Laços de sangue e de crime em Itabira do Matto Dentro – alucinação, exploração e assassinato
Cogumelo do Jardim Plantado da Glória 1/10/2022
Foto e pesquisa: Cristina Silveira
1894 Cogumelos com Sal e Diabo no Corpo
Diabo no corpo. De um nosso assinante, o sr. Ulysses Gonçalves Couto, que compreende a verdadeira utilidade da imprensa para a nossa sociedade, fez-nos a seguinte comunicação pedindo-nos para chamar a atenção da autoridade para o caso. Eis o que nos diz:
Em Santo Antônio do Morro, povoação próxima a esta cidade, existe um indivíduo de cor preta, de nome Braz, maníaco, em cujo corpo, dizem os habitantes do lugar, fez o diabo sua habitação. Vive completamente nu, embora traga uma longa tanga rasgada; está o infeliz com os cabelos muito grandes e mora sozinho.
Perguntando-lhe, em presença do reverendo vigário de Santa Maria, padre José Martins de Moraes, de que se sustentava ele respondeu-me que de carapecú (cogumelo) que, diz ele, é muito gostoso com sal e mostrou-me alguns em uma panela.
Disse-nos que não gosta de padre nem de igreja. Ofereci-lhe cortar os capelos, respondeu que não, porque serem estes precisos para tapar o sol; oferecemos-lhe um chapéu, respondeu que não aceitava, porque perdê-lo-ia no mato.
Dizem os do lugar que as vezes vestem-no a força, mas ele despe-se depois, atirando fora a roupa. Dizem que ele tem dinheiro guardado e alguma cabeça de gado.
Não tem medo algum das pessoas que o vão ver, e anda no povoado com um pano muito comprido. Faz horror a sua figura.
Há no lugar uma igreja onde há sempre missa, e Braz aparece às famílias que ali vão assistir esse ato religioso, em completa nudez, ofendendo desse modo os religiosos que ali vão.
Aí fica a reclamação, e esperamos que o sr. Delegado de polícia tome as providências que o caso exige.
[A Itabira, Itabira (MG), 7/5/1894. BN-Rio]
A solução insana
Diaba no corpo. Atendendo ao que sob esta epigrafe escrevemos no número passado desta folha comunicou-nos por carta o sr. tenente Canuto, zeloso delegado de Polícia, ter oficiado ao reverendíssimo padre José Martins de Moraes, vigário de Santa Maria, pedindo-lhe para que empregue meios persuasórios afim de vir para o hospício desta cidade o infeliz Braz.
A povoação do Morro pertence a freguesia desta cidade, e não a de Santa Maria, mas conhecedores das virtudes do vigário José Martins, estamos certos de que ele não respeitará os limites de sua freguesia para fazer tamanho ato de caridade.
[A Itabira, MG, 13/5/1894. BN-Rio]
1894 Três chumbadas pelas costas
Assassinato. Do Carmo, distrito desta cidade, recebemos a seguinte comunicação: A opinião pública indigita como autores do bárbaro assassinato de Camillo pelo seu próprio patrão Manoel Fernandes e um filho.
Camilo recebera 3 chumbadas pelas costas. Esperamos que o sr. redator chame para o fato a atenção das autoridades da Conceição, que não podem ficar surdas as reclamações públicas.
[A Itabira (Itabira), MG, 13/11/1894. BN-Rio]
1895 Exploração de Presos
Lê-se no Jornal do Comércio de ontem. Soubemos que o dr. chefe de Polícia de Minas mandou que o seu delegado em Itabira do Matto Dentro informasse sobre a reclamação que produzimos em uma das “Várias” do Jornal do Comercio do 9 de fevereiro passado.
Ignoramos ainda qual a informação daquele funcionário, mas podemos garantir ao dr. Alfredo Pinto, que esses infelizes já se acham livres das grilhetas que tanto os magoaram. Não obstante, estamos informados de que continuam a sair diária ou quase diariamente acompanhados de policiais, transitando pelas ruas da cidade aos olhos indignados de toda população. Confiamos, pois, na energia do dr. chefe de Polícia e dele esperamos providências que façam cessar semelhante prática contrária em absoluto à nossa legislação vigente.
A última hora vimos que o tal sr. delegado veio a público pedir ao nosso informante que declarasse qual a natureza dos serviços que os presos tem sido obrigados a fazer. Isto realmente chega a ser irrisório. O sr. Delfino Ferreira da Silva, delegado de polícia, é quem devia esclarecer ao público a respeito e nunca o nosso informante que, como nós, não pode crer que esses infelizes ainda não pronunciados saiam diariamente a passeio e de mais a mais acorrentados. É caso para recomendarmos esse delegado ao dr. chefe de Polícia.
[O Pharol (OP), 5/3/1895. BN-Rio]
1898 O Sírio e a Porca
Sob a epigrafe – Crime bárbaro, refere o Minas Gerais de ante ontem: Segundo comunicação do sr. dr. juiz de Direito da comarca de Itabira, o sr. dr. chefe de Polícia teve conhecimento do seguinte fato:
Manoel Antonio, árabe, residente na cidade do Itabira, mascateava no distrito de Santo Antonio do Rio Abaixo, quando no dia 25 de junho do ano passado desaparecera, sem que dele houvesse mais notícia.
Suspeitando o subdelegado do distrito, de tão estranho desaparecimento, procedeu a averiguações, em sequência das quais foi exumado do quintal da casa do Wenceslau Pereira de Souza um cadáver que, apesar do tempo decorrido, o sírio João Antonio reconheceu ser o de seu patrício que havia desaparecido.
O ato da exumação deu-se em dias de abril do corrente ano.
Sobre a sepultura estava plantada uma bananeira, que foi arrancada; cavando-se, achou-se, primeiro, ali enterrada uma porca. Alguma circunstância ou denuncia, talvez, levou a autoridade a prosseguir na escavação, até que np mais fundo se encontrou um cadáver humano.
[Correio de Minas (Juiz de Fora), 31/12/1898. BN-Rio]
Interessante notar que o Morro Santo Antônio esteve em evidência, mesmo que nas páginas policiais, no final do século XIX.
Quanto ao provável esquizofrênico da tanga ou dos farrapos, até que o cogumelo devia fazer algum efeito paliativo para o acalmá-lo. Melhor assim para os vizinhos lá do Morro Santo Antônio que corriam menos risco de vida ou de morte.
E o sírio, coitado, deve ter tido um infarto e foi enterrado como indigente, embora, após alguns dias, o seu patrício fez o reconhecimento.