa do Estado Democrático, frustrando a tentativa de golpe, que somente por isso não aconteceu.
A Rede Globo, que por anos manteve uma postura ambígua diante do bolsonarismo, agora desfere críticas contundentes. A blindagem midiática ruiu, e os “trapalhões” da política, sem o talento cômico de Didi, Dedé, Mussum e Zacarias, enfrentam agora o palco da Justiça com arrogância, jactância e desespero.
A trama que pretendia salvar Bolsonaro da cadeia virou um tiro no pé. E como diz o ditado, agora confirmado pelas descobertas no celular de Malafaia, o peixe, enfim, morre pela boca.
Neste caso, a boca fala, conspira, grava áudios e envia mensagens que não apenas revelam a tentativa continuada de golpe, mas também expõem, com clareza, o desprezo pelas instituições, a manipulação internacional e o fracasso de uma estratégia que, longe de blindar o ex-presidente, pode levá-lo direto ao cárcere.

*Valdecir Diniz Oliveira é cientista político, jornalista e historiador
**Com informações da mídia local e internacional