Com o fim da exigência de maioria absoluta para aprovar empréstimo de R$ 99 milhões pela Prefeitura de Itabira, votação de projeto é adiado a pedido da oposição

Carlos Cruz

Depois de o governo municipal, por meio de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), derrubar artigos da Lei Orgânica e do regimento interno da Câmara Municipal de Itabira, que estipulavam a exigência de 2/3 (maioria absoluta, equivalente a 12 votos) para autorizar pedido de empréstimo, parecia que o projeto de lei 36/2022 seria aprovado na sessão ordinária dessa terça-feira (9).

O projeto autoriza a Prefeitura contratar financiamento de R$ 99 milhões junto à Caixa Econômica Federal (CEF), por meio do programa de Financiamento à Infraestrutura e ao Saneamento (Finisa).

A exigência da maioria absoluta para aprovar o projeto foi considerada inconstitucional, por unanimidade, pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG), por ausência de simetria da legislação municipal com a Constituição Federal – e também com a do estado de Minas Gerais.

Neidson Freitas protestou, mas já admite a aprovação do projeto nas próximas reuniões

Com isso, em reunião tumultuada com muito bate-boca e acusações, o líder informal da oposição, vereador Neidson Freitas (MDB), se conformou, admitindo a sua aprovação, sob protesto.

“Vamos acompanhar o que será feito com esse dinheiro. Não vamos tolerar a contratação de mais consultorias para ensinar secretários a trabalhar nesta cidade”, disse ele.

Freitas viu na ação de inconstitucionalidade um desrespeito do prefeito Marco Antônio Lage (PSB) ao legislativo itabirano, mesmo tendo sido considerada procedente pelos 22 desembargadores que julgaram o pedido.

“Foi um atropelo, um desrespeito a esta Casa”, classificou, para em seguida complementar. “É a primeira vez que um prefeito de Itabira pede autorização para contrair empréstimo mesmo tendo R$ 568 milhões em caixa, com cerca de R$ 300 milhões não vinculados, livres para investimentos sem ser preciso endividar o município”, criticou.

Adiamento

Mas se tudo parecia transcorrer para um final feliz para o governo, com o projeto sendo aprovado em primeiro turno nessa terça-feira, faltou ao prefeito e aos seus articuladores políticos combinarem com a oposição e mesmo com parte da situação.

O vereador Luciano “Sobrinho” articulou a retirada do projeto de pauta até sanar dúvidas

Com o retorno intempestivo do projeto, nas palavras dos oposicionistas, que não constava da pauta inicial divulgada pela Câmara, o vereador Luciano “Sobrinho” Gonçalves dos Reis (MDB) pediu s suspensão da reunião por “cinco minutos”.

Após cerca de dez minutos de muitas conversas, e “balbúrdia” no plenário, o parlamentar oposicionista retornou com uma carta na manga: o termo de aceite pela CEF, com as condições previamente estipuladas para o empréstimo, poderia não ter mais validade. É que, segundo ele, o prazo de 30 dias para a sua aprovação, que seria contado a partir de 17 de maio, já estava vencido.

Foi o bastante para cinco vereadores oposicionistas entrarem com requerimento pedindo o adiamento da votação, até que um novo termo de aceite da CEF seja anexado ao projeto.

Em vão o presidente da Câmara, vereador Weverton “Vetão” Andrade (PSB), argumentou que a decisão do TJMG já teria eficácia plena, mesmo havendo prazo de contestação.  “Tem, inclusive, parecer favorável do Ministério Público”, argumentou.

Vetão argumentou que a decisão do TJMG já tem eficácia plena e não vê atropelo do legislativo

Mas conforme lembrou o vereador Heraldo Noronha (MDB), as condições para o empréstimo, como carência e prazo para pagamento, poderiam não estar mais valendo, o que tornaria nula a aprovação do projeto pela Câmara.

Noronha também não entendeu a urgência de se aprovar o projeto já na sessão de ontem. “Até com dois terços esse projeto vai ser aprovado, não precisava desse atropelo.”

Com o requerimento para a retirada de pauta, assinado por cinco vereadores oposicionista, e aprovado com o endosso de mais três situacionistas, o projeto de empréstimo foi mais uma vez retirado de pauta.

Rosilene Félix e Sidney “do Salão” têm sido os principais críticos do projeto

Deve retornar para ser aprovado na próxima terça-feira, desde que sejam sanadas as lacunas apresentadas pela oposição. “Devemos fazer uma diligência para que a Caixa possa retificar os termos desse aceite”, propôs a vereador Rosilene Félix (MDB).

Ela tem sido uma das principais críticas do projeto de empréstimo, que rotulou como sendo para atender aos “sonhos megalomaníacos do prefeito”.

Qualidade de vida

O líder do prefeito, vereador Júber Madeira (PSDB), já resignado com a derrota parcial, ainda tentou argumentar que o prazo de validade estipulado pela CEF para aprovação do projeto só vence em 25 de setembro. Mas foi voto vencido.

Antes ele apresentou uma série de investimentos que o governo municipal promete fazer com esse empréstimo, o que inclui o asfaltamento da estrada de Senhora do Carmo a Ipoema, reforma de todas as escolas municipais, substituição da pavimentação de ruas e avenidas esburacadas, dentre outras obras chamadas de estruturantes.

Entretanto, o líder do governo não citou a execução do que dispõe o Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB), aprovado no final do governo de Damon de Sena e que ainda não saiu do papel.

É assim que os vereadores, no exercício de suas funções, podem perfeitamente apresentar emenda ao projeto de empréstimo definindo um percentual mínimo a ser investido no saneamento básico na cidade e na zona rural, amarrando parte do empréstimo a esse propósito.

A falta de saneamento básico em muitas ruas de bairros da cidade, e também nos distritos, que não dispõem sequer de rede de esgoto, é uma afronta à dignidade humana em uma cidade que dispõe de uma das maiores arrecadações de Minas Gerais, conforme tem ressaltado o próprio prefeito em seus pronunciamentos.

Em vão, o líder Júber Madeira (ao fundo) tentou convencer oposicionistas e mesmo alguns governistas a não adiarem a votação do projeto de empréstimo

Fiscalização

O vereador situacionista Carlos Henrique de Oliveira (PDT) argumentou a favor do projeto de empréstimo dizendo que os vereadores terão prazo suficiente para fiscalizar a sua correta aplicação, fato que não teria ocorrido com os empréstimos aprovados e contraídos no final dos governos passados.

O vereador Carlos Henrique lembrou que até empréstimo para sanar a falta de água em Itabira já teria ocorrido no passado, ainda sem solução

“Foi feito até empréstimo para resolver o problema do abastecimento em Itabira e até hoje falta água nas torneiras de muitos itabiranos”, criticou, lembrando que a administração passada contraiu empréstimo de cerca de R$ 50 milhões para abrir a avenida Machado de Assis, ligando a região do bairro João XXIII com o bairro Gabiroba.

Já o vereador Júlio “Contador” César Araújo (PTB), que apoia o projeto, lembrou que a Prefeitura de Itabira tem como assumir, sem atropelo, esse endividamento. Segundo ele defendeu, o empréstimo é necessário para a Prefeitura antecipar a execução de obras de infraestrutura, uma vez que apenas cerca de 7% do orçamento municipal podem ser alocados em investimentos dessa natureza.

Para ele, o empréstimo é uma maneira de antecipar receitas necessárias para fazer frente às demandas da população e assim melhorar desde já as condições de vida em muitas localidades, na cidade e no campo. “Quem sofre com a falta de esgoto em suas portas não pode mais esperar”, sustentou.

Mas o parlamentar situacionista acabou aceitando os argumentos da oposição, votando favorável ao requerimento que suspendeu a votação do projeto de empréstimo. Isso até que as dúvidas sejam sanadas com um novo termo de aceite pela CEF.

A expectativa é de que sejam apresentadas as condições atualizadas pelo banco estatal para que o empréstimo possa ser, enfim, contratado pela Prefeitura de Itabira.

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