Fernando Haddad já é o candidato de Lula e disputa com Ciro Gomes quem segue para o segundo turno

Rafael Jasovich*

Nessa terça-feira (11), em frente à sede da PF em Curitiba, o PT oficializou a troca dos nomes na cabeça de chapa. Lula e Fernando Haddad passaram o dia anterior acertando os detalhes da tática.

Haddad deve ler uma carta escrita por Lula para a passagem oficial de bastão da candidatura. Desde o início do período pré-eleitoral, essa sempre foi a estratégia do PT: esticar a corda ao máximo com Lula e tentar transferir um bom contingente de votos para Haddad.

Minha dúvida sincera é se o PT não teria esticado demais a corda, não dando o tempo necessário para fazer a correia de transferência – e pôr o ex-ministro da Educação e ex-prefeito de SP no segundo turno.

A disputa que se dará até o dia 7 de outubro será para saber qual das duas principais teses da esquerda brasileira enfrentará Jair Bolsonaro no próximo turno. Não vejo outras possibilidades concretas para além de dois cenários: Ciro x Bolsonaro ou Haddad x Bolsonaro, mas ainda tem uma chance que não pode ser desprezada da ascensão do Alkmin.

Bolsonaro segue mais ou menos no mesmo patamar desde meados de abril deste ano. Apesar da porcentagem elevada e do eleitorado consolidado em torno do candidato da extrema-direita, ele esbarra na sua própria rejeição, que é recorde, principalmente entre as mulheres.

Nunca houve um candidato que fosse tão mais rejeitado por um gênero que pelo outro, segundo demonstram as pesquisas. Essa rejeição tamanha deve crescer e inviabilizar uma vitória do ex-militar no segundo turno.

Os outros candidatos são pouco expressivos diante do que se tornou a disputa.

Ciro e Haddad disputarão voto a voto o espólio eleitoral de Lula – em uma disputa que têm a incumbência de não se tornar fratricida. Ciro neste momento leva uma leve vantagem: apesar do isolamento na formação de sua coligação que sofreu ainda na pré-campanha, o ex-ministro se apresentou ao eleitorado com propostas fortes ante o momento de crise econômica.

Já Haddad terá a dura missão de se apresentar como capaz de conseguir fazer o Brasil retornar ao que foi na “Era Lula” – só que sem Lula. Porém, antes de demonstrar essa capacidade, tem ainda que se tornar conhecido da população, principalmente no nordeste, uma vez que a maioria ainda não sabe direito quem é “o tal de Andrade do Lula”.

Haddad será o candidato de Lula, mas sem a presença poderosa do ex-presidente nos palanques, como aconteceu em 2010 com a então desconhecida do povo, Dilma Rousseff.

Vale ressaltar como ponto positivo para Haddad o componente Manuela D’ávila, do PCdoB, como vice. Manu é um quadro extremamente preparado e competitivo dos comunistas, que pela primeira vez conseguem uma posição tão privilegiada numa chapa nacional com o PT.

Além disso, a composição com o PCdoB reforça o argumento de uma chapa que buscou unificar as esquerdas e que aposta em lideranças mais jovens, porém tarimbadas, para dar um jeito no país.

Emplacar essa chapa, no entanto, é complicado, uma vez que a audiência dos programas eleitorais na TV está em parcos 6 pontos. E é na TV que o PT dialoga de forma direta e massiva com suas bases eleitorais, usando como trunfo vídeos de Lula gravados estrategicamente antes de sua prisão.

A Internet se tornou a principal trincheira em uma campanha que ainda muito pouco chegou às ruas. Mas sendo trincheira, não é o ideal para um cenário de guerra de movimentação.

Ou seja, em uma Internet cada vez mais inchada e sectária, ninguém viralizou até agora. E a tendência é que isso só ocorra nas últimas semanas do segundo turno, quando as pessoas serão obrigadas novamente a se polarizar.

Acontece que as pessoas estão desgastadas do “nós contra eles” que vigorou desde o segundo turno de 2014 até há poucos meses. A maioria vai depositar seu voto naquele que melhor souber dialogar de forma plural com a sociedade.

Portanto, uma candidatura com fortes componentes ideológicos, mas ao mesmo tempo conciliadora (como foi a de Lula em 2002) irá ganhar – não sem dificuldade – da alternativa de extrema-direita que é Bolsonaro.

Ciro começa melhor que Haddad neste quesito, pois tem feito desde ano passado gestos para a esquerda, para o centro e para a direita, de forma bastante perspicaz.

Diferente do PT, que apontou seu discurso para o passado e para o retorno messiânico de Lula (que sabiam desde o começo, não iria acontecer), Ciro apesar de usar sua empáfia para impor sua experiência e vivência política, fez mais gestos para o diálogo e para o futuro.

O perfil dos dois candidatos é bastante parecido do ponto de vista do que grande parte da população espera do político que vai governar um país totalmente fora dos eixos.

Ambos têm chance de – e um deles vai ganhar a eleição no segundo turno. Porém, as consequências políticas para o candidato que perder no primeiro turno são bem diferentes para cada um deles.

Para Ciro Gomes, caso não seja ele a passar para o segundo turno, apesar da derrota eleitoral, lhe restará uma baita vitória política de quem rejeitou uma composição em que seria coadjuvante e assumiu parte do protagonismo durante o período eleitoral. Ciro “voltaria para casa” com um tamanho político grandioso. Mesmo derrotado, vencedor.

No caso de Haddad, uma derrota eleitoral ainda no primeiro turno seria um trauma sem precedentes para si e principalmente para o seu partido, que tem preso, desde abril, seu líder maior.

Seria uma derrota justo no mais longo período de mobilização máxima da militância da história do PT, que está em permanente tensão desde o segundo turno das eleições de 2014, passando por todo o processo do impeachment de Dilma até o julgamento, condenação e prisão do ex-presidente Lula e culminando neste processo eleitoral extremamente tensionado.

Somaria a isso, mais uma derrota eleitoral a Haddad, agora em âmbito nacional. Ele, que é um dos quadros de maior preparo, e com grande longevidade política do partido na atualidade.

De quebra, e essa é a pior das consequência de uma possível derrota ainda no primeiro turno, o PT perderia a posição hegemônica que exerce em relação às esquerdas brasileiras – e parte de sua influência e referência para partidos de esquerda de todo o mundo, desde a sua fundação em 1980.

De toda forma, qualquer um dos dois que passe, deverá ter o apoio do outro – isso se a disputa não tornar-se fratricida. Juntos, no segundo turno, vencerão e certamente farão composição no futuro governo em ambos os casos.

A ala democrática-progressista brasileira sairá vitoriosa dessa, que é a eleição mais dramática e conturbada desde a redemocratização do Brasil. E ambos terão papéis fundamentais a serem exercidos no próximo período, que nem nos melhores sonhos, será de tranquilidade política, econômica e social.

*Rafael Jasovich é jornalista, advogado, secretário e fundador da Associação Gremial de Advogados da Capital Federal, membro da Anistia Internacional

 

 

 

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