Nesta sexta-feira (27), Dia Nacional da Doação de Órgãos, 64.265 pessoas aguardam um transplante para continuar vivendo
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O rim é o órgão mais aguardado e a falta da doadores ceifa vidas na fila de espera
Dados do último Registro Brasileiro de Transplantes (RBT), publicado pela Associação Brasileira de Transplante de Órgãos (ABTO), mostram uma situação delicada sobre a fila de espera por transplantes. Segundo o último levantamento da entidade, 64.265 pessoas estão aguardando um órgão no Brasil.
E o número só cresce. De janeiro a junho deste ano, 7.699 pessoas entraram na fila de espera no País
O número de transplantes realizados não consegue acompanhar o ritmo. No primeiro semestre deste ano, foram 4.579 em todo o território nacional. Enquanto isso, 1.210 pessoas morreram à espera de um transplante no mesmo período.
O rim aparece como o órgão mais aguardado no Brasil: são 35.695 na fila de espera. É também na espera de um rim que mais pessoas morrem na fila de transplante. De janeiro a junho, foram 1.210 óbitos registrados no país
A discussão sobre essa realidade alarmante ganha ainda mais relevância nesta sexta-feira, 27 de setembro, data em que se comemora o Dia Nacional da Doação de Órgãos.
A data, instituída pela Lei nº 11.584/2.007, visa conscientizar a sociedade sobre a importância da doação e, ao mesmo tempo, fazer com que as pessoas conversem com seus familiares e amigos sobre o assunto.
“A conscientização das famílias sobre a doação de órgãos é fundamental, pois a decisão de doar frequentemente recai sobre os familiares em momentos de dor e perda”, comenta o urologista Rodrigo Rosa de Lima, especialista em Transplante Renal.
“Quando as famílias já discutiram e entenderam a importância da doação, a decisão pode ser menos dolorosa e mais clara. Além disso, essa conscientização ajuda a desmitificar muitos mitos que cercam o tema, permitindo que mais pessoas se tornem doadoras e, consequentemente, salvando vidas”, afirma o urologista.
Salvo por uma doação
O empresário Eduardo Jorge Roriz Rodrigues, de 47 anos, conhece bem a importância de se discutir a doação de órgãos. Sofrendo de rins policísticos desde a infância, precisou ser submetido a um transplante de rim em março de 2022.
“Como a doença progride lentamente, tive uma vida normal, até os 40 anos. A partir daí, já comecei a ter alguns problemas. Mas a insuficiência renal chegou mesmo quando, por engano, tomei o anti-inflamatório Torsilax como se fosse analgésico por 4 meses, na tentativa de curar uma dor na lombar”, relembra o empresário.
“Antes de tomar os remédios, eu tinha 19% de função renal. Quatro meses depois, já estava com 10% somente. Assim que descobrimos que tinha reduzido bastante em pouco tempo, já iniciamos o processo para iniciar a hemodiálise”, conta.
A “sorte” de Eduardo foi a de encontrar um doador dentro da própria família: a sua irmã. Assim, não precisou passar pelo longo processo da fila de espera.
Agora, ele incentiva aqueles que puderem a também se tornarem doadores: “Quem puder ajudar, que ajude. Minha irmã fez isso por mim. Ela continua com a saúde muito boa e ajudou a restabelecer a minha também”, diz.
Empecilhos legais
Rodrigo explica que é necessário um número de pelo menos três vezes mais doadores para atender a todas as pessoas que estão na lista de espera por um transplante.
Isso ainda que um único doador possa ajudar de 7 a 10 pessoas, daí a importância que as famílias se conscientizem. Rins, fígado, córneas, pâncreas, coração, pulmões e ossos são exemplos de órgãos e tecidos que podem ser doados.
A legislação, atualmente, exige que os familiares concordem com a doação dos órgãos do falecido. Assim, por exemplo, um único filho pode impedir o procedimento, mesmo que os demais aprovem e que a própria pessoa tenha manifestado desejo claro em vida de ser um doador.
“Não há um documento a ser preenchido em vida e não há mais indicação de manifestar essa vontade no documento do RG. Portanto, converse francamente com seus familiares sobre o desejo de ser ou não um doador de órgãos”, diz o especialista.
O médico ainda explica que, infelizmente, muitos órgãos de possíveis doadores são perdidos porque vence o período para se realizar o transplante, que é curto.
Perde-se muito tempo entre o diagnóstico de morte encefálica e a decisão da família sobre a doação dos órgãos do ente querido. “Além das campanhas estimulando que as pessoas sejam doadoras, precisamos melhorar esses processos”, afirma o urologista.
Desmitificando o processo
Soma-se a esses pontos os receios que os familiares têm em relação à doação de órgãos, muitas vezes alimentados por desinformação e mitos. Um dos medos mais comuns é a preocupação com a mutilação do corpo do ente querido.
“Muitas pessoas temem que a remoção dos órgãos cause danos estéticos que desrespeitem a memória do falecido. No entanto, é importante esclarecer que os procedimentos realizados durante a doação são feitos com extrema ética e profissionalismo, garantindo que o corpo seja tratado com dignidade. Os médicos que realizam transplantes seguem protocolos rigorosos para minimizar qualquer tipo de modificação que possa causar desconforto durante o velório e a despedida”, afirma.
Outro medo recorrente é a crença de que a doação de órgãos favorece apenas pessoas ricas, o que gera desconfiança em relação ao sistema de saúde.
“Essa percepção pode levar as pessoas a pensar que seus familiares não receberiam a mesma chance de sobrevivência se a situação fosse invertida. É crucial enfatizar que a alocação de órgãos é realizada pelo Sistema Nacional de Transplantes (SNT) com base em critérios rigorosos e objetivos, priorizando a necessidade médica e a compatibilidade, sem considerar a condição financeira do paciente”, destaca o médico.
Ele cita também que um dos principais receios é de que os médicos não farão todo o possível para salvar a vida do paciente caso saibam que ele é um potencial doador.
“Essa crença é infundada, pois os profissionais de saúde estão comprometidos com o bem-estar de seus pacientes. O foco na vida e no tratamento é absoluto, e a avaliação para a doação ocorre somente após a constatação da morte cerebral, respeitando rigorosos critérios éticos e médicos”, assegura.
A preocupação com a demora na liberação dos corpos após a doação de órgãos também é comum.
“Muitas vezes, há a impressão de que o processo de doação pode prolongar o tempo de espera para a realização do velório e do sepultamento. No entanto, assim que a doação é confirmada e todos os procedimentos são realizados, os profissionais de saúde trabalham de maneira eficiente para garantir que o corpo seja liberado o mais rápido possível”, diz o urologista.
De acordo com ele, o objetivo é respeitar o luto da família e permitir que as cerimônias de despedida ocorram sem atrasos desnecessários.
Para Rodrigo, é fundamental que os médicos ofereçam informações claras e precisas aos pacientes e suas famílias sobre o processo de doação, pois esses profissionais desempenham um papel crucial na conscientização sobre a doação de órgãos, atuando como educadores e defensores do tema.
“A formação de uma relação de confiança entre médicos e pacientes é essencial. Quando os médicos falam abertamente sobre a doação, eles ajudam a humanizar o processo e a tornar o tema mais acessível. A empatia e a sensibilidade no momento da abordagem são fundamentais, pois o assunto é delicado e envolve fortes emoções”, observa o médico urologista, diretor-presidente da Sociedade Brasileira de Urologia (SBU, em Goiás.