Alguém quer, realmente, ser brasileiro?
Por Montserrat Martins*
EcoDebate – Estamos há poucos meses das eleições que vão influir nos próximos 4 anos de vida dos brasileiros, mas quem são afinal esses brasileiros que vão definir os seus rumos nas urnas?
Aqui no Sul temos muitos descendentes europeus que, mesmo sendo de famílias de imigrantes já antigos (há mais de três ou quatro gerações), se “sentem” como se fossem italianos, ou alemães, ou poloneses, a terra dos seus antepassados, enfim.
Há pessoas sem descendência estrangeira conhecida, mas que se identificam com outros países, que idolatram, denotando que gostariam de ser de lá. A atual “família presidencial” brasileira, por exemplo, já exibiu bandeiras norte-americanas várias vezes, o presidente tentou enviar um dos filhos como diplomata para lá, oficialmente, inclusive. Eles não são exceção.
Falando francamente, muitas famílias brasileiras queriam ser americanas – e as da elite, que podem fazer compras em Miami, acham que são. Ou canadenses, ou australianos, para onde vão cada vez mais jovens daqui, em busca de um lugar ao sol lá.
Na oposição ao atual governo, por sua vez, há muitos que não simpatizam com ideias nacionalistas e que dizem se sentir “latino-americanos”, identificados com uma resistência simbólica ao domínio econômico dos Estados Unidos.
Os povos originários, os índios, tem sua própria concepção de nação, que são as nações indígenas, que não coincidem com os territórios geográficos nacionais.
O livro Macunaíma, por exemplo, foi inspirado em relatos de um antropólogo alemão que pesquisava a cultura de tribos indígenas na região entre Roraima e a Venezuela, não havendo para os índios de lá, naturalmente, nenhuma distinção entre um país e outro, pois eles são da sua própria nação indígena.
Os afrodescendentes tem presente a história de seus ancestrais terem sido trazidos à força, pela violência dos nossos colonizadores portugueses, hoje resgatam suas raízes africanas e sua história em território brasileiro é marcada pelos sofrimentos impostos, por vivências de segregação.
Aqui no Sul já surgiu uma proposta divisionista, inclusive, de que “o Sul é o meu país”, que não vingou, mas corresponde ao sentimento de muitos. O Nordeste é uma das regiões que o povo valoriza a cultura local, mas se dizem “nordestinos”, não brasileiros.
Ninguém, realmente, quer ser brasileiro, então? O “complexo de vira latas” é a mais forte de todas as características psicológicas do brasileiro. Nada é mais brasileiro portanto, que não querer ser brasileiro.
*Montserrat Martins, Médico Psiquiatra, autor de Em busca da Alma do Brasil