Escárnio de um país obsceno numa Europa relaxada

Imagem: iStock/Getty Images

Veladimir Romano*

Depois de várias ditaduras que envenenaram o planeta durante anos, infernizando e destruindo centenas de milhares de vidas, muitas pessoas corajosas enfrentaram os abusos, limitando traumas. E lutando pela liberdade dos povos, reconquistaram a democracia.

Mas outras malignidades se voltam contra o povo e num repente o sonho vai assistindo em fartura pelo mundo, onde o deletério se apelida agora de corrupção em altas dimensões, criando vantagens a certos grupos, definindo interesses golpistas, organizando condições favoráveis, intencionadas, repartindo recursos financeiros de forma absolutamente desumana.

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Assim, chegamos aqui aproveitando duplamente da liberdade sucessiva em oferta dessa democracia, garantindo benefícios para a sociedade em falsa prosperidade; noção indivisível perdendo seus princípios e valores.

Na edição do renovado Diário de Notícias [matutino lisboeta e velha escola jornalística nos tempos do Estado Novo, fundado em 1864], com assinatura do jornalista da casa, João Pedro Henriques, apresenta nesta edição oportuna uma forte, intranquila e pontual temática sobre a corrupção que não sendo novidade, espanta pela passividade constante dos meios políticos, da incompetência das autoridades judiciais depois de aturado esforço e risco das tarefas policiais.

Ficando por entender se entre a desfaçatez, informação e as armas da justiça no combate pela transparência, não fosse bom algum cunho imanente no extrato do ser, determinando essenciais estratégias como valores desse tão repetido propósito onde os portugueses são realmente estratosféricos no que relata a criação de títulos pomposos e organizações sem nexo empatando tempo, mas jamais resolver.

As propostas dos diferentes governos, quase fazendo 50 anos democráticos [embora de alternância bicéfala], sempre ganhando fantasias maiores e criativas como foi estabelecer em tempos idos uma “Alta Autoridade Contra a Corrupção”, que nunca deu em nada.

Assim como deu em nada a criação do Provedor de Justiça, Procurador Geral da República e o Tribunal de Contas, como agora a ENA [Estratégia Nacional Anticorrupção]. Tudo imenso tempo perdido, dinheiro mal aplicado, sem poder jurídico qualquer, ou antes, propostas do popular dizer das ruas: “o faz de conta”, “é pra inglês ver”.

A completa distopia ficou bem latente nos últimos dias com a visita da nova primeira-ministra da Moldávia, quando disse que o seu país está carregado de práticas marginais. “As pessoas no meu país estão cansadas de políticos e desta gente corrupta”, afirmou Natalia Gravilita (Gravilitza), para quem os políticos de Moldávia é “gente que rouba prejudicando tudo e todos…”.

Bom, pois na lista apresentada pelo Diário de Notícias, em nada Portugal, com 30 anos no mercado da União Europeia, fica devendo em matéria de corrupção.

É assim que a pergunta mais correta deveria ser a mais natural de todas: para onde foram mais de 300 bilhões de euros [é mesmo muita grana] ao longo de três décadas…? Dinheiro de todos os contribuintes europeus.

Numa análise sobre milionários em estudo feito do Instituto das Estatísticas Europeias, referindo-se a Portugal, em tempos coloniais quando o país possuía verdadeira riqueza nas colónias, o país tinha apenas 500 milionários. Pois depois de tantos anos como membro da União, Portugal hoje tem mais de 50 mil milionários, fugindo aos paraísos fiscais quase 60 bilhões de euros/ano.

Responsáveis industriais e empresariais da nação lusitana não aceitam pelo tanto que “não podem”, como reafirmam fontes do patronato pelo que não ganham, aumentar os ordenados miseráveis [outra vergonha] de seus empregados.

Não são, portanto, com os níveis da corrupção junto ao desleixo e desprezo sobre a nação, contra quem mais sofre discriminação, que o país sofre. Há também uma total ausência de pareceres sobre direitos humanos., vendo-se o escárnio praticado por um país obsceno numa Europa que pouco vai ligando e se torna ela mesma desleixada.

Com o mais recente anúncio do Panamá Papers, descobriu-se ainda mais lixo financeiro provocado por elites desonestas e governantes assassinos da economia. Por meio das informações, com denúncias feitas pelos consórcios jornalísticos sobre as morosas investigações, e até pondo suas vidas em risco [estamos lidando com crime organizado], o mundo ficou sabendo os equivalentes das perdas, do quanto some nas traseiras da Banca, equivalentes, em um ano, 10% ao PIB europeu e 50 vezes o PIB português.

*Veladimir Romano é jornalista e escritor luso-cabo-verdiano

 

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