Chuvas voltam a preocupar moradores de Santa Maria com risco de transbordamento do rio Jirau

Foto: Ascom/PMSMI

Por Carlos Cruz

As chuvas intensas dos últimos dias têm provocado tragédias e transtornos a moradores em diversas cidades de Minas Gerais, principalmente aos que residem próximos a cursos d´água, áreas de encostas suscetíveis a deslizamentos, como é o caso de Santa Maria de Itabira, incrustada em um vale cortado pelo rio Jirau, que nasce em Itabira.

Segundo a assessoria de imprensa da Prefeitura do município, a preocupação maior é com o represamento no centro da cidade da água desse pequeno rio que se torna caudaloso neste período chuvoso. Isso ocorre com a elevação também do nível do rio Tanque, que recebe as águas desse afluente na parte final do perímetro urbano.

Com o nível dos dois rios elevados, com as chuvas intensas nos próximos dias, o transbordo é iminente, alerta a Prefeitura. É quando a história se repete com a água do rio invadindo ruas, residências e comércio, com maior impacto nos bairros Conselho e Barra.

Chuvas em Santa Maria

Fonte: Clima Tempo

Agravos

Embora essa situação seja decorrente das fortes e persistentes chuvas, o risco do transbordamento não deve ser atribuído apenas à natureza.

Afinal, trata-se de uma situação recorrente, que somente deixará de existir, ou pelo menos será amenizado, com medidas preventivas e protetivas que já foram apontadas e reconhecidas pelas autoridades municipais, mas ainda sem solução.

Além do recorrente assoreamento, por areia e material carreado de loteamentos abertos recentemente sem os cuidados devidos, e de areais que ficam à montante, sem as medidas cabíveis de contenção, o rio sofre também com o esgoto da cidade, e com o lixo e entulhos lançados por incautos moradores em seu leito.

Há ainda o refluxo das águas no encontro com o rio Tanque, que ocorre perpendicularmente. Com isso, a força do rio maior faz com que a água do Jirau retorne para a cidade, atingindo primeiramente os bairros mais próximos, abertos e povoados sem que os empreendedores e autoridades locais atentassem para esse problema, restringindo essa ocupação.

Desvio

Solução já apresentada, e reconhecida pela prefeitura, é atenuar o encontro dos dois rios (Imagem: Google)

A solução já apontada em projetos sempre procrastinados, seria executar um desvio à direita do curso do rio Jirau, antes de se encontrar com o rio Tanque. Dessa forma, a sua água poderia ser absorvida sem provocar o represamento e o refluxo que recorrentemente inunda o perímetro urbano de Santa Maria.

Com o desvio, diz um hidrogeólogo ouvido pela reportagem, após a tragédia hídrica que atingiu os moradores na madrugada de um domingo, em 21 de fevereiro de 2021, o rio maior pode funcionar como ‘puxador’ da água que desce do Jirau.

A dificuldade para essa intervenção necessária é que no local indicado para o desvio se encontra um dos bairros mais afetados quando ocorre o represamento.

Ainda segundo o hidrogeólogo, essa solução se enquadra na teoria de Daniel Bernoulli (1700/82), matemático suíço, para quem “um aumento na velocidade do fluído ocorre simultaneamente com uma diminuição na pressão ou uma diminuição na energia potencial desse mesmo fluído.”

O rio Tanque, maior, represa o rio Jirau, e o rio de transbordar é iminente com as chuvas persistentes (Foto: Ascom/PMSMI)

Ou seja, é preciso eliminar, de alguma forma, a força desse “tampão” que faz a água do rio menor retroceder para a cidade, provocando um turbilhonamento muito grande de uma força hidráulica querendo descer e de uma outra onda querendo voltar, por força do transbordamento do rio Tanque.

Recursos para executar esse desvio, e a drenagem do rio Jirau, devem ser buscados onde estiverem, inclusive junto ao governo de Minas Gerais que recebeu vultosa indenização da Vale pela tragédia de Brumadinho.

E, também, pode virar realidade por meio de recursos da própria Vale, causadora de grandes impactos de vizinhança em Santa Maria – e que ainda persistem com a barragem de Santana, que, mesmo reforçada, continua assustando os santa-marienses.

Barragem de Santana e diques de contenção

Barragem de Santana foi reforçada e ajuda controlar a vazão do rio Jirau, mas mesmo assim assusta pelo volume de água acumulado (Foto: Carlos Cruz)

A barragem, segundo a mineradora, teve o nível de emergência encerrado em outubro do ano passado, após a execução de obras de reforço de seu barramento. Com isso, obteve Declaração de Condição de Estabilidade (DCE) positiva.

A estrutura tem a função de conter sedimentos e armazenar água – e foi construída pelo método a jusante, considerado tecnicamente mais seguro. Contém cerca de 14 milhões de metros cúbicos (m³) de sedimentos e água. Funciona também como meio de controle de vazão da água do rio Jirau no período chuvoso.

Mas para dar mais garantia aos moradores, que se encontram no que chamam de Zona de Segurança Secundária (ZSS), o que em tese daria tempo para chegar ajuda, sabe-se lá como, em caso de ruptura dessa estrutura, o hidrogeólogo recomenda adicionalmente a construção de pequenas barragens ou mesmo diques de contenção da água das enchentes, posicionados abaixo de Santana, até bem próximo da cidade de Santa Maria.

“Pode parecer um paradoxo, mas a construção de pequenas barragens, a exemplo de muitas já existentes na Europa, e no Chile, para conter a água do degelo nos Alpes e nos Andes, respectivamente, podem ser uma das medidas de proteção aos moradores de Santa Maria”, sugere.

Segundo ele, o custo dessas estruturas, com vertedouros na parte inferior para que a água do rio siga o seu curso normalmente na seca, deve ser cobrado da Vale.

Isso até mesmo como medida preventiva por parte da mineradora – e para dar mais segurança aos moradores do núcleo urbano e em boa parte da zona rural, em caso de ruptura da barragem de Santana, antes de o fluxo caudaloso chegar à cidade.

Além do acréscimo desse nível de segurança, que deve ser sempre buscado, a Vale tem também dívida histórica com Santa Maria de Itabira.

“Como dizia o professor Ângelo Machado (1934/2020), no passado a Vale indenizou os bois dos fazendeiros, que embucharam com o ‘fino’ do minério, mas não quitou a dívida ambiental com o rio Tanque”, afirma e relembra o hidrogeólogo.

Para saber mais, leia aqui:

O que fazer para que tragédias com enchentes em Santa Maria de Itabira não se repitam

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