Incêndio florestal na serra dos Doze e no Pontal assusta vizinhança, com queimadas também por toda cidade. “Dias piores virão”, alerta Corpo de Bombeiros

Carlos Cruz

Um grande incêndio florestal teve início na madrugada de sábado (20), em uma área próxima de uma carvoaria, na serra dos Doze, próximo da rampa de voo livre. Moradores vizinhos acordaram assustados com a fumaça invadindo as residências e com o barulho estrondoso da vegetação queimando.

Rapidamente o fogo se espalhou, atingindo áreas vizinhas com a forte ventania e o mato seco da estiagem. “Pontal também está em chamas, parece o inferno”, alertou uma moradora ao ligar pedindo socorro ao Corpo de Bombeiros Militar – e também à Central de Emergência da Vale, ainda na madrugada.

Mas só com os primeiros raios de sol foi que uma equipe do 6º Pelotão dos Bombeiros de Minas Gerais, com sede em Itabira, compareceu ao local para dar combate ao incêndio. Nessa hora, as labaredas levadas pelo vento atravessaram a MG-129 e alcançaram a área de eucalipto e sub-bosques da mineradora Vale na área do Pontal.

Morosidade e negligência

Morosidade no atendimento à situação de emergência por parte da Vale fez com o que o incêndio avançasse rapidamente pelo Pontal (Fotos: Carlos Cruz e Reprodução)

Alertada pelos mesmos moradores, somente por volta de 10h a Vale enviou seis brigadistas da Associação Mineira de Defesa Ambiental (Amda) para dar combate ao incêndio que, naquele momento, já havia tomado grandes proporções, provocando muita destruição ambiental.

Sem equipamentos adequados, com um pequeno caminhão-tanque, sopradores, abafadores e bombas costais, os brigadistas da Amda tentavam, com muita dificuldade, impedir a propagação do fogo que já havia avançado com muita força na região do Pontal.

A área é de propriedade da Vale, que não acionou a sua Central de Bombeiros para dar combate mais efetivo ao sinistro em uma situação de emergência, o que poderia amenizar a destruição ambiental.

Incêndio florestal destruiu a vegetação na encosta da serra dos Doze com grande dano ambiental

Já o Corpo de Bombeiros chegou mais cedo, por volta de 6h, para iniciar o combate ao incêndio na serra dos Doze, onde o fogo teve início. “Esse incêndio foi, até o momento, o de maior proporção que tivemos no município de Itabira neste período de estiagem”, contou à reportagem o tenente Marlon Pinho Medeiros Aguiar, comandante do 6º Pelotão de Bombeiros.

Embora moradores vizinhos tenham apontado como causa do incêndio florestal o estouro de um forno da carvoaria existente nas imediações, o comandante do Corpo de Bombeiros não confirma essa hipótese.

“​É difícil precisar causas de eventos de incêndios florestais, mas a grande maioria se dá por ação antrópica. A avaliação precisa ser feita através da perícia técnica da Polícia Civil”, afirmou.

Estouro de forno de uma carvoaria pode ter sido a causa do incêndio florestal, o que precisa ser investigado

Ação mais eficaz

Além de dar resposta mais rápida que a Central de Emergência da Vale, o Corpo de Bombeiros também se apresentou para o combate mais bem equipado. Para isso foi empregado um caminhão auto bomba tanque (ABT), além de equipamentos de combate direto como soprador, abafadores e bombas costais, operados por quatro bombeiros.

O combate mais eficaz do Corpo de Bombeiros impediu que o fogo fizesse maiores estragos nas propriedades vizinhas, por onde chegou a avançar ainda na madrugada, sendo combatido ainda no breu da noite pelos moradores, temendo que o incêndio atingisse as suas residências.

“As árvores já estavam em brasas no Pontal e a Vale ainda não tinha conhecimento do sinistro, negando a ocorrência em sua área, quando o fogo já avançava em sua desprotegida propriedade que todo ano pega fogo, sem que a empresa tenha sequer feito a manutenção dos aceiros nos últimos dois anos”, relatou à reportagem um morador vizinho, para quem a mineradora foi omissa e negligente.

Morador apaga fogo que avançou por uma propriedade vizinha ao Pontal

Alerta geral

“Não quero ser o mensageiro do Apocalipse, mas sinistros semelhantes podem voltar a acontecer, já que o mês de setembro é sempre o período mais crítico. Temo que o pior está por vir”, alertou o comandante do Corpo de Bombeiros.

O que se viu, já com o incêndio tendo avançado com toda força pelas duas margens do anel rodoviário pela MG-120, foi um cenário de muita tristeza e desolação, com os tons de cinza e preto como marcas de uma noite infernal, como relatou uma assustada moradora, que assistiu o avanço do incêndio com toda a sua força destruidora.

Aceiro do lado do Pontal, sob responsabilidade da Vale, está sem limpeza de faixa há mais de dois anos, disse morador vizinho

“Pela manhã, pássaros sobrevoavam perdidamente em busca talvez de seus ninhos, assim como eram vistas aves predadoras a procura de presas fragilizadas”, relatou com tristeza. “Todos os anos essa história se repete com essa tragédia ambiental anunciada, sem que a Vale mantenha uma vigilância permanente para dar combate aos focos de incêndios ainda no início”, lamentou.

“Infelizmente, houve atraso por parte da Vale no combate ao incêndio no Pontal, sob a alegação de que os brigadistas não atuam durante à noite, por razões de segurança”, disse outro morador vizinho. “Os brigadistas da Vale só chegaram na metade do dia, quando já não havia muito mais a fazer”, lamentou.

Brigadistas da Amda chegaram para o combate do incêndio no Pontal por volta de 11h, quando o fogo já tinha se alastrado sobre toras e troncos de eucalipto tombados na área da mineradora

Plano de Emergência

Para esse morador, o que se observou foi mais um descaso da mineradora com o meio ambiente. Isso por parte de uma empresa que deve, por força de lei, dispor de um Plano de Emergência de Incêndios Florestais. “Se esse plano existe, com certeza não foi colocado em prática pela Vale nesse terrível sinistro florestal”.

Pela manhã de sábado a fumaça do incêndio invadiu o anel rodoviário, dificultando a visibilidade

Disse ainda que qualquer perícia pode constatar que na área do Pontal não existe o princípio da precaução e prevenção. “Pilhas de toras de eucalipto e árvores cortadas permanecem no local, inclusive à beira da estrada vicinal e contribuíram para que inflamassem o fogo ainda mais”, denunciou à reportagem, que constatou e fotografou a ocorrência.

Esse mesmo morador espera que as autoridades municipais tomem providências, cobrando mais empenho da mineradora na proteção de suas áreas florestais (RPPNs e Reservas Legais), para que incêndios dessa proporção não voltem a ocorrer, destruindo a fauna, flora e ameaçando as propriedades vizinhas.

“Que as autoridades municipais e estaduais adotem medidas efetivas de controle, fiscalização e combate para preservar a biodiversidade da flora e da fauna que são ameaçadas de sobreviverem em todo período de estiagem”, é o que cobra esse mesmo morador.

Brigadistas da Amda, com poucos recursos, chegaram tarde quando o incêndio ganhou grande proporção: pausa para descanso

Fiscalização

A ação governamental deve ser educativa, fiscalizadora e punitiva de ações de queimadas não autorizadas, na cidade e no campo. “A situação de queimadas em Itabira é das mais críticas na região”, confirmou o tenente Medeiros.

“Até o momento a média de incêndios em Itabira permanece semelhante aos anos anteriores à pandemia. Ou seja, permanece crítica, sendo necessária a conscientização da população para que não coloque fogo nas vegetações”, recomendou o comandante do Corpo de Bombeiros.

Vigiar e punir

Queimadas por toda cidade pioram a qualidade do ar e agravam as doenças respiratórias juntamente com a poeira das minas

Segundo o tenente Medeiros, é muito difícil identificar os responsáveis pelas queimadas na beira de estrada. “Sabemos das dificuldades em se identificar o causador, bem como a indicação de indícios de autoria e materialidade”, reconheceu, assegurando que o Corpo de Bombeiros Militar tem feito a sua parte.

“Além do combate, temos realizado ações de conscientização da população, treinamentos de brigadistas e palestras a respeito do tema com estudantes, visando sempre a diminuição das queimadas e preservação do meio ambiente”, relatou, lembrando que a Prefeitura de Itabira criou a Brigada Municipal, com os brigadistas já sendo treinados para entrar em ação nas próximas ocorrências.

Mas também nos casos de sinistros florestais e queimadas, a prevenção é o melhor caminho. “O mais importante é ter a contribuição da população para que não coloque fogo nas propriedades, em nenhuma hipótese”, recomendou o tenente Medeiros.

Já em relação às queimadas em lotes e terrenos vagos, a autoria geralmente é dos próprios proprietários. Esses devem ser identificados e punidos na forma da lei.

Outro lado

Fogo destruiu sub-bosques na área do Pontal, atrasando a conversão de floresta homogênea para mata nativa, condicionante ambiental da Vale

Sem responder objetivamente às perguntas encaminhadas pela redação deste site à mineradora Vale, sobre a ocorrência do incêndio florestal e questionando a lentidão ao dar combate, assim como a falta de manutenção de aceiros na região do Pontal, a sua assessoria de imprensa encaminhou a seguinte nota:

“A Vale esclarece que atuou em conjunto com o Corpo de Bombeiros Militar para combater o incêndio. Os recursos utilizados contemplaram equipamentos e equipe de brigadistas de combate direto.”

“A empresa dispõe de Plano de Atendimento à Emergência e reforça, durante o período de seca, os monitoramentos e rondas de brigadistas em suas propriedades.”

“Aceiros também são construídos ao longo do ano como medida de prevenção às queimadas. A Vale mantém, ainda, campanhas educativas anuais de combate a incêndios florestais voltadas às comunidades e seus empregados.”

 

 

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