Pela necessária instalação de um Arquivo Público na cidade de Itabira
Mariza Guerra de Andrade*
A história de Itabira não é nem deve ser confundida com aspectos da vida & obra de alguns itabiranos. Nem de seu amado poeta Carlos Drummond de Andrade, genial repovoador da cultura brasileira e universal.
Aquela se conforma temporalmente e nas suas especificidades muito além de eventuais elos patrimonialistas, políticos, simbólicos dispensados por uma espécie de memória fidalga silenciadora sobre os demais viventes em assombrada maioria.
Faz parte, sendo incontornável, a posse coloquial e paroquial de algumas narrativas e platitudes sobre qualquer história local. Contudo, as recorrentes efemérides – que alguns locais ainda insistem em pontuar com espantosa vaidade – não constituem, por si, conhecimentos acerca dessa historicidade.
Será preciso recorrer, inevitavelmente, ao conjunto dos aspectos de sua formação social abrangente com suas intrincadas relações de vários tipos e formas nelas presentes o mundo do trabalho, das experiências, das ideias e paixões próprias daquele espaço.
A Historiografia, por sua natureza cognitiva, disciplinar, documental, exige, portanto, muito mais!
É dessa operação que cresce o imperativo crucial e incessante da reescrita da história, uma das ambições da Historiografia pelas dobras dos tempos.
Se essa pode se ancorar em memórias como documentos, também as rebate, refutando seus ardis e redimensionando pelo cotejo de outras fontes o vivido ainda não exposto ou conhecido.
A produção histórica sobre Itabira depende de uma política pública que enfrente a necessidade da preservação e tratamento dos seus acervos de vários registros (manuscritos, impressos, imagético-fotográficos etc.) também em um arquivo municipal organizado conforme normas consolidadas pela Arquivística moderna e de acesso público a pesquisadores e consulentes quaisquer que sejam os fins de pesquisa e consulta.
Sem essas prerrogativas não há saídas possíveis, renovadoras e consistentes, com relação ao que se conhece, ensina e produz nos diversos traçados em que essas histórias percorrem das conversas às pesquisas e aos textos em diferentes suportes sejam nos livros, jornais, vídeos, monografia e teses acadêmicas etc. Assim é que a operação histórica, também sediada nos arquivos, abre temporada de sentidos e de horizontes, inaugurando outras e novas compreensões dos processos.
Nota
Entre 2001 e 2003 levamos ao então governo municipal de Itabira a necessidade da implantação de um arquivo público moderno, espelhado na legislação e supostos teóricos da nossa experiência aguerrida pela criação do Arquivo Público da Cidade de Belo Horizonte – APCBH – em 1992.
Por essa época, parte do acervo documental e cartorial de Itabira encontrava-se empilhado nas dependências do Museu da cidade. O que conseguimos foi tão somente a nossa entrada profissional no local – sem nenhum ônus para os cofres públicos, ou seja, não recebemos recursos para essa iniciativa.
Realizamos seguidas reuniões com a diretoria do Museu e outros agentes públicos, definimos preliminarmente algumas linhas de acervo assim como fundos e séries arquivísticas e treinamos pontualmente alguns funcionários disponíveis.
Esperávamos que esses procedimentos iniciais dessem prosseguimentos, como o de se trabalhar pela separação evidente do Museu do Arquivo, criando condições efetivas para a instalação legislativa e orçamentária desse último no quadro administrativo e organizacional do Município.
É prudente ressaltar ainda que por essa época tivemos informação do espalhamento documental em estado precário de outros acervos em depósitos da prefeitura municipal de Itabira.
Ou seja, o volume de documentos que então se encontrava no Museu não era, de longe, toda a documentação existente. Por isso mesmo ressaltamos a urgência de se adotar procedimentos técnicos para tais recolhimentos, além de uma adequada política de gestão documental pelo Município conforme o mesmo que implantamos na Prefeitura de Belo Horizonte de acordo com as fases de acesso e consulta.
Que as novas gerações de pesquisadores assumam essa empreitada local para que a população itabirana e seus gestores-funcionários compreendam a importância real ou o valor memorial e cidadão da criação de um arquivo público para a cidade.
*Mariza Guerra de Andrade é historiadora
É triste tentar manter a história de Itabira e região e nem termos acesso franqueado ao Arquivo Público, pois o mesmo encontra-se com portas cerradas há quatros anos.
Pela qualidade dos documentos apresentados nas fotografias acima, temos uma razoável noção de toda a precariedade do acervo.
Urge estabelecer o Arquivo Público de Itabira em sede própria e adequada, sugiro aqui que o governo municipal faça um convênio com os Correios (autarquia pública federal) para utilizar a sede fechada do mesmo e ficando ao encargo do município sua adequação e manutenção.
A título de curiosidade, a segunda imagem é a folha de abertura do inventário de uma das antepassadas do atual e do anterior prefeitos de Itabira.
É mesmo triste ter de conviver com isto, com todo este desmazelo, em uma cidade que se diz a favor da “cultura”!
Importantíssima a observação feita pela historiadora Mariza Guerra de Andrade! A história de Itabira não se resume às genealogias de famílias tradicionais ou às trajetórias individuais dos homens que dão nome às ruas e escolas da cidade. Muitos outros itabiranos, de origens e ofícios diversos, tiveram um protagonismo fundamental na edificação da cidade e são negligenciados pela memória histórica local. Um trabalho de instalação e tratamento do Arquivo Histórico, como propõe a Mariza, é uma forma de propiciar mais pesquisa e conhecimento sobre a Itabira, que não começou com instalação da CVRD…
Mariza mais uma voz sábia a alertar a Prefeitura.