Estratégias publicitárias da indústria de ultraprocessados para aumentar lucros são expostas em documentário do Idec
Fotos: Reprodução/ Idec
Alimentos ultraprocessados são relacionados ao surgimento de doenças crônicas não transmissíveis, como diabetes e problemas cardíacos, enquanto a indústria fatura mais de R$ 1 trilhão por ano no Brasil
O que se vende, o que se come é o título do documentário produzido pelo Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), lançado nesta semana. O material revela como a indústria de alimentos ultraprocessados utiliza estratégias de publicidade para lucrar a qualquer custo. Além disso, aborda os impactos do consumo desses produtos para a saúde e propõe alternativas de regulação.
O Idec é uma organização sem fins lucrativos, fundada em 1987, que atua na defesa dos direitos dos consumidores. O instituto realiza pesquisas, campanhas e ações legais em diversas áreas, incluindo saúde, alimentação e sustentabilidade.
De acordo com o documentário, histórias criadas por essas estratégias publicitárias moldam desejos, influenciam hábitos alimentares e, em casos extremos, podem colocar vidas em risco. Isso acontece porque há grandes ganhos financeiros envolvidos.
“É comum, por exemplo, que propagandas de ultraprocessados destaquem a presença de ingredientes naturais, como frutas, leite e mel. Contudo, muitas vezes esses itens sequer estão na composição dos produtos, sendo chamados de ‘ingredientes fantasmas’”, explica a coordenadora do programa de Alimentação Saudável e Sustentável do Idec, Laís Amaral.
Outra prática é a inclusão de aromatizantes, corantes e adoçantes nos ultraprocessados, tornando-os hiperpalatáveis. Isso provoca estímulos exagerados no paladar, levando ao consumo maior do que seria de um alimento natural. Na prática, esses produtos são desenvolvidos para gerar dependência.
Enquanto pesquisas da última década associam o consumo de ultraprocessados ao surgimento de doenças crônicas não transmissíveis, como diabetes e problemas cardíacos, a indústria fatura mais de R$ 1 trilhão por ano no Brasil.
Enfrentamento

Especialistas ouvidos pelo documentário destacam a necessidade de políticas públicas para enfrentar esse cenário. Desde 2022, alguns produtos exibem uma lupa na embalagem, indicando altos níveis de açúcar, gordura saturada ou sódio. Porém, isso ainda é insuficiente.
“Aqui no Brasil, há maior interferência da indústria nas políticas públicas e no Congresso Nacional do que em outros países. Esse setor faz pressão política e econômica para evitar leis como as que estão sendo aprovadas em países vizinhos”, alerta o diretor-executivo do Idec, Igor Britto.
Leis mais rigorosas, como as implementadas em países vizinhos, poderiam ser um exemplo a ser seguido. No Chile, por exemplo, alimentos com altos teores de nutrientes críticos como açúcar, sódio e gorduras devem exibir rótulos de advertência na frente das embalagens desde 2016.
O país também proíbe a publicidade voltada para crianças e a venda desses produtos em escolas. Uruguai e Argentina adotaram medidas similares, com destaque para a rotulagem frontal de alimentos não saudáveis e restrições à publicidade infantil.
A publicidade enganosa de ultraprocessados leva o consumidor a acreditar que está adquirindo algo saudável. Isso pode ser denunciado aos órgãos reguladores e contestado judicialmente.
Entretanto, não há um órgão público específico para fiscalizar a publicidade, que é autorregulada pelo Conselho Nacional de Autorregulação Publicitária (Conar), mas o que se observa é que esse conselho, formado por agências, veículos de comunicação e anunciantes, está interessado na manutenção de um sistema de fiscalização pouco eficaz.
O documentário traz também depoimentos de especialistas renomados, como Adalberto Pasqualotto, Ana Paula Bortoletto e Isabela Henriques, além de integrantes da equipe do Idec.
O material está disponível gratuitamente no site do Idec e pode ser assistido aqui: https://idec.org.br/o-que-se-come