Se beber e tiver o genes do alcoolismo, é batata: mas fora isso, beba sem culpa

Rafael Jasovich*

Um conhecido alcoólatra me disse certa vez: – Não beba quando estiver de boa, só porque está de boa. Essa é a senha para se tornar alcoólatra. Comigo foi assim.

A tese dele se baseava em uma reportagem que leu, na qual se dizia que todo mundo pode se tornar alcoólatra se tiver o gene do alcoolismo. – Se tiver e beber, é batata, sentenciou.

Esse papo surgiu em uma conversa trivial. Nunca me afetou, porque não tenho histórico familiar de alcoolismo, mas voltou à cabeça quando fui colocar uma dose de uísque.

Nesses dias de quarentena, me pareceu uma boa forma de distração. Mas, de repente, comecei a achar que havia algum sentido: – Se tiver e beber, é batata. Eu não sabia se tinha.

Esses tempos de quarentena se prestam muito a esse desserviço com a nossa saúde. São muitas informações ao mesmo tempo e acabamos absorvendo de forma errada muitas vezes, ou porque não prestamos muito a atenção ou porque nos vemos equivocadamente nos sintomas. E não precisa ser hipocondríaco para cair nesses enganos inusitados.

Tenho outro conhecido que teve todos os sintomas do coronavírus e já sarou umas quatro vezes. Basta ouvir na televisão que, se sentir isto ou aquilo, pode ser a doença que ele já absorve. Nunca foi hipocondríaco, mas deu de tomar remédios por conta em função da ansiedade. Deixou de ver tevê por isso.

A frase do meu conhecido me perturbou, mas acabei esquecendo quando lembrei de todas essas maluquices que estão acontecendo por conta do coronavírus.

Quando me dei conta de que, se tiver o gene e beber, é batata, já estava na quinta ou sexta dose. Então já havia uma confusão de pensamentos. A frase, o uísque, a pandemia.

Como parece que não tenho o gene do alcoolismo continuei a beber, mas agora moderadamente.

Como não dá para frequentar os copos sujos que visitava com certa assiduidade passei a beber em casa, mas beber sozinho nunca tinha sido meu costume.

Então criei um amigo/a imaginário/a, como quando era criança, e passei a ter longos papos sobre diversos assuntos que sempre me interessaram, obvio que estava falando com minha minoria interior.

Por enquanto estou sóbrio e sem nenhum sinal de alcoolismo, o que me deixa muito feliz. E assim posso continuar bebendo sem culpa.

*Rafael Jasovich é jornalista e advogado, membro da Anistia Internacional

 

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