Com 25 anos de atraso, Vale dá início às obras de captação de água do Rio Tanque como resgate de parte da dívida histórica com Itabira

Trecho do rio Tanque: reposição de mata ciliar é urgente

Foto: Mariana Almeida

Carlos Cruz

Com um atraso que ultrapassa um quarto de século, a mineradora Vale finalmente inicia a construção de um novo sistema de abastecimento hídrico em Itabira, incluindo adução e tratamento por meio da transposição de água do rio Tanque.

Nesta quinta-feira (20), foi lançada a “pedra fundamental”, simbolizando o início das obras do projeto Rio Tanque. O novo sistema prevê a captação de 600 litros por segundo (l/s), em trecho do rio a 25 quilômetros da futura Estação de Tratamento de Água (ETA), a ser edificada na região do Alto do Pinheiro, no bairro Campestre.

O investimento, inteiramente financiado pela Vale, está estimado em aproximadamente R$ 1,17 bilhão. Esse projeto finalmente concretiza o cumprimento das condicionantes da água descritas na Licença de Operação Corretiva (LOC), concedida à mineradora em 18 de maio de 2000 pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad).

O avanço que agora inicia se deve a um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) firmado em agosto de 2020, por iniciativa da promotora Giuliana Talamoni Fonoff, da Curadoria de Meio Ambiente na Comarca de Itabira.

Pelo compromisso assinado, a Vale se viu obrigada a resolver “de forma definitiva” a grave e histórica crise hídrica que assola a cidade desde o início da mineração em larga escala nos picos do Cauê, Serra do Esmeril e mina Conceição.

O TAC também atende aos princípios da Política Nacional de Recursos Hídricos, que, conforme a Lei Federal nº 9.433/1997, prioriza o consumo humano e a dessedentação de animais antes da água ser destinada à indústria e agricultura.

Legado aterrado

O projeto Rio Tanque também surge como uma compensação pela impossibilidade de cumprir a promessa de “legado” hídrico, feita pela Vale em seu house-organ Vale Notícias.

No início deste século, a mineradora havia divulgado que, após a exaustão das Minas do Meio, os aquíferos serviriam para abastecer a cidade e ainda sobraria água para atrair novos investimentos, diversificando a economia local.

Entretanto, a proibição de disposição de rejeitos em barragens alterou essa expectativa. Isso porque, o órgão ambiental estadual aprovou a disposição de rejeitos, proibidos de seguir para as barragens, nas cavas exauridas das Minas do Meio.

Com isso, inviabilizou o legado da água de classe especial que estaria disponível para abastecer a cidade e atrair novos investimentos, sem que fosse preciso captar água do rio Tanque.

Com isso, além de manter a crise hídrica na cidade, comprometeu-se também o desenvolvimento com a diversificação econômica, atrasando em pelo menos 25 anos a possibilidade de atrair indústrias que demandam grande volume hídrico para se instalarem no município.

Diante desse cenário, o projeto Rio Tanque surge como uma compensação e reparação histórica. Embora atrasado, o investimento representa um marco para superar as dificuldades hídricas da cidade, abrindo-se um novo horizonte para o desenvolvimento sustentável no município minerado, que vê a sua principal atividade econômica, a extração e beneficiamento de minério de ferro, chegar lenta e gradualmente ao fim.

Projeto amplia capacidade de abastecimento e supera propostas anteriores
Canteiro central do Projeto Rio Tanque está pronto para início das obras (Foto: Mariana Almeida)

A captação de 600 l/s representa 400 l/s a mais do que constava de uma parceria público-privada, proposta pelo governo Ronaldo Magalhães (2017-20) e aprovada pela Câmara em março de 2019. 

Essa PPP previa que o custo da transposição e o impacto energético seriam repassados aos consumidores, com aumentos tarifários entre 25% e 30%, conforme anunciado em audiência pública realizada em 2018.

Na época, o prefeito Ronaldo Magalhães (PTB), a maioria dos vereadores e entidades locais, como o Grupo da Água e a Associação Comercial de Itabira (Acita), consideraram que a dívida da Vale, no que tangia as condicionantes da água, já havia sido sanada. Com isso, aceitavam que a municipalidade arcasse com os custos da transposição por meio de reajustes tarifários.

Tubos para a construção da adutora de 25 km até a nova ETA, no Alto do Pinheiro, no bairro Campestre (Foto: Divulgação Vale)

Condicionantes não cumpridas

No entanto, reportagens deste site Vila de Utopia, demonstraram que tais condicionantes, bem como outras da LOC, não haviam sido integralmente cumpridas.

Essa evidência reforçou a necessidade de ações mais robustas, fazendo cumprir o que consta da LOC 2000, com a implementação do projeto Rio Tanque como uma “solução definitiva” para a crise hídrica.

Com o término das obras, a gestão do sistema hídrico ficará sob responsabilidade do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae).

Pelo que consta do TAC, a Vale também terá direito ao uso parcial dessa água em suas operações, mediante o compromisso de arcar com os custos de energia para a captação e adução.

 

 

 

 

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