Conselho Nacional de Saúde repudia projeto de lei que torna crime o aborto mesmo em caso de estupro e pede o seu arquivamento

Foto: Fábio Rrodrigues Pozzebom/
Agência Brasil

CNS – O Conselho Nacional de Saúde recomenda ao presidente da Câmara dos Deputados Arthur Lira o arquivamento do Projeto de Lei 1904/24, do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) e outros 32 parlamentares, e afins, que tratam de alterações no Código Penal quanto ao excludente de punibilidade para os casos de aborto previstos em lei.

A Recomendação ad referendum nº 015 de 11 de junho de 2024 sugere também a promoção do debate democrático do tema na Câmara dos Deputados por meio de audiências públicas com a participação da sociedade civil organizada, o que não ocorreu já que o PL foi aprovado em caráter de urgência.

Dentre inúmeras considerações jurídicas que constam no documento, o CNS fundamenta-se também em dados do Monitoramento da Violência de Gênero, publicado em julho de 2023, no 17ª Anuário Brasileiro de Segurança Pública, que apontam que o Brasil registrou em 2022, o maior número de estupros de sua história,

Foram cerca de 205 por dia, sendo que 68,3% ocorreram dentro de casa e que esses crimes sexuais foram notificados por 74.930 vítimas (56,8% negras), entre as quais, 56.820 eram meninas menores de 14 anos, sendo 10% menores de 4 anos.

Helena Piragibe, conselheira nacional de saúde pela União Brasileira de Mulheres (UBM) ressalta que o PL é extremamente nocivo especialmente para crianças, que são as maiores vítimas do crime de estupro no país.

“Estamos falando de crianças, pois 70% (das vítimas) são crianças que são estupradas dentro de casas. São meninas de 8, 9 anos de idade que não sabem que estão grávidas”, relatou.

O Brasil é signatário da Declaração e Plataforma de Ação da IV Conferência Mundial sobre a Mulher, se comprometendo a “assegurar que as mulheres e meninas gozem plenamente de todos os direitos humanos e liberdades fundamentais e tomar medidas eficazes contra as violações desses direitos e liberdades”.

A Recomendação reforça também que a Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1948, estabeleceu, em seu Art. 1º, que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos”, ou seja, o nascimento é o marco que confere o estatuto legal da pessoa humana.

“Estamos falando da escravidão e de todas as opressões culturais e sociais  da elite dominante impôs ao Brasil, especialmente às pessoas pobres, de um sistema que vem de cima para baixo e nós ficamos ao lado dos nossos opressores”, reforça Piragibe.

Acesse a Recomendação ad referendum nº 015 de 11 de junho de 2024

Criminalização da vítima

Nesta terça-feira (12), o plenário da Câmara dos Deputados aprovou o pedido de urgência para o Projeto de Lei 1904/24, do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ) e outros 32 parlamentares, que equipara o aborto realizado acima de 22 semanas de gestação a homicídio simples, aumentando de dez para 20 anos a pena máxima para quem realizar o aborto. Os projetos com urgência podem ser votados diretamente no Plenário, sem passar antes pelas comissões da Câmara.

O aborto é crime no Brasil, mas existem três situações em que ele é permitido. São casos de aborto legal: má formação do cérebro do feto (anencefalia fetal), gravidez que coloca em risco a vida da gestante e gravidez que resulta de estupro. Para as três situações, não há um prazo máximo para interrupção da gravidez e o procedimento autorizado pela legislação brasileira deve ser oferecido gratuitamente pelo SUS.

No entanto, mesmo sendo garantido por lei, muitas mulheres e meninas enfrentam dificuldades para realizar o aborto legal. Em abril, o Conselho Nacional de Saúde (CNS) aprovou uma moção de repúdio à resolução do Conselho Federal de Medicina (CFM), que proíbe a indução de assistolia fetal pelos médicos brasileiros para os procedimentos de aborto legal quando a gravidez é resultante de estupro.

A assistolia fetal é um procedimento recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), para casos de aborto legal acima de 22 semanas. O documento do CNS considera que “o Conselho Federal de Medicina (CFM) viola os Direitos Humanos das Mulheres, o Código Penal de 1940, a Constituição Federal de 1988, os Tratados Internacionais dos quais o Brasil é signatário e outros ordenamentos jurídicos, com esta proibição”.

“Proibir médicos de realizarem a assistolia fetal em casos de aborto previsto em lei já é um absurdo, agora esse projeto de lei é um horror, porque pode condenar meninas e mulheres que foram estupradas. Elas são vítimas e não criminosas”, afirma Helena Piragibe, coordenadora da Comissão Intersetorial de Saúde da Mulher (Cismu) do CNS.

Fonte: Ascom CNS/Portal da Câmara dos Deputados

 

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