Esperança, dor e razão no pensamento de Paulo Freire
Veladimir Romano*
Anos de sobra passando em nosso calendário e Paulo Freire continua sendo sempre atual. Estaria fazendo a bonita idade de quase um século entre nós, caso o bom filósofo, dedicado pedagogo e fenomenal humanista não tivesse nos deixado em 1997. Mas a sua monumental obra permanece para ser estudada, analisando sua visão sobre a vida, educação e, no fim, o verdadeiro amor ao próximo.
Com Paulo Freire, e isso não é novidade, aprendemos de forma cabal uma outra visão do mundo, de entender a realidade que vivemos sob o ponto de vista do oprimido e não dos poderosos. Entendendo a sua obra, e colocando em prática a sua pedagogia, melhoramos nosso estatuto de habitantes mais civilizados deste planeta.
Paulo Freire entendeu o universo dos oprimidos. No confronto dentro das relações sociais, provoca a razão, nascendo daí outros desdobramentos do pensamento, até que a esperança se transforma em práxis de libertação, leva-nos a uma nova realidade na ordem psicológica, como pelo sentido de querer mudar essa mesma realidade. Na vida comunitária se reencontram caminhos dotados de bom senso e da justiça.

É assim que a sua obra suscita a esperança, novos valores, reacende a utopia, disciplina comportamentos, programa sonhos até realizações dentro desse âmbito de evolução social, desacreditando desgraças provocadas pelo mau instituto humano.
Ter na garantia do ser o destino do homem acreditando na teoria de que é possível mudar a relação de dominação, nessa tentação destruidora onde o conflito geracional acaba por degenerar para o desentendimento.
É essa relação de atraso que ataca a mente do animal mais inteligente da pisar no planeta que se pretende modificar com a sua pedagogia.
Ao contrário de alguns pensam, Paulo Freire é mais profético do que religioso. Ainda que suas observações se misturem por caminhos de origem cristã, ele apenas se envolve dentro desse aspecto no quanto certos setores da sociedade seguirem pensamentos doutrinários como ponto de vista pontual.
A dor, razão e pensamento são formas explicitas em ampla articulação na psicose humana. O ser humano, afinal, é o ser mais pensador habitando a Terra.
Nas suas motivações igualmente entra, sem prejuízo de maior complexidade analítica, qualquer zona crítica ou mesmo antes motivações complementares voltadas para a educação. É o reflexo de certos outros no “antes o compromisso com o estatuto da moralidade cristã”.
Todos os pontos em Paulo Freire são fabricados pela sua forma engenhosa de pensar partindo dessa analítica livre e liberta de preconceitos. E qualquer princípio amarrado na espécie teológica como ponto fundamental, será apenas mais uma porta lutando pelo sentir civilizado do ser.
Sem desprimor para qualquer religião, é importante que se reconheça o seu importante papel na luta contra a ditadura, sempre ao lado do povo onde quer se vá, nesse continente latino-americano que ficou famoso cedo demais pelos piores motivos na arte da governação.
As ditaduras foram as piores das soluções encontradas. Espalharam terror, mortes, desequilíbrios sociais, atraso, agravando as situações de injustiças hoje ainda evidentes, corroendo qualquer sistema racional e progressista que se deseje desenvolver.
Nesse contexto, obrigatoriamente a visão, o apontamento e a expressão, serão sempre dentro da ordem e orientação cristã. Toda a circunstância quando no seu caminho, Paulo Freire se encontra com sua inquietude – e ele se confessa pela sua própria fé.
Essa fé é a integridade humana, a grandeza espiritual [venha ela donde vier], mas sempre promovendo inquietudes numa perspectiva solidária, uma energia transmissora de causas, capacidade anti-fatalista, que preserva a ética, fundamentando a esperança, a liberdade e a coerência.
Para Paulo Freire, “ter esperança não é o problema; o problema é reclamar de ter esperança, mas ao mesmo tempo contradizendo essa esperança na prática de ações contraditórias”. Sem prejuízo, ele nunca considerou que lugares de culto pudessem ser locais ou entidades fora do contexto humano.
Analisar Paulo Freire pelo seu legado demanda uma infinidade de tempo. É uma oportunidade exclusiva de reencontrar trilhos perdidos, em particular no lugar contemporâneo desta História que vivemos.
Vivemos instantes aflitivos, quando a irracionalidade aplicada na política não encontra soluções aos problemas mundiais. Antes disso, perigosamente enterra o pouco de bom existente, tal como o legado de mentes brilhantes que a sociedade humana por obrigação deveria dar valor, defender e, mais ainda, proteger.
No momento atual, a humanidade caminha cada vez mais para o obscurantismo, a passos largos para a distopia. Logo, é dever dos humanistas buscar recuperar a pedagogia de Paulo Freire, que nos deixou para se oferecer na outra mão a luta precisa contra o atraso de certas políticas, de certos políticos, governos, governantes e seus aliados que promovem a dor.
Paulo Freire educou a esperança. E, mais ainda, nos trouxe uma perspectiva de vida libertadora com base na razão, na esperança e no saber, que não deve ser exclusividade da elite, mas do povo que trabalha e transforma o mundo.
*Veladimir Romano é jornalista e escritor luso-caboverdiano
Passado os anos e eleito um cidadão de baixa educação a presidente do Brasil, agora ficaram querendo demonizar o Mestre e sua grandiosa obra em prol da educação da humanidade.