É Natal outra vez

Foto: acervo de família

Fátima Drummond*

Natal…saboreio devagar essa palavra e ela tem gosto de infância com sua manhã clara de dezembro e aroma de doce de figo inundando a casa.

Posso ainda sentir o cheiro do musgo do presépio de minha mãe, com seus patinhos de celuloide nadando leves sobre um espelho, lago imaginário.

Entre avencas, pedras e bichos todas as figuras santas aguardavam a chegada do Menino.

Os Reis Magos seguiam pelo caminho de areia branca levando o Ouro, o Incenso e a Mirra. Caminho longo até a gruta, que a minha mãe, amorosamente, armava com cristais, escórias de topázios e águas-marinhas, trazidos da lavra de meu pai.

A minha mão impaciente de criança queria logo colocar o menino Jesus em sua caminha de palha e assim terminar aquela longa espera.

Quando, enfim, o Menino nascia, já era hora da Missa do Galo e nós, crianças da família, havíamos dormido há muito.

Mas, à primeira claridade da manhã, com a luz entrando pelas gretas da janela, ainda sob as cobertas, a mão escorregava para debaixo do travesseiro.

E lá estavam, sob alva fronha, a maçã vermelha embrulhada em papel roxo e a caixinha de passas dulcíssimas.

Tais gostosuras, raridade nos nossos dias e trazidos da capital especialmente para a data seriam saboreados noutra hora, podiam esperar.

Nós, crianças da casa, queríamos logo ver as surpresas pela qual tanto ansiávamos.

Apressados, de um salto levantávamos da cama e corríamos em busca dos presentes que nos aguardavam nos sapatos enfileirados ao lado do presépio.

Tanta emoção, tanta euforia, que nem nos lembrávamos de ver o Menino. Decerto ele nos espiava na quietude de sua manjedoura sob os olhares complacentes de José e Maria.

Urgente mesmo era correr para a rua e se reunir com a meninada exibindo seus presentes: bolas, petecas, bonecas, quebra-cabeças e outros.

Brinquedos simples como era simples a nossa vida de criança, porém cheia de afetos, de primos, de irmãos e vizinhos, povoada de quintais e brincadeiras.

Na nossa rua lavada pela chuva da véspera, a ordem era brincar, brincar, brincar… Brincávamos juntos, brinquedos trocados e misturados.

Um dia único e singular que emerge de minha memória e que me permite, ainda hoje, sentir o divino sabor do Natal!

*Fátima Drummond é escritora santa-mariense.

 Santa Maria de Itabira/Natal de 2005.

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1 Comentário

  1. Maravilha, Fátima! Lembrei da minha infância no Explosivo, Pé-de-pomba ou Vila Sagrado Coração de Jesus. Buscamos os musgos numa Serra que era parte do pico do Cauê e areia no areal da chácara do Zé Sérgio. O presépio ainda fazemos até hoje usando o pó brilhante de minério para construir a gruta do menino Jesus. Tia Joaquina, hoje com 91 anos, é a principal responsável por esse costume que ainda nos emociona. Obrigado por reavivar com seu texto essa recordação tão bonita e que nos faz tão bem.

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