Empreendedores criam “bolhas urbanas” no meio rural  de Itabira, desrepeitando o Estatuto da Terra, diz promotora

Foto: Heitor Bragança

A promotora Giuliana Talamoni Fonoff, curadora do Meio Ambiente, Habitação e Urbanismo na Comarca de Itabira, compareceu nessa terça-feira (5), na Câmara Municipal, para tratar de irregularidades na ocupação de áreas rurais em Itabira, por meio do que chamou de “bolhas urbanas”, formadas com o parcelamento do módulo rural, que na região é de 2 hectares, correspondentes a 20 mil metros quadrados.

Segundo a promotora, em 2016, na revisão do Plano Diretor foram inseridas emendas irregulares para tentar legalizar essas irregularidades urbanas no meio rural, desrespeitando a legislação federal.

Esse parcelamento, segundo a representante do Ministério Público, fere o Estatuto da Terra tanto no fracionamento, que é proibido abaixo do módulo rural, como também pela sua destinação, alheia à produção rural.

É o que tem ocorrido frequentemente em Itabira, em consequência da supervalorização dos imóveis rurais, com a melhoria das estradas, encurtanto distâncias. “Muitas pessoas decidiram adquirir imóveis rurais não para atividades agrícolas, mas para veraneio ou mesmo para fixar residências”, observou a promotora.

Só que muitas vezes ficam à mercê de empreendedores imobiliários, que parcelaram a propriedade sem respeitar a legislação federal, mas amparados nas mudanças ocorridas no Plano Diretor de 2016.

Além das emendas irregulares inseridas, os vereadores naquela ocasião não seguiram, para a revisão do Plano Diretor, os preceitos do Estatuto da Cidade. É ele que rege como deve ser elaborado e revistos esse estatuto legal, que é considerado a Constituição Municipal.

Embora seja prerrogativa de o município fazer as alterações a qualquer tempo, as alterações não foram precedidas do rito formalístico e legal estabelecido para esse fim.

“Não foi respeitado o princípio da participação popular, por meio de audiência pública. E as mudanças devem ser feitas com bases técnicas, o que também não ocorreu.”

Daí que todas essas ‘bolhas urbanas’ existentes na área rural de Itabira, excetos as comunidades tradicionais, estão irregulares. “É preciso redefinir, com base na legislação, as alterações no Plano Diretor para coibir esses lotes irregulares, assim como revogar os artigos que estão em desacordo com a lei”, recomendou a promotora aos vereadores.

Urgência

A revisão é urgente, sob pena de agravar ainda mais a situação de irregularidade, prejudicando, sobretudo, os que adquirem esses imóveis ao ficarem sem a infraestrutura necessária (pavimentação, rede esgoto com tratamento de efluentes, iluminação.)

Conforme salientou a promotora, essas “bolhas urbanas” na área rural impactam também o meio ambiente. “Poluem os cursos d’água onde muitas vezes os moradores captam água para consumo”, acentua.

Pelo Estatuto da Cidade, os planos diretores municipais devem ser revistos a cada dez anos, ou a qualquer tempo, desde que devidamente programado e que haja motivo suficiente para que isso ocorra.

Para a promotora, a revogação dos artigos inseridos no Plano Diretor na revisão de 2016 é motivo suficiente para que seja antecipada a sua revisão, para deixar claro como deve ocorrer a “expansão urbana” no meio rural.

“Precisamos definir os caminhos que o município deve trilhar para fazer as alterações do perímetro urbano em áreas rurais, com base na legislação federal, e dentro dos limites da necessidade e das condições de o poder público prestar os serviços públicos cabíveis, assim como ocorre na cidade.”

Para a promotora, a prerrogativa de definir como deve ocorrer a expansão urbana no meio rural é do município, devendo ser buscado o interesse público. “Não é o empreendedor que vai definir onde abrir um loteamento na área rural, como tem ocorrido em Itabira, infelizmente.”

Função social

Ainda de acordo com a promotora, na revisão da matéria não se pode esquecer da definição da função social da terra, estabelecida no artigo 186 da Constituição Federal.

“De forma resumida, entendemos que a função social é cumprida quando toda legislação é observada em relação à propriedade. Havendo alguma irregularidade ou não cumprimento da legislação, a propriedade não está cumprindo a sua função social”, acentuou a promotora.

“O imóvel rural deve permitir o acesso à terra, conforme está no Estatuto da Terra, assegurando a sobrevivência das pessoas que labutam no meio rural com as suas famílias”, voltou a frisar a representante do Ministério Público.

Para revogar as emendas parlamentares inseridas na revisão do Plano Diretor, em 2016, que “legalizou” o fracionamento do módulo rural, o Ministério Público propôs ao executivo municipal um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC). “O executivo se comprometeu a não realizar melhorias nessas localidades sem que se tenha por base a legislação.”

Já aos vereadores compete, seguindo o que prescreve o Estatuto da Cidade, convocarem nova revisão do Plano Diretor, dessa vez seguindo o princípio da publicidade, com realização de audiência pública para assegurar a participação, e tendo por base princípios técnicos.

“Podemos promover reuniões menores para tratar com mais detalhes da revogação dessas emendas no Plano Diretor”, propôs a promotora aos vereadores.

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1 Comentário

  1. As pessoas estão procurando morar fora da poeira e do barulho excessivos da mineração.
    E a água, a Promotoria de Justiça de Itabira já providenciou a cobrança da mineradora em resolver a captação da água a atender os moradores da cidade?
    Só discurso não resolve!

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