A Vale, que não é boba, quer investir mais em ferrovia. E o Brasil?

O movimento de protesto dos caminhoneiros autônomos e o locaute das empresas de transportes não chegou afetar a produção da Vale no país, segundo declarou o seu presidente Fabio Schvartsman, ao participar do Fórum de Investimentos Brasil 2018, que está sendo realizado em São Paulo (SP) desde ontem (29) e que será encerrado hoje. No entanto, disse ele, caso o movimento persista, o impacto com certeza será inevitável.

Fábio Schwartzman, presidente da Vale (Foto: Alex Silva/Estadão)

Em resposta a este site, a assessoria de imprensa da mineradora não informou como o movimento afetou, ou pode afetar, a produção no país e nas minas de Itabira. Mas assegurou que a empresa continua monitorando a situação – e que pretende tomar as providências necessárias para evitar possíveis impactos decorrentes do movimento.

Para diminuir impactos de futuros movimentos como esse, e da própria dependência ao transporte rodoviário, Schvartsman disse que a mineradora trabalha para renovar as concessões ferroviárias, como a que divide com a VLI Logística. “Queremos aumentar a nossa malha desse tipo de modal”, acrescentou, em palestra no mesmo fórum de debates.

Ferrovias da Vale transportam quase que só minério de ferro: diversificação é necessidade urgente para o país (Divulgação)

Assim como faz a Vale, o país também precisa investir urgentemente para diminuir a dependência ao transporte rodoviário, responsável por 65% do transporte de cargas inter-regional no Brasil, segundo dados de 2015 do Plano Nacional de Logística.

Historicamente, a dependência ao transporte rodoviário se agravou desde que o ex-presidente Juscelino Kubitschek (1902/76), que governou o país entre 1956 e 1961, optou pelo transporte rodoviário em detrimento do ferroviário com o seu projeto desenvolvimentista 50 anos em cinco. Foi quando o país investiu prioritariamente na construção de rodovias, como incentivo para atrair as primeiras montadoras de automóveis e caminhões, com polpudos subsídios federais.

Países de grande dimensão, como os Estados Unidos, transportam mais de 43% do que produzem por ferrovias. Na Rússia, o índice ultrapassa 80%, enquanto no Brasil continental, de acordo com a ANTT, não chega a 25%. Antes da privatização da malha ferroviária federal esse índice não passava de 17%.

Revisão das concessões

Ilustração: Vasilchuch/Stock)

Com o programa de privatização do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (1995-2003), esperava-se por um maior volume de investimentos para ampliar a malha ferroviária brasileira.

Entretanto, desde então, segundo o Ministério Público Federal (MPF), o país perdeu R$ 40 bilhões com o descaso de concessionárias de ferrovias em trechos não lucrativos e também com o abandono de vários trechos da malha ferroviária.

Com o pedido do MPF, o Tribunal de Contas da União (TCU) investiga a dilapidação desse patrimônio nacional pelas operadoras ferroviárias, que teriam abandonado 16 mil quilômetros de ferrovias. O governo federal também está sendo investigado por não regular as concessões e por deixar de fiscalizar as empresas concessionárias.

Ferrovia abandonada

Em consequência, a ANTT registra a existência de 2/3 de ferrovias subutilizadas em todo o país, que equivalem em torno de 5,5 mil quilômetros de malha ferroviária subutilizadas ou sem tráfego de cargas.

A ANTT promete cobrar das empresas concessionárias pelo abandono das ferrovias, obrigando-as a devolver trechos ociosos ou abandonados. E diz que irá obrigá-las, caso não tenham interesse por determinado ramal, a recuperar esses trechos para o tráfego de clientes e uso de terceiros.

Monopólio

Por outro lado, as empresas concessionárias devem recorrer na Justiça contra essa nova possível regulamentação. Elas querem impedir a utilização da parca malha ferroviária existente por novas companhias, mantendo o monopólio, ou o transporte exclusivo de uma só commodity, como é o caso do minério de ferro pelas ferrovias da Vale.

Vagão com minério de ferro (Foto: Eduardo Cruz)

Congregadas na Associação Nacional dos Transportes Ferroviários, essas empresas detém concessões para operar 29 mil quilômetros da malha ferroviária brasileira. Porém, após a privatização de FHC, apenas 10 mil quilômetros estão sendo utilizados.

Para a Vale, que não é boba e otimiza os seus processos, a renovação de concessões ferroviárias, que divide com outras empresas, é imprescindível. Isso para que possa otimizar a sua logística, reduzindo ainda mais a dependência ao transporte rodoviário, do qual o país se viu refém com as manifestações em curso – e que ainda paira nas rodovias com suas nuvens sombrias.

Investimentos

Assim como faz a Vale, o país também precisa investir com urgência na ampliação da malha ferroviária, como forma de baratear custos, reduzindo a dependência ao transporte rodoviário, que é mais lento e é mais caro.

Isso sem falar que boa parte do PIB brasileiro transita por rodovias em precárias condições, provocando atrasos e até interrupções no fornecimento de matérias-primas e demais mercadorias para os mercados interno e externo.

A lamentar ainda a perda de vidas humanas provocada por intenso tráfego de caminhões pesados e veículos leves. A ferrovia, além de ser mais eficaz e barata, é considerada o meio de transporte mais seguro que existe.

 

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2 Comentários

  1. A melhor resposta a esse “dono” da Vale para o mau uso das ferrovias, principalmente da Vitória a Minas, que só levam e nunca trazem:

    Vampiros
    José Afonso

    No céu cinzento sob o astro mudo
    Batendo as asas pela noite calada
    Vêm em bandos com pés de veludo
    Chupar o sangue fresco da manada

    Se alguém se engana com seu ar sisudo
    E lhes franqueia as portas à chegada
    Eles comem tudo eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada [bis]

    A toda a parte chegam os vampiros
    Poisam nos prédios poisam nas calçadas
    Trazem no ventre despojos antigos
    Mas nada os prende às vidas acabadas

    São os mordomos do universo todo
    Senhores à força mandadores sem lei
    Enchem as tulhas bebem vinho novo
    Dançam a ronda no pinhal do rei

    Eles comem tudo eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada

    No chão do medo tombam os vencidos
    Ouvem-se os gritos na noite abafada
    Jazem nos fossos vítimas dum credo
    E não se esgota o sangue da manada

    Se alguém se engana com seu ar sisudo
    E lhes franqueia as portas à chegada
    Eles comem tudo eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada

    Eles comem tudo eles comem tudo
    Eles comem tudo e não deixam nada

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