Aviso aos incautos e aos negacionistas: a pandemia não acabou

Rafael Jasovich

Os especialistas em covid-19 não têm dúvidas. O Brasil está passando por mais uma onda da doença causada pelo coronavírus.

Em duas semanas – entre 20/05 e 02/06 – o número de casos de covid no Brasil subiu 122%, indo de 14 mil para 31 mil casos confirmados, de acordo com os dados do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass).

A quantidade real de infecções, no entanto, é subestimada. O número de testes realizados atualmente no país é muito baixo.

Em maio, o SUS fez apenas 176 mil testes, contra 1,7 milhão realizados em janeiro. Sem dados concretos que provem o aumento no número de casos, a população fica sem informação e não pode agir para se proteger.

A testagem é fundamental para a detecção das infecções a tempo de quebrar a cadeia de transmissão e também para auxiliar a tomada de decisão dos gestores em saúde.

No Brasil sempre se testou pouco, em todas as ondas. Nunca tivemos estratégias de testagem, e mesmo depois de mais de dois anos de pandemia, continuamos sem uma política para isso, graças à negação da gravidade (gripezinha) e à teoria não cientifica de contágio de rebanho.

Os testes vêm sendo realizados quase somente em pacientes sintomáticos. Não temos disponibilização regular de testes para assintomáticos, assim como não temos esclarecimento para a população sobre importância de se testar.

Tampouco as equipes de vigilância foram reforçadas para poder atuar nesses casos positivos identificados. Isso faz parte do desmonte do SUS.

Mesmo sem testes, no entanto, já era possível identificar a nova onda. E muitos governos desdenharam das medidas protetivas, desobrigando o uso de máscaras e permitindo a aglomeração de multidões em eventos artísticos e religiosos.

Uma das ferramentas mais confiáveis para prever o comportamento da covid, a pesquisa conjunta entre a Universidade de Maryland (EUA) e o Facebook, mostrou uma reversão na tendência de queda nos casos do Brasil em 11 de abril.

Essa pesquisa é feita por meio da rede social com um questionário de sintomas “tipo covid”. Como a pesquisa atinge um grande número de pessoas e os resultados são computados imediatamente, ela consegue capturar as mudanças antes dos números oficiais, que dependem de testagem.

É provável que essa onda de agora não cause tantas mortes como as observadas em 2020 e 2021. Isso acontece por conta da vacinação, que também fez o número proporcional de mortes no país despencar na onda de janeiro de 2022.

Mesmo assim a preocupação é que as vacinas não impedem a transmissão, mas está provado que ameniza os sintomas e reduziu expressivamente o número de mortes. Mas já é sabido que quanto mais o vírus se transmite, maior é a chance de surgirem novas variantes, como aconteceu na Europa e nos Estados Unidos.

Além disso, estudos científicos mostram que mesmo casos não graves podem levar à covid longa, situação em que as pessoas apresentam sequelas por meses ou anos após a infecção.

 Há múltiplas causas para o aumento de casos. Uma delas é a chegada da estação fria no Sul e Sudeste. Esse é o momento em que a incidência de doenças respiratórias aumenta muito nessas regiões, por conta da tendência de fechar os ambientes para maior conforto térmico.

Tanto é assim que os números no Norte e Nordeste não estão apresentando alta neste momento.

A situação é muito mais grave: temos hoje no Brasil cerca de 100 mortes por dia por apenas uma doença. Até 2019, esse número não chegava a 15, considerando todas as causas de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG).

 Fim da emergência sanitária 

O cenário nos hospitais é agravado com o fim do financiamento de leitos extras pelo Ministério da Saúde, uma das muitas consequências do fim da emergência sanitária no Brasil, decretada em abril pelo presidente Bolsonaro. Sem esse dinheiro, a abertura de leitos será muito mais difícil do que em 2020 e 2021.

Outra consequência dessa decisão do ainda chefe do executivo brasileiro é simbólica. Quando o fim da emergência é decretado, há uma mensagem implícita de que está tudo bem, o que não é verdade.

A flexibilização das medidas de contenção da transmissão, ocorridas ao longo do primeiro semestre de 2022, também impactaram os números.

O fim da obrigatoriedade de máscaras em ambientes fechados em diversos estados e cidades fez com que o vírus circulasse com mais facilidade. O país já tinha medidas de prevenção frágeis e, em dois anos e meio de pandemia, não implementou nenhuma medida de monitoramento da qualidade do ar nos ambientes semprer por conta do descaso e pela negação.

O fim da obrigatoriedade das máscaras, uma medida altamente efetiva e de baixo custo individual e coletivo, não fez e não faz sentido no país. Agora estamos colhendo o resultado das decisões e das mensagens equivocadas do poder público.

A estagnação da vacinação contra a covid no Brasil é outro motivo que ajuda a aumentar os casos. Nenhum estado conseguiu universalizar a segunda dose na vacina.

A chamada dose de reforço, fundamental para a manutenção da proteção contra a doença, tem adesão muito menor

Medidas de contenção 

O recomendável para ações do controle da pandemia seguem sendo as mesmas.

É necessário reforçar a vacinação, com campanhas agressivas, buscas ativas pelos serviços de saúde, mobilização da população e combate às fake news.

É fundamental, ainda retomar com o uso obrigatório de máscara em ambientes fechados. Essa medida não impede a transmissão apenas da covid, mas de qualquer doença respiratória.

Outras medidas são a ampliação da testagem e o rastreamento de casos e contatos. Isso é necessário para isolar e interromper a cadeia de transmissão e alertar a população sobre os reais riscos desse momento.

Em um cenário ideal, o país deveria estar fazendo um esforço para programar o monitoramento da qualidade do ar nos ambientes para poder guiar ações que melhorem a circulação nas escolas, comércio e demais espaços fechados de uso público.

Uma melhor ventilação dos ambientes é uma ação fundamental a longo prazo, já que é provável que novas pandemias surjam nos próximos anos. Que não seja com esse governo tão despreparado, negligente e irresponsável.

 

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1 Comentário

  1. Impressionante, em Itabira os PSFs deveriam realizar testes e no entanto é uma dificuldade enorme para que o teste seja feito. Uma burocracia desnecessária. Procurei o PSF do meu bairro, e eles exigem que se passe por uma triagem para fazer a testagem e para passar para um profissional. Na verdade se você tem condições é melhor procurar um laboratório e pagar pelo diagnóstico molecular (PCR) no valor de $235,00 ou pelo seu plano de saúde. E mesmo tendo o diagnóstico a mão não há médico para atender. A informação é que estão em treinamento. Um absurdo. O valor que é cobrado nem todos tem condições de fazer. E em Itabira já tem aulas suspensas pela secretaria municipal de educação por apresentar professores com COVID-19. No entendo o que anda acontecendo com eventos ao ar livre acontecendo e uma nova pandemia batendo a sua porta.

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