Carlos de Itabira

Carlos de Itabira, assim muitos críticos literários e jornalistas se referem ao poeta

A ideia de criar o jornal O Cometa Itabirano germinou nas células cinzentas do escritor Lúcio Sampaio. Uma ideia de resistência. A ideia não seria pulverizada. As palavras barulharam mais forte/comovente do que o trem que leva Minas.

Criar um jornal para celebrar Carlos Drummond de Andrade em Itabira resultou em obra de valor permanente para Itabira. Repercutiu além das calçadas despidas de ferro de Itabira.

Cortou o céu de mundos. Se quer pesquisar Itabira, busca na obra de Carlos Drummond e busca na coleção do jornal O Cometa Itabirano, são indissociáveis na pesquisa.

Por influência direta d’O Cometa Itabirano, a Prefeitura construiu o Centro Cultural, o Memorial Drummond/Niemeyer e, o que de verdade torna a cultura valor permanente: formou uma geração que conhece o poeta Drummond, iluminou outras ideias…

Ainda o Lúcio Sampaio. É preciso atenção para o fato de o Lúcio ter mantido entre 1979-84 troca epistolar com o poeta. Ele é o itabirano que mais cartas escreveu ao poeta, são 11 no total.

No corpo delas, o poeta fez anotações e colagens de recorte de jornal. Essas cartas estão no arquivo da Casa de Rui/Rio. E bem que podia compor um livro epistolar de grande valor literário.

Até o seu último suspiro, O Cometa Itabirano (mais de 300 edições) comemorou infalível o dia 31 de outubro, data especial de Carlos Drummond.

A Vila de Utopia mantém o proposito, o dever civil de resiliência na parada “drummond” em Itabira. Neste ano a celebração é 118 anos. Comemoramos sob a tensão da pandemia e horror do pandemônio. A festa é salva no modo tranca-rua sanitário e com recursos digitais.

Nesta e nas próximas postagens, a Vila de Utopia compartilha com seus leitores trechos escolhidos de Maria Julieta entrevista Carlos Drummond de Andrade – gravação disponível no sítio do Instituto Moreira Sales/Rio. A entrevista foi gravada no verão carioca de 22 de janeiro de 1984.

Uma repórter brilhante, intelectual ética e sofisticada e talvez de certa timidez chinesa de reverencia ao homem velho, ao poeta do mundo vasto mundo, ao menino antigo…

Ou como a empatia da adolescente, aluna do Colégio Pedro II, diante da foto do poeta sentado no chão da sala de sua casa: “sabe um vovô muito legal? Aquele vovô carismático? é ele, até bem sério nas fotos e tal, mas eu acho interessante assim”.

Salvo o trecho final da transcrição, a voz da repórter está oculta e a voz andradíssima do mato-dentro falou: disponível e confortável.

Perguntas, repostas e subjacente a interlocução intelectual com a intimidade de ‘gente de casa’, eles se ouvem sem falar, intercambiam sabendo disso.  Uma entrevista boa de ouvir várias vezes para aprender, apreender e louvar Carlos Drummond de Andrade. (Cristina Silveira)

Natureza

Eu me comovo diante de uma folha de árvore, planta, me comovo diante de um pardal…

Eu sou muito amigo da natureza. Sou muito amante da natureza. A natureza é o meu Deus, isso é uma coisa muita antiga, é o chamado panteísmo, eu não cultivo nenhuma teoria, nenhuma doutrina panteísta, apenas sinto um interesse profundo pelo ser vivo em suas formas as mais variadas, animais, vegetais, minerais. Adoro animais.

Houve um paradoxo na minha formação, eu sou filho de fazendeiro, neto de fazendeiro e bisneto de fazendeiro…. a fazenda era um exílio, se eu encontrava na fazenda um jornal velho, uma revista velha eu ia para cima de um pé de jabuticabas e ficava lá esquecido da vida, eu ficava lá, lendo enganchado numa árvore.

Amor

Eu escrevo muito sobre o amor, mas escrever sobre o amor não é amar.

Eu não acredito no amor como uma espécie de fatalidade biológica pelo qual as pessoas se juram amor e se entreguem uma a outra irremediavelmente até o infinito. Eu acredito no sentimento amoroso e nem podia negá-lo porque há evidências, a existência humana está cheia deles. Acredito no sentimento amoroso que vai de uma criatura a outra e que vai além dessa criatura, envolvendo, digamos, a natureza, o universo…

O amor de uma criatura por outra, ele é limitado, a verdade é que, a vida é limitada. Há um momento em que as pessoas envelhecem e morrem ou morrem antes. O amor fica condicionado as limitações da natureza humana, portanto ele é frágil.

Há também o seguinte, as mudanças de natureza íntima que nós temos. Os nossos interesses evoluem, nós passamos por diversas estações, não são quatro estações dentro de nós, são inúmeras estações nem sequer são sucessivas, elas as vezes são imbricadas umas às outras, elas se confundem. Então nós não sabemos hoje o que nós sentiremos amanhã.

Essa precariedade na falta de continuidade do sentimento humano é o maior entrave ao amor, o amor que é para nós esplendoroso, magnificente é cheio de luz, amanhã ele significa escuro, fica turvo. De qualquer maneira é um sentimento irregular, a gente não tem o domínio sobre ele, ele talvez é que tem o domínio sobre nós. O importante é dizer, eu acredito no amor. Eu procuro amar, mas devo confessar, acho que não sei amar como eu gostaria de saber.

 No destaque, o fazendeiro do ar em escultura de Genin em frente ao Centro Cultural (Foto: acervo MCS)

 

Posts Similares

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *