Para não faltar água em Itabira com escassez na Pureza e Gatos, Saae recorre novamente a “puxadinhos” com captações em áreas da Vale
Como a solução definitiva para resolver o crônico problema de escassez de água em Itabira ainda está longe de acontecer com a transposição do rio Tanque, a cidade deve viver nesta estiagem, que promete ser prolongada e severa em todo o país, momentos de dificuldade para assegurar o abastecimento em todos os bairros.
Segundo a presidente do Serviço Autônomo de Água e Esgoto (Saae), Karina Lobo, que participou de um encontro com o prefeito Marco Antônio Lage (PSB) pela rede social em 20 de maio, a previsão com a estiagem é no mínimo preocupante.
Isso mesmo com a entrada em operação do anel hidráulico, que melhora a logística de distribuição, mas sem resolver em definitivo a crônica falta de água nesta época do ano.
A situação é mais grave nos bairros abastecidos pela ETA Pureza, que são os mais populosos.
Para que não ocorra o desabastecimento, medidas emergenciais já estão sendo tomadas para contornar esse eterno problema de escassez desse insumo imprescindível à vida.
Situação que se agrava ainda mais com a pandemia, quando é necessário manter a assepsia para impedir a contaminação pelo novo coronavírus, além das demais demandas de higienização e sobrevivência humana.
Contaminação
Para se ter ideia da gravidade da crise que se avizinha, no período chuvoso a produção nas duas maiores estações de tratamento de água (ETAs Pureza e Gatos) é de 210 litros por segundo (l/s). Com a estiagem, a previsão é de queda para 135 l/s – um déficit de 35,8%.
A queda de produção na estiagem só não é maior por não haver diminuição da captação de água dos poços profundos das Três Fontes, que fornece água para ETA Pará – e também dos poços do Areão. Mas ambos sistemas demandam maior tempo de funcionamento das bombas para assegurar a vazão necessária para garantir o suprimento, o que aumenta o consumo de energia elétrica.
Para buscar alternativas provisórias para suprir essa queda no fornecimento, a Prefeitura criou uma Comissão de Abastecimento Emergencial. Sua missão é definir e colocar em ação estratégias para que não falte água na cidade, mesmo no caso de a estiagem ser mais severa e prolongada neste ano.
Mas não está sendo fácil encontrar soluções para tantos “puxadinhos”, necessários uma vez que a situação permanece praticamente a mesma dos anos anteriores, mesmo depois da ampliação da ETA Gatos.
Isso porque o reforço para o sistema viria do córrego Jirau, mas a água se revelou imprópria para o consumo humano. Análises da qualidade realizadas pelo Saae constataram alto índice de contaminação por manganês na água bruta a ser captada.
Daí que a ETA até então só conta mesmo com a água bruta que, desde a sua inauguração, é captada do córrego Pai João, cuja vazão vem diminuindo ano a ano – e que é insuficiente para atender à demanda frente a nova capacidade produtiva da estação ampliada.
Compensações
Como a mineradora Vale é detentora da maioria das outorgas de água disponíveis no município, a mineradora firmou um termo de ajustamento de conduta (TAC) com o Ministério Público de Minas Gerais (MPMG), obrigando-se a suprir o déficit no abastecimento até que se encontre uma solução definitiva para o abastecimento público.
Para cumprir o TAC, a Vale é obrigada a fornecer 160 l/s para suprir o déficit das ETAs Pureza e Gatos. Isso tem ocorrido com o reforço que saem das ETA Rio de Peixe e Areão – e também no anel hidráulico.
Além desse volume já ajustado, negocia-se ainda com a mineradora um reforço adicional de 20,8 l/s, que visa suprir o déficit da vazão ocorrido nos últimos meses. Outro reforço de 50 l/s está sendo negociado para a ETA Gatos, a ser captado na barragem Cemig II.
Viabilizando essa captação, e com o sistema de abastecimento reforçado para fazer frente a estiagem, a expectativa é que não seja necessário utilizar caminhões-pipa para transportar água captada na mina Conceição, como ocorreu no ano passado.
“É preciso também que a população colabore, eliminando o desperdício com consumo consciente”, pede a presidente do Saae, Karina Lobo. Mas para isso se faz necessário promover uma ampla campanha de esclarecimento e conscientização da população.
E que sejam empreendidas pelo Saae as ações necessárias, com a troca de redes danificadas, para reduzir as perdas de água tratada. Assim como ocorre no país, em torno de 40% da produção de água tratada se perde entre as ETAs e o consumidor final, incluindo as redes clandestinas, que são os “gatos”.
Solução definitiva para o abastecimento com transposição do rio Tanque só está prevista para 2026
A solução definitiva acertada em um outro TAC firmado entre o Ministério Público e a Vale, com a interveniência da Prefeitura e do Saae, será captar e fazer a transposição de água do rio Tanque. Mas isso, pelas previsões iniciais só deve ser concluído em 2026, prazo que o prefeito Marco Antônio Lage quer antecipar para 2024. Leia mais aqui e aqui.
Enquanto isso, a cidade permanece na dependência desses “puxadinhos”, que são os reforços improvisados que se repetem desde muito tempo.
A obrigação da Vale para assegurar esses reforços, assim como a busca da solução definitiva, se deve ao fato de que a maioria das outorgas existentes no município foram concedidas à mineradora. Isso mesmo como Código das Águas prioriza o consumo humano e dessedentação de animais, para só depois servir à indústria.
Em Itabira, desde o início da mineração em larga escala ocorre justamente o contrário. Foi quando a cidade perdeu para a atividade os mananciais do Borrachudo, Camarinha e Três Fontes, que forneciam água para suprir a demanda da população.
Além disso, a própria Vale atrasou a solução definitiva, que ocorrerá com a futura captação de água no rio Tanque. Esse atraso ocorreu quando, no início deste século, a mineradora prometeu para 2016 disponibilizar toda a água que emerge dos aquíferos para o abastecimento da cidade, o que seria possível após a exaustão das Minas do Meio. Leia também aqui.
Para isso seriam formados grandes reservatórios nas cavas exauridas. Hoje, essas cavas estão sendo soterradas, em boa parte, com rejeitos de minério, o que certamente irá inviabilizar esse legado, se é que já não inviabilizou.
Trata-se de mais uma perda incomparável para Itabira, que se priva assim de uma água de classe especial para abastecer a cidade e atrair indústrias que demandam por grande volume desse insumo.
É, falta de avisar que não foi…