Impactos do protecionismo e negacionismo ambiental do segundo governo Trump na política comercial brasileira
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Por Renata B. Ferreira*
Com poucas semanas desde a posse de Donald Trump como presidente dos EUA, em 20 de janeiro de 2025, o início de seu segundo mandato já deu ensejo a um conjunto de medidas que vêm causando caos e desconforto em diferentes partes do globo.
Ainda que essas medidas representem a materialização de suas promessas de campanha e não surpreendam, portanto, os agentes e analistas internacionais, elas se fizeram acompanhar, no entanto, de novos contornos, sobretudo no campo das relações econômicas internacionais, e têm promovido uma forte onda de incertezas e apreensão nos mercados internacionais.
Suas decisões, embora marcadas por uma postura de protecionismo já desenvolvida e implementada em seu primeiro mandato, surpreenderam pela rapidez e agressividade em relação a parceiros comerciais antigos e importantes dos estadunidenses como o Canadá, o México e a China, cujos produtos foram tarifados em 25% – no caso dos dois primeiros – e 10% – no caso do último.
Ainda, a retomada dessa diretriz de política externa abre espaço para uma futura guerra comercial que promete atingir outros parceiros, de forma direta ou indireta, como é o caso do Brasil. Na noite de segunda-feira (10), a Casa Branca deu indicativos de que uma nova medida será anunciada, definindo uma sobretaxa de 25% sobre todo aço importado pelos EUA, o que poderá gerar grandes impactos nas empresas brasileiras com grande volume de negócios no mercado norte americano.
Durante sua primeira administração, algo semelhante foi produzido quando Trump usou a Seção 232 — uma medida de alegado conteúdo de segurança nacional — para impor sobretaxa de 25% ao aço e de 10% ao alumínio importados.
Naquela época, o Brasil logrou, junto com a Argentina e a Coréia do Sul, negociar com o governo americano um acordo segundo o qual as sobretaxas não seriam aplicadas se as cotas máximas de importação fossem respeitadas por esses países.
Diante desse contexto, contudo, vale refletirmos sobre os possíveis caminhos que a política externa brasileira pode seguir de modo a proteger os interesses econômicos brasileiros junto aos norte-americanos, caso a política de sobretaxas seja aplicada ao aço.
Em curto prazo, o primeiro e mais importante passo parece ser a diplomacia comercial direta, com estratégias que levem em conta as lições aprendidas pela diplomacia comercial brasileira durante a primeira administração Trump para que soluções negociadas como a que foi implementada em 2019 possam mitigar os efeitos nocivos mais imediatos.
No entanto, há que se pensar em médio e longo prazos, com medidas que cubram acordos comerciais regionais e bilaterais que diversifiquem e ampliem as parcerias brasileiras e envolvam outras regiões e blocos econômicos como a União Europeia, o Mercosul, os BRICS e a Ásia.
Esses novos acordos podem diminuir progressivamente a dependência brasileira do mercado norte-americano e amortecer os prejuízos causados pela manutenção dessa política pelos próximos quatro anos.
Por outro lado, cabe ao país também atuar junto às instâncias multilaterais como a OMC, em defesa das regras multilaterais de comércio e recorrendo ao mecanismo de resolução de disputas para contestar as tarifas e barreiras que violem os princípios de livre comércio.
Ao mesmo tempo, o país pode buscar gerar um ambiente econômico interno mais favorável aos investimentos estrangeiros para atrair o capital de outros mercados que não dependem dos EUA através de incentivos fiscais, reformas estruturais e melhor infraestrutura e que o consolidem como parceiro forte e confiável.
Por fim, duas outras medidas nos parecem de suma importância:
1. O fortalecimento da agenda ESG (meio ambiente, social e governança) que não só atende aos padrões mundiais de negócios no resto do globo junto aos grandes investidores internacionais, como possui a capacidade de promover o país à condição de líder global em práticas sustentáveis, contrapondo-o ao negacionismo ambiental de Trump;
2. Ainda, vale a promoção de redes de parcerias estratégicas com outros países em desenvolvimento na África, América Latina e Ásia que possam gerar rotas alternativas para as exportações brasileiras, via diplomacia corporativa empresarial.
Embora o cenário se apresente tenso e incerto, as ações de Trump não são inéditas e podem ser mapeadas a partir de um estudo dedicado das lições aprendidas de seu primeiro mandato.
Do mesmo modo, vale lembrarmos que o sistema democrático norte-americano ainda apresenta dimensões burocráticas de funcionamento que podem ser acionadas internamente como uma forma de frear os impulsos mais nocivos do presidente norte-americano.
Isso caso suas medidas acabem gerando o efeito oposto ao pretendido, ao aumentar a inflação do país, sobretudo se considerarmos o peso da ausência da mão de obra imigrante que está sendo deportada em massa pelo governo, em razão de um discurso ideológico discriminatório conservador.
Ao Brasil, resta aguardar e agir com cautela a partir de sua diplomacia comercial comedida para que reações precipitadas sejam evitadas.
Ainda, vale observarmos se esse cenário agressivo no âmbito comercial internacional levará a uma melhor aproximação entre executivo e congresso sobre os fatores domésticos os quais devem ser estabilizados para que a resposta do país ao ambiente externo possa ser articulada de forma coesa e uníssona de modo a garantir a proteção dos interesses nacionais.
*Renata B. Ferreira é doutora em Relações Internacionais e Coordenadora do MBA em Diplomacia Corporativa e Gestão de Projetos Internacionais da Faculdade Presbiteriana Mackenzie Rio