Eliminação de focos de Ades Aegypti com recolhimento de inservíveis nos bairros pode reduzir vida útil do aterro sanitário de Itabira

Carlos Cruz

Com horizonte de exaustão inicialmente previsto para 2035, o aterro sanitário de Itabira corre o risco de ficar saturado antes dessa data, pelo recebimento de sucessivos aumentos de material orgânico, acima da média mensal – e também de resíduos recicláveis, como ocorreu com as crises sanitárias no país com a Covid-19 e agora com a Dengue, que, mesmo com o fim do verão, permanece como epidemia em quase todo o país.

Medidas emergências foram adotadas na coleta e disposição de volumes maiores de resíduos em suas células, o que certamente vai acarretar na redução de sua capacidade de receber e dispor adequadamente, de forma ambientalmente correta, os resíduos orgânicos gerados na cidade, popularmente e erroneamente chamados de lixo ubano, recolhidos das residências.

Impacto

Resíduos orgânicos e recicláveis expostos durante a pandemia da Covid-19, em novembro de 2020, com muito material exposto antes de ser encoberto (Fotos: Carlos Cruz)

O impacto já é significativo. Na administração passada, em março de 2020, foi suspensa a coleta na cidade de resíduos recicláveis, por recomendação do Ministério Público de Minas Gerais (MPMG). A suspensão foi necessária para impedir a contaminação dos servidores da Empresa Urbanizadora de Itabira (Itaurb) que operam a Central de Resíduos Recicláveis, no bairro Nova Vista.

Na ocasião, uma nova célula foi preparada no aterro sanitário para receber os resíduos orgânicos misturados aos recicláveis. A coleta seletiva só foi retornada pela atual administração, em fevereiro de 2021.

A reportagem não conseguiu apurar o total de resíduos recicláveis que foi disposto no aterro em todo o período de suspensão da coleta seletiva.

Mas apurou que houve um salto de 1.987 toneladas (t) de material disposto em fevereiro para 2.346t em março, com registro de 2.608 t em abril e 2.212 t em maio daquele ano no aterro sanitário. Para os demais meses, não foram encontrados registros na Itaurb, segundo a assessoria de imprensa da Prefeitura.

Pela média mensal apurada de cerca de 400t a mais com os  recicláveis, é plausível contabilizar um acréscimo acima de 4.400 t de resíduos dispostos no aterro durante os 11 meses em que a coleta seletiva ficou suspensa na cidade.

Frentes de Limpeza

Coleta de inservíveis nos bairros: resíduos contaminados também seguem para o aterro sanitário (Foto: Ascom/PMI/Quantum)

Pode parecer pouco, mas certamente não é. Se não bastasse esse aumento no período de Covid-19, têm-se agora nova disposição a mais do que estava previsto, com os mutirões e frentes de limpeza para combater focos do mosquito do Aedes aegypti.

Até a presente data, esse acréscimo já contabiliza 2.776,8t de material orgânico e entulho contaminado, que não pode seguir para o aterro controlado de inertes, que seguiram a mais para o aterro sanitário do Borrachudo, que segue a passos firmes e solertes para antecipar a sua saturação.

Todo esse material a mais foi coletado nos bairros São Francisco, Jardim das Oliveiras, São Pedro, Machado, João XXIII, Bethânia, Santa Marta, Santa Ruth, Gabiroba, Bela Vista e Campestre, Pedreira, Clóvis Alvim I e II, Praia e Colina da Praia.

E, enquanto permanecer a situação de emergência em saúde com a Dengue, os mutirões e as frentes de limpeza irão continuar, com mais disposição além do projetado de resíduos no aterro sanitário do Borrachudo. “Os mutirões são ações emergenciais e seguirão até o término da epidemia”, informa a assessoria de imprensa da Prefeitura, que esclarece:

“Os mutirões geram dois tipos de resíduos: orgânico e entulho não contaminado. O orgânico vai para o aterro sanitário e o entulho para o aterro de inerte. A coleta de reciclável continua e é feita, exclusivamente, pela Itaurb, de acordo com o cronograma de dias e horários para cada bairro.”

Desse modo, com “exceção do entulho (restos de construção civil), tudo que é recolhido no mutirão é considerado contaminado e vai para o aterro sanitário. Em qualquer mutirão – não só os de enfrentamento a dengue – é este o procedimento”.

Exaustão

Material orgânico misturado com inservíveis das frentes de coleta nos bairros, fotografado na tarde de quarta-feira (13), exposto ainda sem ser coberto

 

Todo esse impacto com a disposição a mais certamente vai alterar o horizonte de exaustão do aterro sanitário do município, o que ainda precisa ser mensurado.

Mas é certo que o horizonte inicial de exaustão previsto para 2035  já foi reduzido, como se observa no local, com células já em fase final de compactação e revegetação para reabilitação final.

Impacto maior ocorre ainda com a destinação ao aterro sanitário da parcela dos resíduos orgânicos que deveria ser destinada à compostagem. No passado, já bem distante, quando a Prefeitura mantinha jardineiros cuidando de praças e jardins, esse adubo orgânico servia para fazer a correção do solo.

Considerando que essa disposição indevida vem acontecendo desde a inauguração do aterro, essa fração que deveria servir à compostagem (restos de frutas e legumes de varejistas), ao ser disposta no aterro, também contribui para abreviar significativamente a vida útil do aterro sanitário.

Se não fosse o arranjo casuístico entre Prefeitura e Vale, no início da década passada, o antigo lixão deveria ter sido reabilitado e descomissionado, às custas do erário municipal, pois o passivo ambiental era do município.

E o aterro sanitário deveria ter sido instalado em um outro local, juntamente com a Central de Reaproveitamento de Resíduos, proposto pela própria mineradora tendo como referência o que existe na cidade de Camaçari (BA), uma outra condicionante ambiental da LOC de 2000 que a Vale ainda não cumpriu no município.

Célula em fase de descomissionamento no aterro sanitário com plantio de gramíneas, a caminho da reabilitacao final

Gestão

Outro fator que contribui para abreviar a vida útil do aterro é a sua má gestão. Isso pode ocorrer, por exemplo, com uma operação inadequada, com baixa compactação dos resíduos nas células, seja por excesso de material de cobertura (solo), como também com a disposição de material inerte (resíduos de construção). Felizmente, essa disposição inadequada de resíduos de construção já não ocorre no aterro do Borrachudo.

Além disso, a não cobertura diária dos resíduos pode provocar o surgimento de vetores, como ratos, baratas, além de cães e outros animais em busca de alimentos. No passado, isso era comum no antigo lixão, quando havia até mesmo criação de porcos em meio aos resíduos orgânicos, criatório que pertencia ao antigo proprietário do terreno, que era arrendado à Prefeitura.

Com o aterro controlado, essa “criação suína” deixou de existir no local. Já a partir de 2012, com o aterro sanitário quase não se vê animais se alimentando em meio aos resíduos orgânicos, embora até recentemente havia cachorros abandonados por lá – e que foram recolhidos por uma organização protetora dos animais.

Presença de animais entre os resíduos ainda era comum em 2020, como se observa nesta foto. Até recentemente havia também cachorros abandonados que ficavam por lá. Foram recolhidos por uma ONG protetora dos animais

Passivo ambiental

O lixão do Borrachudo era um passivo ambiental da Prefeitura de Itabira. Mas por obra e graça de uma parceria com a mineradora Vale, foi reabilitado para se transformar no atual aterro sanitário na mesma localidade, à montante do córrego São João, principal afluente da Estação de Tratamento de Água dos Gatos.

“A licença ambiental do aterro sanitário de Itabira é válida até 2030”, informa a assessoria de imprensa da Prefeitura, o que é confirmado pelo órgão ambiental estadual. “A Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Desenvolvimento Sustentável (Semad) informa que o município de Itabira possui licença válida para operar o Aterro Sanitário da cidade”, foi a resposta obtida pela reportagem.

O órgão ambiental estadual esclarece também que a execução do Plano Municipal de Gestão de Resíduos é acompanhada pelo próprio município. “A fiscalização da Semad só é acionada em casos de denúncias”, esclarece a sua assessoria de imprensa.

Vistoria in loco

A reportagem esteve no local na parte da tarde de quarta-feira (13), quando ainda havia caminhões chegando com resíduos diversos coletados na cidade. Daí que ainda havia muito material exposto, devendo ter sido encoberto após a jornada. Enquanto o material não é encoberto, a presença de urubus é inevitável.

Foi observado também que um dos sistemas de drenagem apresenta processo erosivo, consequência das chuvas, o que deve ser corrigido com urgência, sob pena de a água passar por cima,  provocando mais erosão e também a geração de chorume, que é o resíduo líquido derivado da matéria orgânica em decomposição.

Esse mesmo processo erosivo apareceu logo após a inauguração do aterro. Foi corrigido com a colocação de uma manta impermeável (bidin), mas agora reaparece com as últimas chuvas. Sem essa correção, o risco de a água das chuvas extravasar é grande, comprometendo-se a segurança da estrutura.

Segundo explicou no jornal Notícias, antigo house-organ da mineradora Vale, o seu então engenheiro sanitarista Paulo Therezo, que acompanhou a instalação do aterro, a sua construção seguiu as normas técnicas, observando as medidas de controle ambiental.

Para não contaminar o meio ambiente, o fundo e as laterais de cada célula foram dotados de camadas impermeabilizantes, ele explicou por ocasião da inauguração.

“São essas camadas impermeabilizantes que impedem a infiltração do chorume, o que contaminaria não só o solo, mas eventualmente o lençol freático e os cursos d´água”, acrescentou Paulo Therezo na mesma reportagem.

Ainda segundo o engenheiro sanitarista, a instalação do aterro sanitário também observou a necessidade de controlar a emissão de gases, como o metano que, se lançado ao meio ambiente, compromete a camada de ozônio. E, acumulados, esses gases podem provocar incêndios.

Se isso ocorrer, é um indicativo de mau funcionando das medidas de controle, o que foi relato no passado por moradores vizinhos, da comunidade Monjolo da Carolina.

A ocorrência de incêndios, ainda que pequenos, indicam que os extravasores podem não estar funcionando ou não estão sendo operados adequadamente.

Para que essa queima não ocorra, foram instalados drenos horizontais por onde deve ocorrer o extravasamento de gases, como está no projeto original.

É preciso verificar, periodicamente, se estão funcionando adequadamente, assim como as demais medidas de controle precisam ser permanentemente monitoradas.

 

 

 

 

 

 

 

 

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