Só [o] Saci?

Mariza Guerra de Andrade*

Desatinou com o cheiro forte. Qual? Nem! Acordou chumbado de tantos nós por desatar de noitinha.

Seria o gorro molhado na madrugada? Ah não, não era.

E cuspiu. Empunhou a vara para esticar o gorro qual o velho barrete frígio dos antigos camaradas lá do XVIII – já que tempo aí não conta.

Barrete e gorro dão nas mesmas: Liberdades!

Mas o cheiro ruim também inunda. Tantão de mosca junta e o vento curto e pausado fez lembrar a frase do velho canjira: ‘Oxossi na frente!’ Escutou ‘o caboclo que remava, não parava de falar, ô, ô que caboclo falador’, mas que ainda falou, avisando: tem mazela nova.

Doença braba, gente morrendo, muita, e um milico de merda no comando. Ah é?! Arribou!

Deu comando pra perna invisível com ajuda da única.

Saltou por cima de dois macacos folgados, passou pelos telhados da noite, cambaleou na pedreira, solavancou pelas covas, pulou na ponte do esgotão do Tietê e zarpou de São Paulo. Avistou uns camaradas num baticum, ara… nem pra parar, consultou seu cérebro de bússola, rumando pro Oeste. Certo.

Fungou muito cansado a secura das sapucaias, mas se molhou nos buritis. Energia, oiê! Nem São Gonçalo dos Violeiros lhe chamou atenção. Varava.

Baforou fumo novo encontrado como que milagre na encosta da serra, abriu risada sabida e com o corpo negro flechado disparou pela extensa planície. Mirou e entrou no palácio de vidro e de curvas.

Escondeu todo o eu saciano e só do Brasil atrás de uma mulata do Di e depois nas bananeiras de Djanira.

Mirou as serpentes do mestre ceramista e quase tropeça no milenar vaso chinês e na cadeira modernista. E saltando vários lances, haja rampa, ‘balança, mas não caí’, entrou na sala com armas e brados ainda guardados do sujeito. Fez o preciso.

Precisamente. Sapecou, assombrando, um macerado de coração-de-bugre, piripiri, cumari, fruto-de-morcego, caraxixu e mais uma pitada de umbigo-de-negro com pimenta-dos-indios com dedo-de-moça e mais tudo o que não se pode contar naquela sala do tal das trevas. Macerado dos bons pra fulminar que ninguém nem tinha visto já.

Pois foi o que pediu quando arribou lá atrás, dando um psiu pra ela, ela companheira da lua e que respondeu: Inhô! E deu pr’ele guardar no gorro. E assim foi e foi feito.

Esse dia tinha que chegar! E também mais não disse, voltando e rodopiando na maior leveza.

Mariza Guerra de Andrade, membro da SOSACI –Sociedade de Observadores de Sacis – São Luiz do Paraitinga/SP

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