Com a guerra, população russa já sofre com inflação e aumento do desemprego
Foto: Reprodução/R7
Daniel Cruz*
A guerra está na pauta do dia e é importante entender o que ocorre. Vejo na mídia ocidental muitos ataques aos russos. O mundo inteiro soltou a “bomba atômica” da economia e cortou relações com o país.
Os atos de Putin e seu exército são horríveis, violam tudo que prezamos de humanidade e merecem ser punidos por tamanha violência.
Porém, o jeito que o mundo adotou para pressionar Putin vai causar miséria, fome, desemprego e caos aos civis russos.
Minha namorada tem uma colega russa. Desde que eu resolvi aprender o idioma russo para ler Dostoïevski e Tolstói no original, ela se tornou minha amiga. Conversamos bastante há três anos.
Venho perguntando bastante a ela sobre a guerra. Não direi o nome ou cidade onde ela vive para proteção dela.
Por meio de seus relatos vejo os estragos que Putin e a economia mundial estão causando com o conflito.
Cinco amigos dela já morreram em combate, ela e mais três mil pessoas foram demitidas da empresa multinacional em que trabalhavam.
Começa a faltar comida e utensílios básicos. Só o pão está seis vezes mais caro. Sistemas de pagamento eletrônico não funcionam, como cartão de crédito. Assim, para usar ônibus, metrô e se locomover é preciso voltar ao passado e requisitar um cartão de transporte do governo.
A polícia está parando e revistando as pessoas e seus celulares em busca de aplicativos proibidos ou uso de termos proibidos. “Guerra” é um desses termos, Instagram um desses aplicativos.
As fronteiras estão fechadas e ninguém pode sair. Todos os homens estão sendo chamados para servir, mesmo os que já foram dispensados.
Para se comunicar com o ocidente, só é possível de forma ilegal via VPN.
As contas bancárias estão bloqueadas e é impossível sacar dinheiro. Então, se paga com trocas de produtos, é o escambo de volta.
Muitos estão passando fome.
A população só tem acesso à notícia que o governo mostra, censura total.
Essa minha amiga, estava particularmente triste hoje. Uma das coisas que ela disse é que “agora todos pensam que somos o diabo, não somos nosso governante”.
Nós também não somos nosso governante, me identifiquei com essa frase.
A Rússia não é Putin. A Rússia é a população russa, que é resiliente a czares tiranos, governos fechados e sobrevive ao frio inverno se mantendo quentes por dentro.
Pegam todo o sofrimento e fazem virar arte, música, literatura, cinema, balé… A Rússia é Dostoïevski, Tolstói, Tchekhov, Gogol, Eisenstein, Gargarin, Tchaikovsky, e tantos outros.
Espero que a guerra acabe logo. Toda tempestade acaba. Uma hora o sol voltará a nascer. E assim, espero que a paz volte à região.
*Daniel Cruz Fonseca é advogado, mestre em Direito nas relações econômicas e sociais, e poeta, autor dos livros “Nuvens Reais” e “Alma Riscada”.