Espelhos de Itabira: Myriam Brandão e o Festival de Inverno

O Festival de Inverno de Itabira e a Myriam Brandão são indissociáveis na história da cultura em Itabira. Não posso afirmar que a ideia do festival tenha nascido da cabeça da Myriam, mas pouco importa.

O certo é que, sabendo do que se tratava, foi lá e fez por anos a fio o festival, uma tradição em Itabira. Aqui nesta Vila de Utopia, que reporta a cidade e recompõe as lembranças da Cidadezinha, reportamos um relato histórico de como tudo começou.

Foi publicado em jornal editado especialmente na campanha pela Cidade Educativa, título que Itabira dividiu com Itaúna, como muito mais conquistas educacionais para aquela cidade.

E por fim, mas não por último, devo dizer que diferentemente do que se apregoa, o festival de Itabira não é ininterrupto. Lastimavelmente, em 1985 não houve Festival de Inverno em Itabira.

Naquele fatídico ano, toda a grana da cultura foi canalizada para os shows breganejos realizados no parque de Exposições, no mês seguinte. Hoje, ainda é assim: boa parte da grana para cultura se investe nesse tipo de espetáculos. Dizem que dá mais votos.

Abaixo texto publicado em 1974, no ano em que o Festival de Inverno de Itabira teve inicio, contando a peleja que foi para realizar o primeiro de uma série que permanece ainda hoje, mesmo que longe de seu propósito cultural inicial.

PS.: Infelizmente não temos fotos no acervo de O Cometa do Festival de 1974. As fotos são dos festivais de 1980 em diante).

(Cristina Silveira, do Rio de Janeiro)

Festival de Inverno revela nova Itabira

Lelinho Assuero, Solange Alvarenga e Fernando Barbosa entrevistam Belchior, no Festival de Inverno de 1982. Na foto em destaque, Hermeto Pascoal, que fez três shows no festival de 1983, no teatro do recém-inaugurado Centro Cultural (Fotos: acervo de O Cometa)

1974: Um ano decisivo!

Em julho uma cidade nova estava nascendo. A arte estava ocupando lugar, tomando o lugar, e se ajeitando entre as montanhas de ferro, as ladeiras e o povo.

Até que enfim o conceito “cultura” iria ser povoado e, talvez, absorvido. Era o I Festival de Inverno e, com ele o V Festival da Canção Itabirana.

Começamos a viver dias febris, num campo desconhecido.

Como promover?

O que trazer?

O que fazer?

E outas mil interrogações surgiam a cada passo dado em busca de uma solução.

A promoção era da Prefeitura Municipal – Seção de Turismo.

Na coordenação: Myriam de Souza Brandão, que com simplicidade escolheu a programação certa, preocupando-se apenas em dar ao Povo um bom teatro, corais, boa música popular e coisas que ele aceitaria sem problemas. E não houve concessão, só foi apresentado o que era de boa qualidade.

Quinteto Violado fez show no ginásio do Valério, no Festival de Inverno de 1980

Vieram as Rodas de Samba que iam noite a dentro dando força ao Povo para criar uma programação local. Destacavam-se os grupos de seresta e, entre eles, a dos Irmãos Bragança acompanhado pelo violonista Walter Santos. Acontecia o Festival.

No salão nobre da Câmara Municipal, a exposição da tapeceira Marlene Trindade, uma das mais famosas artistas plásticas do Brasil. No mesmo local, o lançamento do livro Dr. Clorofila contra o rei Poluidor, do escritor itabirano [Santa Mariense] Marcio Sampaio.

Realizavam-se cursos volantes de artes, na cidade. Na primeira semana o curso de música popular, ministrado pelo professor Heli Ferreira Drummond, da Escola de Música. Na segunda semana, o curso de teatro, orientado pelo professor Francisco Pontes de Paula Lima.

E as noites de julho em Itabira, que costumavam ser desertas por causa do frio, transformaram-se a ponto de parecer outra cidade. O pessoal, na rua, cantando a noite inteira, mostrava ânimo para criar uma série de promoções importantes e de alto valor cultural.

Jards Macalé cantou em Itabira no festival de 1980

Teve início a I Semana Nacional de Teatro, no auditório do Colégio Nossa Senhora das Dores com a apresentação das peças: O jantar de antevéspera, de Ana Luiza Portugal Gouveia, encenado pelo grupo Teatro do Estudante Vicente de Carvalho, de Santos-SP.

Joana D’Arc entre chamas, de Paul Claudel, apresentado pelo Grupo de Teatro Augus, da Guanabara.

Nem tudo é azul no Planeta Azul, de Gabriela Rabelo, pelo Grupo Teatro da Cidade de Santo André, São Paulo.

A lição, de Ionesco, encenada pelo Grupo Vanguarda, de Brasília.

Seis personagens à procura de um autor, de Pirandelo, levado à cena pelo Grupo Divulgação, de Juiz de Fora.

Além da Semana de Teatro e dos cursos de Artes tivemos o Balé da Universidade Federal do Rio de Janeiro, orientado pela professora Helenita Sá Earp e uma colagem de textos do jornalista, escritor e poeta itabirano, Carlos Drummond de Andrade, apresentado pelo Grupo de Teatro local, orientado por Roberto Drummond.

O cantor e compositor Sérgio Ricardo também marcou presença no festival de 1980

O V Festival Itabirano da Canção, realizado no Ginásio do VEC, promoveu uma das noites mais alegres da cidade, e com isso surgiu um novo impulso para se criar uma programação ainda mais ampla para a próxima temporada, pois já temos a certeza de que existe público para tais manifestações culturais, ao contrário do que sempre se pensou na cidade.

Além do trabalho da equipe de coordenação (Walter Santos, Regina Alvim, Mariza Bragança, Luiz C. Barbosa, Myriam Brandão e Maria Cristina Trindade Neto) que não teve preconceitos e abriu a cidade para qualquer tipo de manifestações artística.

A própria fisionomia e paisagem de Itabira ajudaram muito, pois as noites frias de inverno, com as ruas cobertas de neblina, mostram ao povo da terra, uma beleza até então inteiramente por revelar.

[in. Jornal, Nós Somos Uma Cidade Educativa, Itabira, fevereiro de 1975]

 

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3 Comentários

  1. Recordar é garantir inúmeras possibilidades de futuro. Vejo fotos aqui publicadas e penso: eu também estava lá. E penso: o Sérgio Ricardo, dono de uma produtora de Cinema no Morro da Favela do Vidigal, onde definidamente mora e vive, pois bem, ele tem um roteiro prontinho sobre a obra do poeta Drummond, só falta recursos para começar as filmagens. A PMI se fosse séria poderia financiar e ter seu nome gravado na história da cultura nacional, mas afinal, corromper e ser corrompido é um negócio bão pra cachorro.

  2. Bão pra cachorro é o título deste artigo “Espelhos de Itabira” , hoje nem mesmo a imagem refletida faz bem ao olhar, já não temos mais festival da canção e nem o festival de inverno que ainda resiste em 45 edições , apresenta novidades e nem qualidade ao Itabirano.

  3. Sensacional! Vivi em Itabira ,nessa época fiz grandes amigos e tive meus três filhos itabiranos. O que havia de melhor na cultura do país, se fez presente nos festivais . Gianfrancesco Guarnieri, Nara Leão, MPB4,Edu lobo,Marilia Medalha e tantos outros . Itabira se colocou no cenário cultural do pais . Como dizia Millôr: Bons tempos,Hein?

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