Projeto de lei sobre licenciamento ambiental é criticado pela Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente
Foto: Reprodução/ Câmara dos Deputados
A Associação Brasileira dos Membros do Ministério Público de Meio Ambiente (Abrampa) divulgou nessa quinta-feira (10) nota técnica alertando para riscos à proteção socioambiental no Projeto de Lei nº 2.159/2021, que trata da nova Lei Geral do Licenciamento Ambiental.
A proposta, aprovada pelo Senado e em análise na Câmara dos Deputados, é vista como um retrocesso pela entidade, que representa promotores e procuradores com atuação ambiental em todo o país.
A nota foi encaminhada ao relator do projeto na Câmara, deputado José Vitor Aguiar (PL-MG), e à presidente da Comissão de Meio Ambiente, deputada Elcione Barbalho (MDB-PA).
Segundo a Abrampa, o texto compromete o equilíbrio entre desenvolvimento econômico e conservação ambiental, fragilizando instrumentos previstos na Política Nacional do Meio Ambiente.
Riscos jurídicos, ambientais e climáticos
Entre os principais pontos criticados, a Abrampa destaca a dispensa de licenciamento ambiental para atividades como obras de infraestrutura, agropecuária e ações emergenciais, sem critérios técnicos claros nem salvaguardas socioambientais adequadas.
A entidade alerta que essa flexibilização desrespeita princípios constitucionais como o da precaução, da prevenção e da proteção suficiente, já repudiados pelo Supremo Tribunal Federal.
Outro ponto considerado grave é a criação da Licença por Adesão e Compromisso (LAC), que permite autolicenciamento com base em autodeclaração do empreendedor, sem análise técnica prévia. Para a Abrampa, isso dificulta a fiscalização, a responsabilização por danos e ignora a complexidade dos impactos ambientais.
Licença de Operação Corretiva é criticada por institucionalizar ilegalidades

A entidade também critica a Licença de Operação Corretiva (LOC), que permite a regularização de empreendimentos instalados sem autorização prévia e, em certos casos, extingue a punibilidade penal. Segundo a nota da Abrampa, isso representa uma anistia à ilegalidade.
Esse é o caso do licenciamento de operação corretivo (sic), concedido pela Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) em 2000 ao complexo minerador da Vale, em Itabira, sem considerar impactos do passado, como a degradação total da Serra do Esmeril e do próprio pico Cauê, com rebaixamento de aquíferos e destruição de várias nascentes — gerando crise hídrica permanente e continuada na cidade de Itabira.
Mesmo com a postura leniente do órgão estadual, diversas condicionantes da LOC permanecem descumpridas. Além disso, o empreendimento opera com licença ambiental vencida desde 2016, apesar de seu histórico de impactos desde 1942.

“PL da Devastação e Mãe de todas as Boiadas”
Além disso, o projeto que institui a Lei Geral do Licenciamento Ambiental, apelidado de “PL da Devastação” e “Mãe de Todas as Boiadas” por ambientalistas, segundo a Abrampa, omite a exigência de consulta prévia, livre e informada a povos indígenas, comunidades tradicionais e quilombolas, contrariando a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho.
Com isso, a análise dos impactos fica restrita a territórios já demarcados ou titulados, desconsiderando os modos de vida e os processos de reconhecimento em curso.
Outro ponto citado é a dispensa de inscrição no Cadastro Ambiental Rural (CAR) em obras que envolvem supressão de vegetação em áreas rurais, o que afeta a gestão territorial.
A Abrampa também ressalta a omissão do texto em relação aos impactos climáticos e à saúde humana. Em um contexto de emergência ambiental e sanitária, a ausência de diretrizes para avaliação desses riscos é considerada incompatível com os desafios contemporâneos.
Ameaças à imagem internacional e à competitividade
Na dimensão internacional, o texto aprovado pelo Senado contraria compromissos assumidos pelo Brasil nas áreas de clima, biodiversidade e direitos humanos.
Segundo a Abrampa, isso pode gerar barreiras comerciais, dificultar o acesso a financiamentos e comprometer a credibilidade do país, especialmente diante de regulamentos como o da União Europeia que proíbe a importação de produtos associados ao desmatamento.
A associação também aponta riscos de concorrência desleal e insegurança jurídica, ao permitir que empreendimentos com potencial de impacto socioambiental sejam autorizados com menos exigências do que os que já seguem as normas atuais. Isso pode incentivar práticas menos responsáveis e enfraquecer a confiança nas instituições públicas.
Apesar das críticas, a Abrampa afirma não ser contrária à criação de uma Lei Geral do Licenciamento Ambiental. Defende, no entanto, que a proposta seja elaborada com base técnica, transparência e participação democrática, respeitando os princípios constitucionais e os compromissos internacionais do país.