Maxakali “hospedam” na rodoviária e pedem “doações” em Itabira para as festas de fim de ano
Crianças indígenas dormem na rodoviária de Itabira
Fotos: Nagila/ Reprodução
Vários indivíduos, entre homens, mulheres e crianças, indígenas da etnia Maxakali (também conhecidos como Tikmũ’ũn), estão há vários dias na rodoviária de Itabira, pedindo “doações” para as festas de fim de ano.
Eles vieram em duas turmas: a primeira com 15 indivíduos, originária da Reserva Indígena do Pradinho, em Bertópolis, que abrange aproximadamente 5,3 mil hectares, onde vivem cerca de 1.600 pessoas.
Essa primeira turma já retornou a Belo Horizonte com a ajuda da Prefeitura de Itabira, que forneceu as passagens. “De BH, eles devem retornar a Bertópolis”, acredita a assistente social da Secretaria Municipal de Assistência Social (SMAS), que pediu para não ter o seu nome revelado.
Ela estava anotando os nomes dos indivíduos da segunda turma quando a reportagem esteve na rodoviária. Essa segunda turma, com dez indivíduos, chegou a Itabira na sexta-feira (28) e deve voltar para a capital mineira ainda hoje, segundo a assistente social.
De lá, eles retornam à comunidade de origem, no caso, a reserva de Santa Helena de Minas, onde vivem cerca de 2.500 pessoas, em uma área de 5.305 hectares, conforme informa o Espaço do Conhecimento da UFMG.
Leia mais aqui:
Conheça o povo Maxakali – Espaço do Conhecimento UFMG
Direito de ir e vir
“Eles têm o direito de ir e vir e têm os seus costumes próprios, que devem ser respeitados, conforme agentes da Funai nos orientaram”, disse a assistente social da SMAS, quando perguntada se a prefeitura tem oferecido outras ajudas além da passagem de volta para Belo Horizonte.
“No ano passado, eles vieram a Itabira e foram alojados em hotéis próximos, mas não quiseram ficar. Retornaram para a rodoviária, onde ainda permanecem. Estamos acompanhando no que é possível fazer”, disse ela.
“No momento, o que eles pedem são as passagens para retornarem a Belo Horizonte e estamos providenciando o que querem”, assegurou.
Sedentários, porém não tanto
Os Maxakali, embora sejam sedentários, têm o costume de viajar em grupos em busca de ajudas diversas, uma vez que passam por grandes necessidades. Daí, eles veem os pedidos de “doações” como meio de subsistência, o que não deveria acontecer se tivessem os apoios a que têm direito por lei, por meio da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai).
Essa situação deveria ser resolvida com uma adequada política agrícola de subsistência e comercialização, mas, pelo visto, esse apoio governamental não tem sido satisfatório, mesmo contando com projetos de recuperação ambiental e formação de agentes agroflorestais indígenas para a proteção das florestas e das comunidades.
Outras reservas dos Maxakali em Minas Gerais estão em Ladainha e Teófilo Otoni. Todas mantêm suas tradições culturais e linguagem, apesar das dificuldades enfrentadas no doloroso processo de aculturação que sofrem há mais de 524 anos.
Além da desnutrição, enfrentam também problemas como a falta de saneamento básico e a necessidade de adaptação às mudanças climáticas.
Abordagem antropológica
Quando um grupo de indígenas chega a uma cidade e se hospeda na rodoviária, a assistência social da Prefeitura de Itabira diz seguir procedimentos específicos para garantir que suas necessidades sejam atendidas de forma respeitosa e culturalmente adequada.
Para isso, a Funai fornece orientações para essas situações, enfatizando a importância da comunicação com respeito cultural, apoio nutricional e de saúde.
A presença dos Maxakali na rodoviária de Itabira não é apenas um reflexo da cultura de migração desse povo, mas também uma prova da ineficácia das políticas públicas de assistência social da Funai e das prefeituras onde as reservas estão localizadas.
Nota da Prefeitura de Itabira
“A Secretaria de Assistência Social de Itabira (SMAS) informa que os indígenas da etnia Maxakali estão de passagem pelo município de Itabira pela terceira vez. Como confirmado pela Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), é da cultura Maxakali a migração por diferentes localidades.”
“Em abordagem social realizada em meados de dezembro, ficou esclarecido que a vinda a Itabira foi com objetivo de arrecadar novas doações, como das outras vezes, e que eles iriam para outro município até o fim do ano, também por conta própria. Na oportunidade, novamente, a equipe da assistência social explicou sobre os serviços socioassistenciais existentes em Itabira.”
“A SMAS permanece em contato com a Funai monitorando a situação de perto. É recomendado aos itabiranos compreensão neste contato, já que os povos tradicionais possuem uma cultura diferenciada da cultura predominante local, mantendo um modo de vida intimamente ligado ao meio ambiente natural em que vivem, englobando, entre outros, o modo de se vestir, de se alimentar, de se comunicar.”