Estudantes da Unifei promovem conexões de boas ideias para um novo tempo
Embora a crise econômica persista no país, o tom foi preponderantemente otimista entre os participantes do TEDxUnifei, um encontro de universitários, professores e convidados reunidos no teatro da Fundação Carlos Drummond de Andrade, sábado (2/9), com o propósito de conectar ideias e projetos tendo a mineração, cultura e o desenvolvimento tecnológico como temas inspiradores. “Mundo mundo vasto mundo, mais vasto é meu coração”, como poetizou Carlos Drummond de Andrade.
Com intensa programação, faltou tempo para a troca de ideias após as rápidas apresentações, que não podiam passar de 18 minutos. Mas foi uma oportunidade de interação entre os estudantes universitários com pessoas e grupos artísticos itabiranos, entremeada com a poesia de Drummond com a Cia. Itabirana de Teatro, os Drummonzinhos, os Meninos de Minas e com a música de Vinicius Barcelos.
A exceção foi o professor Renato de Aquino, ex-reitor da Unifei, que a exemplo de Tutu Caramujo, veio falar de uma guerra que Itabira está metida e que corre o risco de perder, o que seria mais uma perda incomparável assim que o fantasma da exaustão mineral virar realidade. Fora isso, o tom geral do TEDxUnifei, de clara inspiração norte-americana, foi de otimismo.
Mas o professor Aquino, como os demais participantes, vê a luz no fim do túnel – e não é um trem desembestado vindo na direção contrária. Segundo ele, pesquisas indicam que 10% da população brasileira tem mentalidade empreendedora. Se é assim, salientou, é de pressupor que no mínimo esse percentual também exista no campus universitário da Unifei em Itabira.
“Essa é a grande riqueza que pode ser transformada em empreendimentos inovadores, a nova mina do conhecimento que Itabira tem para explorar”, defendeu o ex-reitor, que só vê saída para Itabira com investimentos em incubadoras de empresas e na implantação de um parque tecnológico junto ao campus da Unifei, no Distrito Industrial Maria Casemira Andrade Lage, primeira empresária itabirana, dona da extinta fábrica de tecidos da Pedreira, no início do século passado.
Compartilhamento
Eugênio Müller, presidente da Associação Comercial, Industrial, de Serviços e Agropecuária de Itabira (Acita), após professar a sua fé nas conexões e na abertura da universidade, com o conhecimento saltando os muros acadêmicos e chegando à comunidade, ressaltou o quanto é importante investir na educação para se sair da crise que a cidade vive – e o país também.
“Em Itabira, 47% da população têm só o ensino fundamental completo ou são analfabetos”, lamentou, apontando um dos grandes desafios a ser vencido, que é a melhoria do ensino fundamental e a superação desse gargalo do conhecimento.
De acordo com ele, com a sua sabedoria poética e profética, Drummond imaginou essa situação de letargia que a cidade vive, com o fantasma da exaustão mineral batendo à porta. “Drummond não criticou a mineração. Ele criticou a inércia do itabirano”, disse ele, referindo-se às inúmeras crônicas e poesias em que o poeta cita o cruzar os braços e deixar a vida passar devagar e de como a imensa riqueza do Cauê acabou sendo o grande mal para Itabira.
“Minério é recurso e acaba. Drummond é ativo”, sustenta. E o conhecimento também é um ativo que cresce e evolui, acrescente-se. O importante, defende o empresário itabirano, é unir as conexões. “A situação é crítica, mas é desafiadora. E pode ser mudada”, afirmou, otimista, acreditando na possibilidade de o território minerador se transformar com o conhecimento, tecnologia e inovação.
Mas Eugênio Müller também advertiu: “Se for comparada com um jogo de futebol, a mineração está na prorrogação, caminhando para a disputa de pênaltis. Temos que buscar com urgência novas alternativas para o desenvolvimento sustentável”, defendeu, fazendo coro aos que, há quase um século, clamam pela diversificação econômica do município.
Extensão e comunicação
O incremento da extensão universitária é um dos caminhos ricos em possibilidades apresentado pela professora Fernanda Silva, doutora em engenharia elétrica e docente da Unifei. Com o projeto 4ª Arte, de extensão universitária no campo da cultura, ela vivenciou momentos enriquecedores com a comunidade itabirana, principalmente “com o pessoal da cultura e da arte”. “Aprendi com a extensão que é possível mudar o modo de pensar da universidade. Extensão é pesquisa e é também uma maneira de aproximar a universidade da comunidade.”
Roneijober Andrade, fotógrafo, artesão, guia turístico e aprendiz de jardineiro, contou como foi importante a mobilização da comunidade, e também o trabalho dos burrinhos que transportam cargas, para transformar uma capela abandonada no Santuário Nosso Senhor do Bonfim, no bucólico Morro Redondo, distrito de Ipoema, uma concorrida atração turística e religiosa. É de lá que o visitante avista de um mirante natural os contornos exuberante da Cordilheira do Espinhaço, a 1.250 metros de altitude.
“Há cerca de 20 anos, o lugar era a imagem do abandono”, descreveu. Aberto à visitação e destino final de peregrinação religiosa e trilha ecológica, Morro Redondo é um dos principais atrativos turísticos de Ipoema, um palco de cultura e de contemplação da natureza. “Divido essa conquista de nossa comunidade com vocês e convido todos para conhecerem Morro Redondo. Vocês verão como é possível com união transformar uma rua, uma praça, uma montanha. Vamos juntos transformar essa nossa poética Itabira”, conclamou o aprendiz de jardineiro.
Reinserção social
Já o jornalista Marco Antônio Lage, itabirano ipoemense, parodiou o poeta português Fernando Pessoa para exaltar as mais belas cachoeiras da “aldeia de tropeiros” onde nasceu. Descreveu a sua juventude em Itabira, tendo trabalhado na Farmácia de Délcio Horta, no bairro Alto Pereira, e também carregado malas no Hotel Europa, até seguir o seu caminho e virar diretor de Sustentabilidade de uma multinacional automobilística.
Hoje aposentado e profissionalmente realizado, ele disse ter agora outros propósitos na vida e no trabalho na área de sustentabilidade. Dirigente da organização não governamental Minas pela Paz, ele foi convidado pela ministra Carmem Lúcia Antunes Rocha, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), para ajudar a criar uma organização similar no país, o Brasil pela Paz. Trata-se, segundo ele, de um projeto de mudança do sistema carcerário brasileiro, com novas propostas para a reinserção do condenado na sociedade.
“Fico feliz quando vejo que Itabira finalmente acolheu a Apac (Associação de Proteção e Assistência ao Condenado) com uma metodologia nova de ressocialização do preso”, disse ele, referindo-se às instalações já quase concluídas, no Posto Agropecuário, para receber condenados de baixa periculosidade e de bom comportamento.
Superação
O agente cultural Marcos Alcântara, ex-Drummonzinho e superintendente da Fundação Cultural Carlos Drummond de Andrade contou como foi que um menino órfão de mãe muito novo, que sofria com o preconceito contra o negro e o diferente na escola, que conviveu com más e boas companhias, venceu obstáculos e hoje segue em frente, fazendo provocações.
“Até quando vamos ficar planejando e manipulando as pessoas para uma única forma de pensar e fazer aquilo que inventaram ser bom para elas? Até quando as pessoas irão acreditar que a cultura é puro entretenimento, sem saber que é mais que isso?. Até quando vamos deixar passar o nosso maior patrimônio cultural que é Drummond, sem que possamos usufruir da melhor forma possível de seu legado para o desenvolvimento de Itabira”, disse ele, que acredita nessas possibilidades como desafios para uma Itabira mais diversificada culturalmente.
Estratégia
Clecio Martins foi demitido da Vale por razões políticas, quando a empresa era ainda estatal, no governo de Fernando Collor. Hoje ele é anistiado e é funcionário da Unifei. Ele contou como foi a luta para conquistar o seu direito de voltar ao trabalho. Para isso, disse ter sido fundamental ter planejamento estratégico e agir coletivamente.
“Enquanto atuamos sozinhos não obtivemos sucesso. Foi só os anistiados unirem para as portas em Brasília se abrirem”, relembrou Martins, que vê na nas ideias inovadoras e no planejamento estratégico as grandes forças que, juntas, têm o poder de mudar a realidade.
Razão e sensibilidade
Flávia Soares, psicóloga social, também entende que não é possível pensar em sustentabilidade de uma cidade mineradora sem diversificar a sua economia. Ela disse acreditar que a cidade tem muitas possibilidades de crescimento ainda com a mineração.
“Itabira convive com a mineração urbana e essa convivência é de intimidade. Exige diálogo, cuidado e respeito mútuo”, defendeu, como possibilidades de avanços para que se abram as possibilidades e os caminhos para o futuro mais promissor.
“Conhecer Itabira foi emblemático para mim e todos que trabalham na Vale devem conhecer. Saber que trabalho e afeto andam juntos. Conhecer de fato o lugar é conhecer o seu povo, o seu ofício, a luta pela sobrevivência. Isso, eu vivenciei em Itabira.”
Paulo Alvarenga, professor da Unifei, acredita que as pessoas podem ser transformadas pelo uso da programação no seu dia a dia. Ele contou a luta que foi fazer os alunos se interessarem e entenderem uma das matérias considerada entre as mais difíceis nas engenharias, que é o ensino de Lógica I. “Apresente coisas novas para as pessoas, quem sabe elas podem mudar a realidade?”, indagou.
Voluntariado
É o que faz Amanda Teixeira, aluna da Unifei e voluntária da ong Engenheiros Sem Fronteiras, que descobriu o poder transformador do voluntariado. Ela disse ser apaixonada com a palavra empatia. “Tem um significado mais profundo do que a gente pensa, é muito mais do que eu me colocar no lugar do outro”, disse ela, acrescentando ser parte também da empatia a atenção, o carinho e o querer bem às pessoas.
“Somos nós que fazemos a nossa missão. É a soma de tudo que você já vive, senti e acredita. A minha missão no mundo é contribuir para transformar positivamente as pessoas que cruzam o meu caminho e assim ajudar a construir um mundo melhor.”
Café com arte
E assim foi o TEDxUnifei, um evento americanizado na forma, dinâmica e linguagem. Mas também brasileiro, e itabirano, em seu conteúdo e no café com poesia, servido no intervalo, para lembrar sabores de um tempo perdido. Antropofágico, no sentido de apoderamento de ideias, de comer o biscoito fino da poesia de Drummond, que junto com o minério, são as coisas boas de Itabira que seguem para o mundo.
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