As eleições de 1958 num município: Itabira, Minas Gerais
Altivo Drummond de Andrade
Abril de 1960.
A Frente Popular, aliança constituída do PR, UDN e PSP derrotou o PSD e PTB, pondo, assim, termo a uma situação política consolidada há mais de 20 anos.
O prefeito eleito, sr. Daniel de Grisolia, pertenceu ao PSD e, no penúltimo pleito, foi eleito vereador, chegando posteriormente, por dissídio verificado na representação pessedista e manobra da oposição, à presidência da Câmara Municipal.
O seu competidor, em 3 de outubro último, foi o sr. Luiz de Melo Brandão, seu ex-chefe e também ex-prefeito, dirigente exclusivo do PSD local e, até então, considerado a maior potência eleitoral do município.
Sua influência na zona rural e na Cia. Vale do Rio Doce, ao tempo da presidência dos srs. Israel Pinheiro e Demerval Pimenta, era considerável.
Entretanto, ao deixar a prefeitura se tornou empreiteiro de minério da Cia. Vale do Rio Doce. Interesses contraditórios, ao que se diz, levaram-no a empreender campanha de descrédito contra o superintendente da referida Cia.
Denunciou à alta administração falhas e irregularidades verificadas no Departamento das Minas, em Itabira.
A denúncia veio a público através de um jornal da oposição e, devido à reação de pessoas ligadas à Cia. e envolvidas nas irregularidades, foi o denunciante reptado a positivar as increpações. Não sustentou a acusação, alegando que a denúncia fora feita em caráter confidencial.
Esse incidente deixou mal o chefe pessedista e o seu prestígio decaiu consideravelmente junto à Cia. Vale do Rio Doce, dada a solidariedade natural ao superintendente, vítima de notória injustiça.
Já a esse tempo, o Sr. Daniel de Grisolia, sem nenhum amparo político, se candidatava ao cargo de prefeito. Inteligente, animador de programa de rádio, profundamente radicado nos meios estudantis, encetou a sua campanha eleitoral, entre a indiferença de uns e a chacota de outros. Ninguém o tomou a sério.
Todavia, quando se deu um balanço na situação política local, verificou-se que a sua penetração na massa popular era profunda e nenhum outro candidato da oposição logrou maior ressonância. Embora com certas restrições, os próceres oposicionistas, adotaram-no como candidato.
Os partidos que se organizaram sob a legenda “Frente Popular de Itabira”, eram fracos. Foram batidos fragorosamente nas eleições de 54. Embora nessa eleição o PR e UDN tivessem candidatos próprios, a soma da votação obtida pelos mesmos foi muito inferior à do candidato vitorioso na aliança PSD e PTB.
Em 1958, a situação política havia se modificado radicalmente. O candidato pessedista, como já foi dito, estava com seu prestígio desgastado e não mais podia contar com a proteção da Cia. Vale do Rio Doce, fator até então decisivo das vitórias do pessedismo. Além disso, a administração municipal foi um fracasso. O prefeito eleito em 54, já velho e cansado, nada pode fazer em benefício do povo. Licenciou-se, passando o cargo ao vice-prefeito. Manobrado pelo chefe pessedista, esse cuidou, apenas, dos interesses de sua grei. O fim de estéril mandato coincidiu com o “impeachment”, votado pela maioria da Câmara Municipal. Por outro lado, a tirania fiscal, implantada pelo corretor Municipal causava revolta geral.
A Frente Popular soube explorar o descontentamento do povo, criticando acerbamente os atos reprováveis da administração e apontando à execração pública os seus autores. Enquanto o desânimo lavrava nas hostes pessedistas, a Frente Popular crescia em influência, graças a uma atuação coordenada, firme e decidida que, longe de se amedrontar, desafiava as violências do poder e afrontava de cabeça erguida as ameaças e perseguições.
Tentando o último recurso, na véspera das eleições, quando a derrota da situação era inevitável, o chefe pessedista e candidato a prefeito, conseguiu a substituição do superintendente da Cia. Vale do Rio Doce. O nomeado era engenheiro que, em 54, a mando do então deputado Israel Pinheiro, participara vivamente da campanha eleitoral. O expediente não deu resultado, pois, as posições estavam tomadas e eram inexpugnáveis.
Feriu-se o pleito e o candidato da oposição obteve 1.069 votos acima de seu competidor. A oposição fez, ainda, os juízes de paz da cidade e a maioria da Câmara Municipal.
Explica-se a vitória da oposição:
a) Cansaço do povo em 20 anos de dominação política.
Aos serviços prestados ao município nesse período se opuseram malefícios de toda sorte: tirania fiscal, monopólio de empregos, favores exclusivos a pequeno grupo de beneficiários e algumas perseguições.
b) Inércia da última administração comprometendo o ritmo de progresso da cidade;
c) Organização e coordenação dos partidos de oposição, que levaram a propaganda a todos os setores de opinião. Clima emocional: adesão em massa da infância das escolas e juventude dos ginásios;
d) O novo alistamento substituiu, em parte, o eleitorado analfabeto e de cabresto, força maior do pessedismo na zona rural;
e) Cédula única. Influiu nos resultados, principalmente na eleição de senador. Nos distritos, o PSD não contando com auxiliares esclarecidos e, para evitar confusões, aconselhou seus eleitores a não votar em senador. Daí os resultados: Milton Campos – 3.498 votos; Bernardes Filho – 777 votos, números que contrastam com os algarismos referentes à votação do candidato do PSD a prefeito.
Conclusão
A votação obtida pelos diversos candidatos revela o seguinte: em Itabira, os partidos perderam importância. O eleitorado votou, apenas, em nomes. Via de regra, votou-se sistemática e impecavelmente contra o governo.
Os resultados do pleito, embora dispares e aparentemente contraditórios, convencem dessa asserção. Assim, enquanto a UDN obteve 321 legendas pra deputados federais, conseguiu 2.683 legendas para deputados estaduais.
Já o PR logrou 2.788 legendas para a Câmara dos Deputados e, apenas, 315 para deputados estaduais.
A explicação desses fatos é simples: o candidato a deputado federal da oposição era o sr. Feliciano Pena (PR), filho do município e o candidato a deputado estadual o sr. José Horácio Betônico (UDN), filho de Itabira. Ambos foram sufragados em peso pela Frente Popular.
Do confronto entre os números acima e os demais, resulta uma certeza: é impossível avaliar-se o potencial de cada partido.
Outra conclusão emerge claramente: o PSD descamba para uma posição secundária no município.
Esse artigo foi publicado em abril de 1960, no nº 8 da Revista Brasileira de Estudos Políticos, da Universidade de Minas Gerais (atual UFMG), apenas com as iniciais A.D.A.
Foi a última publicação de Altivo, que morreria um ano depois.