Com premiação em Cannes, Wagner Moura reafirma ascensão global do cinema brasileiro
No destaque, Wagner Moura nos bastidores das filmagens de O Agente Secreto, dirigido por Kleber Mendonça Filho, premiado como Melhor Diretor em Cannes
Foto: Victor Jucá/ Divulgação
Brasil domina o cinema mundial com Wagner Moura vencendo Cannes e ‘Ainda Estou Aqui’ conquistando o primeiro Oscar do país
Por Renato Simões Cunha*
O cinema brasileiro vive um momento de renascimento e reafirmação no cenário internacional. O reconhecimento de O Agente Secreto no Festival de Cannes, com Wagner Moura premiado como Melhor Ator e Kleber Mendonça Filho levando o troféu de Melhor Direção, não é um evento isolado, mas parte de um movimento maior que remete a ciclos anteriores de grande efervescência cinematográfica no país.
A produção nacional, que disputa a cobiçada Palma de Ouro, foi ovacionada por 13 minutos em sua estreia e já é apontada como uma possível indicação ao Oscar 2026.
Além disso, o Brasil celebrou recentemente uma conquista histórica com Ainda Estou Aqui, de Walter Salles, que venceu o Oscar de Melhor Filme Internacional, tornando-se o primeiro longa brasileiro a levar essa estatueta.
O filme, baseado na história real de Eunice Paiva, narra sua luta para descobrir a verdade sobre o desaparecimento de seu marido, Rubens Paiva, durante a ditadura militar.
Estrelado por Fernanda Torres e Selton Mello, o longa emocionou o público e a crítica, consolidando o Brasil como uma potência cinematográfica global.

A nova fase do Cinema Brasileiro
Wagner Moura, um dos atores mais versáteis e internacionalmente reconhecidos do Brasil, entrega uma atuação visceral no papel de Marcelo, um professor que retorna a Recife e se vê envolvido em uma trama de conspirações ligadas ao regime militar.
Sua interpretação foi amplamente elogiada pela crítica internacional, que destacou sua capacidade de transmitir profundidade emocional e complexidade ao personagem.
Moura, que já havia sido indicado ao Globo de Ouro por Narcos, agora se torna o primeiro brasileiro a vencer a categoria de Melhor Ator em Cannes, um feito que reforça a força do cinema nacional.
Tradição rica e diversificada
O cinema brasileiro tem uma tradição rica e diversificada, moldada por grandes cineastas que ajudaram a definir sua identidade. Além dos expoentes do Cinema Novo, como Glauber Rocha, Nelson Pereira dos Santos e Cacá Diegues, outros diretores deixaram marcas profundas na cinematografia nacional.
Walter Salles, com Central do Brasil e Diários de Motocicleta, trouxe uma abordagem sensível e humanista.
Fernando Meirelles, com Cidade de Deus, revolucionou a estética do cinema urbano. José Padilha, com Tropa de Elite, explorou a violência institucional com um olhar crítico.
Anna Muylaert, com Que Horas Ela Volta?, abordou questões sociais e de classe com profundidade. Esses cineastas, entre muitos outros, ajudam a construir um cinema que dialoga com o Brasil e o mundo.
Cinema Novo e a nova vertente
O atual ressurgimento do cinema brasileiro guarda paralelos com o movimento do Cinema Novo, que emergiu nos anos 1960 como uma resposta ao cinema comercial e às chanchadas da época.
Inspirado pelo neorrealismo italiano e pela Nouvelle Vague francesa, o Cinema Novo buscava uma estética mais crua e realista, abordando temas sociais e políticos com profundidade.
Glauber Rocha, com Deus e o Diabo na Terra do Sol, e Nelson Pereira dos Santos, com Vidas Secas, foram alguns dos expoentes desse movimento, ao lado de Cacá Diegues, Leon Hirszman, Ruy Guerra e Joaquim Pedro de Andrade.
A nova vertente do cinema brasileiro, por sua vez, mantém o compromisso com a crítica social, mas incorpora novas linguagens e formatos.
Há uma fusão entre o realismo documental e a ficção, explorando narrativas híbridas e experimentais. Filmes como Bacurau e Aquarius exemplificam essa abordagem, misturando elementos de gênero com uma forte carga política e estética inovadora.
É assim que o cinema brasileiro contemporâneo reflete as transformações sociais do país. A ascensão de debates sobre identidade, gênero, raça e desigualdade econômica tem influenciado a produção cinematográfica.
Filmes como Que Horas Ela Volta? e Marte Um exploram as dinâmicas familiares e sociais sob novas perspectivas.
Além disso, a digitalização e o crescimento das plataformas de streaming democratizaram o acesso à produção audiovisual, permitindo que cineastas independentes alcancem públicos maiores.
Educação e memória
O cinema tem um papel fundamental na preservação da memória histórica e na educação do público.
Filmes como Ainda Estou Aqui, exemplificam essa tendência ao revisitar o passado para compreender o presente e educar futuras gerações.
Esse tipo de produção reforça a importância de revisitar o passado para compreender o presente e educar futuras gerações.
O futuro do Cinema Brasileiro
O reconhecimento em Cannes e no Oscar reafirma que o Brasil tem histórias poderosas para contar e cineastas capazes de transformá-las em arte de alcance global.
A vitória de Wagner Moura e Kleber Mendonça Filho não é apenas um triunfo individual, mas um marco na trajetória do cinema brasileiro, que, apesar dos desafios, segue firme na construção de uma identidade cinematográfica vibrante e inovadora.
Agora, resta a expectativa pela Palma de Ouro, que pode coroar este momento de renascimento e reafirmar o Brasil como uma potência do cinema mundial.
Boas perspectivas na tela e na telona
O cinema brasileiro, assim como nos tempos do Cinema Novo, ressurge como um espaço de resistência, inovação e afirmação da identidade nacional.
Se há algo que a história nos ensina, é que a arte sempre encontra um caminho para florescer, mesmo diante das adversidades e do obscurantismo negacionista que marcaram e ainda marcam o Brasil, impulsionados pelos seguidores de Bolsonaro.
Ainda assim, o país volta a ocupar o centro das atenções cinematográficas globais, desafiando narrativas estabelecidas e revelando realidades antes ocultas ou distorcidas pela indústria cultural, que agora se rende a essa nova fase do cinema nacional.
*Renato Simões Cunha é jornalista e cinéfilo de carteirinha